​O interesse em conhecer, interpretar e transformar o mundo ao redor caminha com a humanidade desde tempos imemoriais. Enquanto os primeiros indícios de um método científico de pesquisa datam do Egito Antigo e da Grécia Antiga, o desenvolvimento de ferramentas úteis ao homem nasce ainda na Idade da Pedra – na chamada pré-história humana, de onde se originam os mais antigos registros da confecção de instrumentos pontiagudos e da capacidade de dominar o fogo.

De forma ininterrupta, era após era, a humanidade atravessou diversas fases do conhecimento científico e das inovações em tecnologia: evoluímos da pedra lascada aos carros autônomos, das lanças de madeira aos lançamentos de naves ao espaço. Entretanto, da mesma forma que é possível crer que as primeiras ferramentas rudimentares ampliaram as disputas entre grupos humanos – por alimentos, território e abrigo –, também agora, a cada passo científico e tecnológico, novos conflitos continuam a surgir, alterando as relações humanas e modificando conceitos como poder, privilégio, ética e sobrevivência.

Ainda que os estudos científicos e tecnológicos contemporâneos estejam assentados em algumas bases éticas e de conduta, a criação e a inovação ocorrem, por óbvio, antes que sejam claros os seus impactos e que seja debatida a necessidade de regulamentação de seus usos.

Como o processo normativo no âmbito do Legislativo e do Executivo é geralmente complexo e demorado, muitos conflitos relacionados às inovações chegam primeiro ao Judiciário, responsável por analisar os casos concretos e aplicar um ordenamento jurídico que, não raro, nem chegou a fixar normas mínimas sobre criações que acabaram de sair dos laboratórios.

Exatamente por essa dinâmica, para decidir sobre um litígio relacionado a uma inovação científica ou tecnológica, o Judiciário precisa, primeiro, compreender melhor as nuances que envolvem cada tema, de forma a proferir uma decisão justa e tecnicamente embasada. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) é a corte responsável por debater em última instância vários desses temas, como ocorreu nas discussões sobre o congelamento do corpo humano em busca da imortalidade e o mercado de criptomoedas.

Criog​​enia

Entre os desejos mais antigos da humanidade, a imortalidade é um dos mais perseguidos ao longo dos tempos. Atributo creditado aos deuses e prometido pelas religiões, a vida eterna – ao menos do ponto de vista físico – ainda não foi atingida, o que não impede as pessoas de esperarem que, algum dia, a evolução científica a torne possível.

Mas como aguardar pela imortalidade diante da presença da morte? Para os antigos, a solução passava por técnicas como a mumificação de corpos; para os atuais, a ciência estuda procedimentos como a criopreservação, técnica de congelamento do corpo humano, em baixíssima temperatura, com o propósito de reanimação futura, caso sobrevenham novas descobertas capazes de ressuscitar o indivíduo e curar sua doença.

No REsp 1.693.718, a Terceira Turma precisou entender o processo de congelamento de corpos ao analisar litígio que dividiu uma família: enquanto uma das filhas do falecido pretendia mantê-lo em criogenia nos Estados Unidos – defendendo ser esse o desejo manifestado pelo pai em vida –, as suas irmãs buscavam realizar o sepultamento tradicional.

O relator do caso, ministro Marco Aurélio Bellizze, apontou que, embora o sepultamento seja o destino da maior parte dos corpos no Brasil, existem outras formas previstas pela legislação, como a cremação (artigo 77 da Lei 6.015/1973) e a entrega do corpo para estudos médicos ou científicos (artigo 14 do Código Civil e Lei 8.501/1992).

Com base em parecer juntado aos autos, o ministro explicou que, na criogenia – forma de destinação de corpo não prevista na legislação brasileira –, quando um paciente é declarado morto, os médicos tentam evitar a deterioração do corpo, injetando-lhe medicamentos e utilizando máquinas que mantêm a circulação do sangue e a oxigenação. Depois, o paciente é encaminhado a uma clínica especializada, tratado com outras substâncias e colocado em um cilindro com nitrogênio líquido, onde é permanentemente monitorado.

