O relator, ministro Edson Fachin, abriu a oportunidade de participação de entidades como amicus curiae (amigo da Corte) e em eventual audiência pública sobre o tema, considerando a importância de a Corte analisar a efetiva tutela constitucional às comunidades quanto a posse das terras por elas ocupadas.
O Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal (STF), por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral no Recurso Extraordinário (RE) 1017365, que trata da definição do estatuto jurídico-constitucional das relações de posse das áreas de tradicional ocupação indígena com base nas regras estabelecidas no artigo 231 da Constituição Federal.
O recurso foi interposto pela Fundação Nacional do Índio (Funai) contra acórdão do Tribunal Regional Federal (TRF-4) que confirmou sentença de primeira instância pela procedência de ação de reintegração de posse ajuizada pela Fundação de Amparo Tecnológico ao Meio Ambiente (Fatma). A hipótese refere-se a uma área declarada, administrativamente, como de ocupação tradicional dos índios Xokleng, localizada em parte da Reserva Biológica do Sassafrás, no Estado de Santa Catarina.
A sentença considerou que houve tumulto no exercício da posse da área da reserva biológica pela presença dos índios na região. Também ressaltou que não há elementos que permitam inferir que as terras sejam tradicionalmente ocupadas pelos índios, ao observar que quem ocupa a área, para fins de preservação ambiental, é a parte autora (Fatma).
No RE, a Fundação alega ofensa ao artigo 5º, incisos XXXV, LIV e LV, e ao artigo 231 da Constituição Federal (CF). Sustenta que a área em questão já foi reconhecida como de tradicional ocupação indígena e que o acórdão do TRF-4 afastou a interpretação contida no artigo 231 da CF – sobre o reconhecimento da posse e usufruto de terras tradicionalmente ocupadas pelos índios – ao privilegiar o direito de posse daquele que consta como proprietário no registro de imóveis em detrimento do direito originário dos índios.
A Funai afirma que o caso trata de direito imprescritível da comunidade indígena, cujas terras são inalienáveis e indisponíveis. Ressalta não ser cabível a compreensão de que os direitos indígenas ao usufruto das terras, “ou quaisquer outros que a Constituição lhes confira, decorram da demarcação administrativa da área, pois os títulos de domínio referentes às terras de ocupação dos índios são inoponíveis a eles”.
Manifestação do relator
O relator do recurso, ministro Edson Fachin, considerou preenchido o requisito da repercussão geral da matéria em razão da relevância jurídica da questão. Para ele, há flagrante risco da criação de precedentes “que fomentem situação de absoluta instabilidade e vulnerabilidade dos atos administrativos editados com âmbito nacional”. De acordo com o ministro, a questão indígena “não se encontra resolvida ou ao menos serenada”, motivo pelo qual compreendeu a importância de a Corte analisar a efetiva tutela constitucional dos direitos das comunidades indígenas à posse e usufruto das terras tradicionalmente ocupadas.
Fachin frisou que não estão pacificadas pela sociedade, nem mesmo pelo Poder Judiciário, questões como o acolhimento pelo texto constitucional da teoria do fato indígena, os elementos necessários à caracterização do esbulho possessório das terras indígenas, a conjugação de interesses sociais, comunitários e ambientais, a configuração dos poderes possessórios aos índios e sua relação com procedimento administrativo de demarcação, “apesar do esforço hercúleo da Corte na PET 3.388 [Raposa Serra do Sol]”.
O ministro também destacou que está aberta a oportunidade para ampla participação de todos os setores interessados no deslinde de demandas como esta, com a possibilidade de intervenção na qualidade de amigos da Corte (amici curiae) e de eventual realização de audiência pública, nos termos legais.
EC/CR
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Processo relacionado: RE 1017365
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