Crédito decorrente de aposentadoria pelo regime geral de previdência, ainda que o beneficiário tenha recebido o quinhão retroativamente após o divórcio, integra o patrimônio comum. Por isso, deve ser partilhado no limite correspondente ao período em que durou a união sob o regime de comunhão parcial de bens.

Esse foi o entendimento apresentado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul – TJRS, que havia determinado a impossibilidade da partilha de valores decorrentes de ação previdenciária nos regimes de comunhão parcial. O embasamento foi no artigo 1.659, inciso VI, do Código Civil.

Na ação de sobrepartilha, a mulher alegou que o crédito de natureza previdenciária recebido pelo ex-marido após o divórcio deveria ser dividido entre eles. Em sua defesa, pontuou que a ação contra o Instituto Nacional do Seguro Social – INSS foi ajuizada durante o casamento e a aposentadoria foi concedida de forma retroativa, alcançando o período em que eles estiveram casados.

O juiz responsável pelo caso no TJRS manteve a sentença de primeira instância com o fundamento de que os créditos provenientes do trabalho pessoal, bem como os valores de aposentadoria, seriam incomunicáveis. Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial no STJ, a incomunicabilidade geraria “injustificável distorção”.

Injustificável distorção

“Tal qual nas hipóteses de indenizações trabalhistas e de recebimento de diferenças salariais em atraso, a eventual incomunicabilidade dos proventos do trabalho geraria uma injustificável distorção, em que um dos cônjuges poderia possuir inúmeros bens reservados, frutos de seu trabalho, e o outro não poderia tê-los porque reverteu, em prol da família, os frutos de seu trabalho”, afirmou Nancy Andrighi.

A ministra também atentou à jurisprudência, identificando a existência de consenso entre as turmas de direito privado do STJ no sentido da comunhão e partilha de indenizações trabalhistas correspondentes a direitos adquiridos na constância do vínculo conjugal, ainda que a quantia tenha sido recebida após a dissolução do casamento ou da união estável. Para a ministra, o mesmo tratamento deve ser dispensado à aposentadoria pelo regime geral.

Ela ressaltou que se a aposentadoria tivesse sido deferida durante a constância do casamento, haveria a comunicação dos valores auferidos até o momento do divórcio. Há, segundo Nancy, famílias em que apenas um dos cônjuges desenvolve atividade remunerada, para que o outro permaneça em casa, ou, ainda, casais que dividem tarefas de modo que um se responsabiliza pelas obrigações principais da família, enquanto o outro cuida dos investimentos para garantir o futuro familiar.

Ao dar provimento ao recurso da ex-mulher, a ministra Nancy Andrighi estabeleceu que o recebimento posterior do benefício, mas referente a contribuições ocorridas à época da relação conjugal, deve ser igualmente objeto de sobrepartilha, observado o período compreendido entre a data do indeferimento do pedido administrativo pelo INSS e a data do divórcio. O número do processo não foi divulgado em razão de segredo judicial.

Decisão coerente

“A decisão é coerente com a jurisprudência consolidada no âmbito do STJ no sentido de que as indenizações trabalhistas e outras verbas salariais recebidas após o divórcio, mas referentes a atividades prestadas durante o casamento, devem ser objeto de partilha”, comenta Mário Delgado, diretor nacional Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM.

Ele acrescenta: “De modo que o mesmo raciocínio teria necessariamente que ser aplicado no tocante ao crédito de aposentadorias que deveriam ter sido recebidas durante o casamento, mas só o foram após o divórcio”.

Delgado também avalia a divergência no entendimento ao inciso VI do artigo 1.659 do Código Civil, que prevê a exclusão da comunhão os proventos do trabalho pessoal de cada cônjuge.

“A interpretação que se extrai do inciso VI do artigo 1.659 do CC é abrangente dos frutos e proventos do trabalho, quer seja na atividade ou na inatividade, somente se excluindo da comunhão o direito à percepção, mas não o produto e os frutos do trabalho adquiridos pelo casal, onerosamente, durante a sociedade conjugal”, explica o especialista.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)

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