Segundo o ministro, embora já exista no Brasil a criopreservação de alimentos, sêmen, cordão umbilical e óvulos fertilizados, o caso dos autos seria o primeiro do país no qual foi utilizada a técnica da criogenia (o processo começou em território nacional, logo após a morte, e foi concluído nos Estados Unidos).

Corpo, não ​​patrimônio

Entretanto, o relator lembrou que a discussão dos autos não consistia em saber se seriam válidos os efeitos da criogenia sobre o corpo do pai, mas sim a validade da manifestação de sua última vontade, e se essa manifestação poderia afrontar o ordenamento jurídico brasileiro.

Bellizze também destacou que, na ausência de previsão legal sobre o procedimento de criogenia pós-morte, o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro prevê que o juiz deve decidir de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Nesse cenário, o ministro entendeu que, além de não haver norma que proíba a submissão de corpos à criogenia, não há ofensa à moral ou aos bons costumes, já que não há a transformação do corpo em uma espécie de “patrimônio”. De igual forma, não há exposição pública do cadáver – o que seria incompatível com as normas sanitárias e de saúde pública.

Além disso, ressaltou, o procedimento é realizado com respeito aos restos mortais, pois o corpo é acondicionado em local preservado, sem impedir a visitação pela família.

“A solução da controvérsia perpassa pela observância ao postulado da razoabilidade, porquanto, a par do reconhecimento de que o de cujus realmente desejava ser submetido ao procedimento da criogenia após a morte, não se pode ignorar, diante da singularidade da questão discutida, que a situação fático-jurídica já se consolidou no tempo, impondo-se, dessa forma, a preservação do corpo do pai da recorrente e das recorridas submetido ao procedimento da criogenia”, finalizou o ministro.

Ap​licativo de transporte 

No universo das inovações tecnológicas, a mobilidade sempre representou um ponto central de interesse humano. Para encurtar distâncias e agilizar a movimentação de cargas e pessoas, desenvolveu-se uma complexa rede de transportes no mundo, que, hoje, está acessível a partir de um simples toque no celular, como nos sistemas de transporte por aplicativo.

Nesse modelo de transporte, novas relações foram estabelecidas entre clientes e prestadores de serviço, e também entre os prestadores e as empresas responsáveis pelos aplicativos – relações que também não escapam aos conflitos. No CC 164.544, a Segunda Seção analisou a eventual existência de relação empregatícia entre um motorista e a Uber, no contexto de um pedido do prestador de serviços para reativação de sua conta.

O ministro Moura Ribeiro, relator do conflito, destacou que a atividade desenvolvida pelos motoristas de aplicativos foi reconhecida pela Lei 13.640/2018 como sendo de caráter privado, realizada por meio de sistema informatizado conhecido como peer-to-peer platforms ou peer platform markets – ou seja, um mercado que se baseia no compartilhamento de serviços entre particulares.

​Nesse novo sistema de requisição individual de transporte, Moura Ribeiro apontou que os motoristas, executores da atividade, atuam como empreendedores individuais, sem vínculo de emprego com a empresa proprietária da plataforma.

“Em suma, tratando-se de demanda em que a causa de pedir e o pedido deduzidos na inicial não se referem à existência de relação de trabalho entre as partes, configurando-se em litígio que deriva de relação jurídica de cunho eminentemente civil, é o caso de se declarar a competência da Justiça estadual”, concluiu o ministro.

Espelhamento do W​​hatsApp

Se a comunicação, para o homem, nasce com o próprio início da vida em sociedade, o desenvolvimento dos sistemas de comunicações também tem origens ancestrais. Da comunicação verbal à escrita, das pinturas rupestres à impressão, da carta ao telefone celular, novas maneiras de trocar informações foram progressivamente surgindo na história, tendo hoje entre os seus principais representantes os aplicativos de mensagens instantâneas, a exemplo do WhatsApp.

