A palestra, que contou com apoio da Esmam, foi realizada no auditório da Faculdade Santa Teresa, em Manaus.
O corregedor-geral do Ministério Público do Estado de Sergipe, Carlos Augusto Alcântara Machado, disse em Manaus que a fraternidade está na essência da Constituição Brasileira de 1988 e que é necessário fazer o “resgate” desse princípio no sistema de Justiça. Machado, que também é presidente nacional da Rede Comunhão e Direito, ministrou uma palestra na noite da última quinta-feira (22/11), no auditório da Faculdade Santa Teresa, sobre a Fraternidade e o Direito.
Para uma plateia formada, a maioria, por estudantes e professores, Machado destacou o Preâmbulo da Constituição Brasileira, promulgada em 5 de outubro de 1988, que insere o princípio da fraternidade na Carta Magna do País: “Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembleia Nacional Constituinte, para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte Constituição da República Federativa do Brasil (….)”.
“A nossa Constituição nos deu um caminho que outros países não têm, porque a CF, na sua porta de entrada, no compromisso preambular, disse que quer um Brasil com uma sociedade fraterna”, comentou, acrescentando que alguns poderão dizer que Preâmbulo não tem força normativa, mas já houve decisões judiciais baseadas no enunciado preambular. “Estamos mostrando em teses acadêmicas de que a fraternidade se apresenta no Direito Brasileiro como princípio constitucional”, comentou.
A coordenadora da Rede Comunhão e Direito na região Norte, desembargadora Socorro Guedes Moura, comentou a importância de se trazer para a discussão, principalmente na academia, o tema da fraternidade. “Nós buscamos cada vez mais trazer para a nossa realidade o Direito e a fraternidade. E estarmos hoje com os alunos, professores e coordenadores das faculdades é extremamente importante porque precisamos fazer esse resgate da fraternidade desde o início, já na formação dos futuros operadores do Direito para que amanhã possamos ter mais pessoas tratando o outro como gostaria de ser tratado, isso é fraternidade e é um princípio constitucional”, afirmou a magistrada.
Palestra
A juíza Lúcia Viana e coordenadora do Curso de Direito da Faculdade Santa Teresa destacou que a fraternidade vem conquistando seu espaço no Direito ao longo dos anos. “O corregedor Carlos Augusto Alcântara Machado é protagonista dessa temática no País, com quatro livros, além de inúmeros artigos sobre o assunto. Portanto, para nós, é uma honra ter essa oportunidade de conversar com uma das autoridades no Brasil nesse tema”, declarou Lúcia Viana.
Ela lembrou que o papa Francisco vem pedindo às instituições de ensino superior com cursos de Direito no Brasil e em outros países, para que incluam na grade curricular da graduação o tema da fraternidade. Sobre isso, a juíza enfatizou a criação de um grupo no Estado do Amazonas, pela desembargadora Socorro Guedes Moura, do Tribunal de Justiça amazonense, formado por professores e vários coordenadores de cursos das Faculdades de Direito de Manaus, que se reúne há mais de um ano para discutir e estudar a temática da fraternidade no Direito.
Em nível de pós-graduação, várias universidades do País como dos Estados do Amazonas, Santa Catarina e Sergipe, além das cidades de Tiradentes (MG) e Marília (SP), já incluíram a disciplina Fraternidade e Direito, conforme Carlos Augusto Alcântara Machado. “Já na graduação, o pioneirismo é do Amazonas. As universidades amazonenses inseriram a disciplina como optativa”, informou o corregedor-geral do órgão ministerial sergipano.
Frentes de trabalho
Durante a palestra, Carlos Augusto Alcântara Machado explicou que a Rede Comunhão e Direito no Brasil trabalha em três frentes – relacionamentos profissionais, produção de informação na academia e aplicação do princípio nas decisões judiciais -, visando o “resgate” da fraternidade no sistema de Justiça.
“A Rede Comunhão e Direito, que trabalha com o princípio da fraternidade e em busca da construção de uma fraternidade universal, ou seja, algo muito mais amplo, atua em três frentes: a fraternidade como princípio nas relações dos profissionais do Direito, nas quais mesmo que eles tenham posições antagônicas nos polos processuais, esses profissionais podem construir um relacionamento fraterno, em busca da Justiça, que é o que se espera no final, isso significa a fraternidade como princípio de relacionamento humano entre advogados, magistrados, serventuários da Justiça, membros do MP e Defensoria; a fraternidade se apresenta ainda como um princípio que deve transformar não só as estruturas da Justiça, mas a compreensão do próprio fenômeno jurídico e para isso existem universidades e grupos de pesquisas desenvolvendo teses, dissertações de Mestrado e Doutorado, trabalhos de conclusão de curso e artigos mostrando a possibilidade de se trazer uma categoria jurídica nova para o Direito”, explicou.
E a terceira frente de trabalho da Rede é a fraternidade sendo aplicada pelo sistema de Justiça, por meio de decisões judiciais. “Este é o terceiro campo de atuação da Rede, a fraternidade sendo utilizada como razão para decidir nos votos proferidos pelos tribunais, inclusive os superiores a exemplo do Supremo Tribunal Federal (STF) e Superior Tribunal de Justiça (STJ)”, completou Machado, apresentando durante a palestra vários exemplos de decisões de magistrados que aplicaram o princípio da fraternidade em seus votos.
Dentre eles, um da desembargadora Socorro Guedes Moura (Arguição de Inconstitucionalidade nº 0000348-40.2017.8.04.0000), proferido no mês passado. Durante análise, o Pleno do Tribunal de Justiça do Amazonas julgou procedente a ação e equiparou a licença-paternidade concedida a homem solteiro ao adotar crianças ou adolescentes na modalidade de família monoparental à licença-maternidade de 180 dias.
Para a Justiça Estadual, o Legislativo Municipal ao limitar a licença-paternidade a 15 dias, indiscriminadamente (art. 146-A da Lei Municipal nº 1.118/71), restringiu o benefício, entendendo que o caso deveria ser interpretado à luz do princípio da fraternidade preconizado na Constituição Federal.
Em seu voto, a desembargadora Socorro Guedes afirmou que “não se trata de inconstitucionalidade do dispositivo legal, mas sim de interpretação conforme os princípios constitucionais preconizados pela Carta Magna da República”.
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