Como nem todo uso dos sistemas de comunicação tem finalidade lícita, os métodos de investigação criminal também se voltaram para a obtenção de informações trocadas nesses meios – a interceptação telefônica é um de seus exemplos mais conhecidos. Entretanto, com a multiplicidade de novas formas de trocas de mensagens, quais são as possibilidades e os limites da intervenção policial para finalidades investigatórias?

O tema foi analisado recentemente pela Sexta Turma, em caso no qual o juiz autorizou que a polícia apreendesse o celular de um suspeito de tráfico de drogas e fizesse o espelhamento, via QR Code, das mensagens recebidas e enviadas por ele. Após a obtenção das informações, o magistrado decretou a prisão preventiva do investigado.

Relatora do habeas corpus, a ministra Laurita Vaz explicou que, por se tratar de medida vinculada a recente evolução tecnológica, a solução jurídica do caso exigia a compreensão prévia das características do espelhamento das informações do aplicativo, da forma de operacionalização dessa prática e das possibilidades abertas ao investigador criminal.

A ministra lembrou que o espelhamento das mensagens do WhatsApp ocorre no site da própria empresa, no qual é gerado um QR Code – lido pelo celular do usuário que pretende usufruir do serviço. Por isso, explicou, foi necessária a apreensão, ainda que por um breve período de tempo, do celular do investigado.

Segundo a relatora, a leitura do código pode ser realizada com a opção “mantenha-me conectado”, hipótese em que o emparelhamento entre o celular e o computador será feito por tempo indeterminado, até que o usuário decida encerrar o espelhamento.

Analogia impo​​ssível

No caso dos autos, a ministra esclareceu que, após ter apreendido o celular e realizado o espelhamento, a polícia teve acesso às conversas que já estavam registradas no WhatsApp do suspeito e, ainda, às novas mensagens trocadas a partir dali, iniciadas por ele ou por algum de seus contatos.

Além disso, Laurita Vaz enfatizou que, tanto no aplicativo quanto no navegador, é possível, com total liberdade, o envio de novas mensagens e a exclusão de informações antigas ou recentes (após o espelhamento).

“A meu ver, a análise acerca de como funciona o espelhamento do WhatsApp demonstra ser impossível, tal como pretendido no acórdão impugnado, proceder a uma analogia entre o instituto da interceptação telefônica (artigo 1º da Lei 9.296/1996) e a medida que foi tomada no presente caso”, apontou a ministra.

De acordo com a relatora, enquanto nas interceptações telefônicas o investigador policial atua como mero observador das conversas de terceiros, no espelhamento via WhatsApp, a polícia tem a possibilidade de atuar como participante dos diálogos. Adicionalmente, ao contrário da investigação telefônica – em que as conversas registradas são apenas aquelas existentes após a autorização judicial –, o espelhamento via QR Code viabiliza ao investigador o acesso a qualquer comunicação realizada antes da ordem judicial.

Ao anular a decisão judicial que autorizou o espelhamento, a ministra ainda ressaltou que a interceptação telefônica é feita sem a necessidade simultânea de busca pessoal ou domiciliar para a apreensão do telefone, ao passo que, na hipótese do espelhamento, é necessária a apreensão do celular e posterior devolução “desacompanhada de qualquer menção, por parte da autoridade policial, à realização da medida constritiva, ou mesmo, porventura, acompanhada de afirmação falsa de que nada foi feito” (processo sob segredo judicial).

Criptomoe​​das

Além da circulação de pessoas, mercadorias e informações, a civilização aprimorou progressivamente os sistemas de trocas e movimentação de valores, partindo de formas como o escambo e as moedas de ouro ou prata para chegar ao papel-moeda e, finalmente, às operações com cartões de crédito e outras transações virtuais.

Entre os meios virtuais, em 2009, foi criado o sistema de criptomoedas, tecnologia baseada na criptografia e na descentralização das operações financeiras com o dinheiro eletrônico, que tem no bitcoin seu principal expoente. Ao lado dos diversos benefícios com a sua utilização, também surgiram vários questionamentos sobre a confiabilidade e a segurança dessas transações financeiras.

No CC 161.123, por exemplo, a Terceira Seção analisou o juízo responsável por julgar supostos crimes cometidos por um homem que captaria pessoas para investimentos em bitcoins, em troca da promessa de rentabilidade fixa e elevada. Essas operações, segundo o Ministério Público, não teriam sido declaradas à Receita Federal e não teriam respeitado as exigências da Lei 9.613/1998.

A ação penal teve início da Justiça estadual de São Paulo, mas o Ministério Público questionou a tramitação por entender que os elementos apurados indicavam crimes de competência da Justiça Federal. Posteriormente, a própria Justiça Federal suscitou o conflito de competência.

O ministro Sebastião Reis Júnior destacou que as empresas que negociam ou guardam as chamadas moedas virtuais em nome dos usuários não são reguladas, autorizadas ou supervisionadas pelo Banco Central, em razão da ausência de base legal ou regulatória que integre tal mercado ao Sistema Financeiro Nacional.

No mesmo sentido, o ministro apontou que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) tem interpretado que a negociação de criptomoedas está fora de seu perímetro regulatório, pois não as considera valor mobiliário.

“Com efeito, entendo que a conduta investigada não se amolda aos crimes previstos nos artigos 7º,inciso II, da Lei 7.492/1986, e 27-E da Lei 6.385/1976, notadamente porque a criptomoeda, até então, não é tida como moeda nem valor mobiliário”, afirmou o ministro ao afastar a competência da Justiça Federal e determinar a remessa dos autos à Justiça estadual.

Em caso também relacionado ao mercado de bitcoins, no REsp 1.696.214, a Terceira Turma concluiu que o encerramento de conta-corrente utilizada para a comercialização da criptomoeda não configura prática abusiva por parte do banco.

No julgamento, ao afastar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor – já que a empresa de criptomoedas realiza a abertura da conta com o objetivo de intermediação, e não de consumo –, o colegiado considerou lícito que a instituição bancária, no exercício de sua autonomia privada, encerrasse a conta-corrente da empresa, sendo necessária apenas a prévia notificação antes do rompimento do vínculo contratual.
Destaques de hoje

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1693718CC 164544CC 161123REsp 1696214

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar a Pet 12.344, de relatoria do ministro Og Fernandes, no dia 28 de outubro, determinou o cancelamento da Súmula 408. O colegiado entendeu desnecessária a convivência da súmula com tese de recurso repetitivo sobre a mesma questão (Tema 126).

O texto do enunciado cancelado estabelecia que, “nas ações de desapropriação, os juros compensatórios incidentes após a Medida Provisória 1.577, de 11 de junho de 1997, devem ser fixados em 6% ao ano até 13 de setembro de 2001 e, a partir de então, em 12% ao ano, na forma da Súmula 618 do Supremo Tribunal Federal (STF)”.

Com o julgamento da Pet, a tese fixada no julgamento do Tema 126, a qual possuía exatamente o mesmo conteúdo da súmula cancelada, teve seu texto alterado e passou a dispor que “o índice de juros compensatórios na desapropriação direta ou indireta é de 12% até 11 de junho de 1997, data anterior à vigência da MP 1.577/1997”.

Simplificaç​​ão

Em seu voto, o ministro Og Fernandes destacou que a medida teve como objetivo a simplificação da prestação jurisdicional.  Ele ponderou ainda ser “inadequada qualquer tese que discorra sobre a compreensão do Supremo” – por esse motivo, a adequação no texto do Tema 126.

Isso porque as ações que chegavam ao STJ até então pretendiam discutir a interpretação direta dos efeitos da decisão proferida pelo STF na cautelar que deu origem à Súmula 618, utilizada como referência para a interpretação do STJ nos casos relacionados aos juros compensatórios em ações de desapropriação.

Ao justificar o novo entendimento da Primeira Seção, Og Fernandes afirmou que ele consagra “a jurisprudência anterior à inovação normativa (MP 1.577/97), sem avançar quanto à discussão dos efeitos da MP à luz da decisão do Supremo ou de sua constitucionalidade”.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):Pet 12344

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas por beneficiário de plano de saúde fora da rede credenciada é obrigatório somente em hipóteses excepcionais – tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento.

A decisão foi proferida em embargos de divergência opostos por um consumidor contra acórdão da Quarta Turma, que negou pedido de indenização por danos morais e materiais contra a operadora do plano após ela se negar a cobrir uma cirurgia feita por médico e em hospital não integrantes da rede credenciada.

Em primeiro grau, a ação de indenização do consumidor foi julgada improcedente porque não ficou comprovada situação de urgência nem a indisponibilidade do tratamento na rede credenciada. Mesmo reconhecendo essas circunstâncias, o Tribunal de Justiça do Espírito Santo condenou a operadora a reembolsar parcialmente o beneficiário, apenas no montante que seria gasto por ela caso o procedimento fosse feito na rede credenciada.

Nos embargos de divergência, o consumidor alegou que a decisão da Quarta Turma divergiu de julgados da Terceira Turma do STJ que deram interpretação extensiva à Lei 9.656/1998 e determinaram o reembolso mesmo quando não caracterizada a situação de urgência ou emergência médica.

Previsão le​​gal

O relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze, afirmou ser incontroverso nos autos que o tratamento não era de urgência ou emergência, bem como que a rede credenciada, embora em tese pudesse não ter o mesmo nível de excelência, era suficiente para prestar o atendimento necessário.

Segundo o ministro, no contrato de plano de assistência à saúde, os diferentes níveis de qualificação de profissionais, hospitais e laboratórios próprios ou credenciados postos à disposição do contratante estão devidamente especificados e são determinantes para definir o valor da contraprestação assumida pelo consumidor.

Bellizze mencionou o artigo 12, inciso VI, da Lei 9.656/1998, segundo o qual, “excepcionalmente, nos casos de urgência e emergência, em que não se afigurar possível a utilização dos serviços médicos próprios, credenciados ou conveniados, a empresa de plano de saúde, mediante reembolso, responsabiliza-se pelas despesas médicas expendidas pelo contratante em tais condições, limitada, no mínimo, aos preços de serviços médicos e hospitalares praticados pelo respectivo produto”.

Garantia ao c​​onsumidor

Os julgados paradigmas da Terceira Turma – destacou o relator – entenderam que as hipóteses previstas no citado dispositivo seriam um rol meramente exemplificativo, o que daria ao beneficiário o direito de ser reembolsado fora dos casos de urgência e emergência, os quais seriam apenas exemplos (e não requisitos) dessa segurança para os consumidores.

Para Bellizze, a limitação imposta pela lei é uma garantia conferida ao contratante de plano de assistência à saúde, a ser observada, inclusive, no plano-referência, de cobertura básica, “de modo que não se pode falar em ofensa ao princípio da proteção da confiança nas relações privadas, já que os beneficiários do plano estarão sempre amparados, seja pela rede credenciada, seja por outros serviços de saúde quando aquela se mostrar insuficiente ou se tratar de situação de urgência”.

Na hipótese dos autos, o ministro verificou que o procedimento realizado pelo beneficiário não se enquadrava nas situações de urgência ou emergência – como reconhecido pelas instâncias ordinárias –, razão pela qual não era o caso de se determinar o reembolso das despesas, por completa ausência de previsão legal e contratual.
Destaques de hoje

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ reformou acórdão do Tribunal de Justiça da Paraíba – TJPB com o entendimento de que em negócios celebrados após a entrada em vigor do Código Civil de 2002, deverá ser aplicada a regra do seu artigo 1.647 inciso I – que prevê a dispensa da autorização conjugal como condição de eficácia da hipoteca no regime da separação absoluta de bens –, mesmo que o casamento tenha acontecido ainda sob o Código Civil de 1916.

Desta maneira, o STJ determinou que, em virtude da falta de autorização das esposas dos dois sócios de uma empresa, havia declarado a nulidade da hipoteca de imóvel dado em garantia no momento da celebração de contrato de crédito industrial. 

Anteriormente o TJPB havia decidido que como os casamentos foram realizados na vigência do CC/1916, deveriam ser obedecidas as normas desse código, inclusive em relação à necessidade de consentimento sobre a garantia, mesmo na hipótese de regime de separação de bens.

A relatora do recurso especial, ministra Nancy Andrighi, lembrou que o artigo 1.687 do CC/2002 prevê que, estipulada a separação de bens, o patrimônio permanecerá sob a administração exclusiva de cada um dos cônjuges, que poderá livremente aliená-lo ou gravá-lo com ônus real. Entretanto, ela citou que, segundo o artigo 2.039 do mesmo código, o regime de bens nos casamentos celebrados na vigência do CC/1916 é por ele estabelecido.

Segundo a ministra, o artigo 2.039, ao fixar uma regra de transição quanto ao regime de bens, teve por finalidade disciplinar as relações familiares entre os cônjuges na perspectiva patrimonial, regulando como ocorrerá, por exemplo, a partilha dos bens por ocasião da dissolução do vínculo conjugal.

Por esse motivo, a relatora entendeu que não seria possível concluir que o artigo 2.039 do CC/2002 deva influenciar, na perspectiva do direito intertemporal e da definição da legislação aplicável, as hipóteses em que deveria ser dada autorização conjugal, pois esse instituto, “a despeito de se relacionar com o regime de bens (pois, em última análise, visa proteger o patrimônio do casal), é, na realidade, uma condição de eficácia do negócio jurídico cuja validade se examina”.

Leia o acórdão na íntegra.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)

A Terceira Turma do STJ extinguiu uma ação de alimentos movida pelo pai contra a mãe de seus filhos. Como a guarda das crianças, inicialmente unilateral para o pai, passou a ser compartilhada entre o ex-casal, com residência fixa para a genitora, ele não tem legitimidade para prosseguir na execução dos alimentos vencidos.

De acordo com os autos, os filhos estavam na guarda unilateral do genitor e, em 2011, foram fixados alimentos provisórios a serem pagos pela mãe às duas crianças. Como ela se tornou inadimplente, os filhos passaram a ser representados judicialmente pelo pai em ação de execução.

Inicialmente, o feito tramitou sob o rito da prisão. Posteriormente, o processo passou a seguir a penhora de bens e, por último, sob a denominação de cumprimento de sentença de alimentos. Em 2013, contudo, a guarda das crianças passou a ser compartilhada, com a residência referencial fixa sendo a materna e o pagamento de pensão pelo pai.

Diante da dívida pretérita ainda em execução, a mãe requereu a sua extinção uma vez que os filhos foram morar com ela, não tendo o pai a capacidade processual para representá-los em juízo, conforme o artigo 8º do Código de Processo Civil de 1973, vigente à época.

O juízo de primeiro grau e o Tribunal de Justiça de Santa Catarina – TJSC entenderam que era lícito ao pai continuar executando, em seu nome, os alimentos no período em que as crianças viveram sob a sua guarda. No STJ, o ministro Moura Ribeiro buscou evitar que o alimentante, a despeito de inadimplente, se beneficie com a extinção da obrigação alimentar, o que poderia acarretar enriquecimento sem causa.

Valor cobrado ultrapassava R$ 150 mil

Rodrigo Fernandes Pereira, advogado em Florianópolis/SC e segundo vice-presidente do Conselho Fiscal do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, que atuou no caso, destacou que a decisão do ministro reconheceu expressamente as teses da mãe.

“A decisão em comento foi importante para a minha constituinte, que se livrou de uma dívida superior a R$ 150 mil que ela verdadeiramente não era devedora. Seja porque não havia decisão judicial que a sustentasse ou porque o pai não podia cobrar em nome dos filhos pensão alimentícia vencida, sem embargo inclusive do que prevê a Súmula 621 do Tribunal da Cidadania”, afirma.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM

O Superior Tribunal de Justiça – STJ rejeitou um habeas corpus preventivo impetrado em favor de dois moradores de São José do Rio Preto, em São Paulo, contra a eventual obrigatoriedade da vacina do novo coronavírus – Covid-19.

De acordo com o pedido, o governador de São Paulo, João Doria, deu a entender em declarações à imprensa que a vacina para o combate à doença teria caráter obrigatório – o que violaria as liberdades constitucionais do cidadão. Segundo a petição, deveria ser respeitada a vontade do indivíduo de se submeter ou não a determinado procedimento terapêutico.

Para o ministro Og Fernandes, relator do caso, não ficou demonstrado nenhum ato ilegal ou abusivo do governador que prejudicasse ou ameaçasse concretamente a liberdade de locomoção dos pacientes do habeas corpus.

O ministro explicou que o STJ “tem refinado o cabimento do habeas corpus, restabelecendo o alcance aos casos em que demonstrada a necessidade de tutela imediata à liberdade de locomoção, de forma a não ficar malferida ou desvirtuada a lógica do sistema processual vigente”.

Segundo Og Fernandes, não há informação nos autos a respeito do momento em que a vacina será, em larga escala, colocada à disposição da população, tampouco foram especificadas quais seriam as sanções ou restrições aplicadas pelo poder público a quem deixasse de atender ao chamamento para a vacinação. Leia a decisão.

Movimento antivacina

Em junho, a advogada Marianna Chaves, presidente da Comissão de Biodireito e Bioética do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, relatou preocupação com o movimento antivacina. Ela apontou que o fenômeno existe há tempos e por razões diversas, que vão desde a desinformação causada por teorias infundadas até doutrinações religiosas.

Leia mais: Crenças religiosas e notícias falsas têm dado força ao movimento antivacina; leis e decisões judiciais buscam coibir

O instituto do usufruto vidual – previsto pelo Código Civil de 1916 como um direito do cônjuge viúvo de usufruir dos bens do falecido quando o regime do casamento não é a comunhão universal – não pode ser reconhecido se o casal tiver realizado a separação judicial de corpos com a meação de bens. Essa proibição ocorre porque o princípio atrelado ao instituto é a manutenção do mínimo existencial para a parte sobrevivente, situação superada caso ela tenha recebido patrimônio antes do falecimento do cônjuge.

Com base nesse entendimento, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que negou a uma viúva o reconhecimento do usufruto vidual no curso da ação de inventário. Para a corte local, a mulher já havia sido contemplada com a meação de bens no momento da separação de corpos – ocorrida dois anos antes do falecimento. 

Segundo o artigo 1.611, parágrafo 1º, do CC/1916, é garantida ao cônjuge vivo a quarta parte dos bens do falecido se houver filhos, ou a metade do patrimônio no caso de não terem filhos. Na hipótese dos autos, a viúva era casada sob o regime de comunhão parcial de bens.

No recurso especial dirigido ao STJ, ela alegou que cumpriu os dois requisitos do código revogado para a concessão do usufruto: o regime de bens diferente do da comunhão universal e o estado de viuvez. Além disso, alegou que o usufruto vidual deve ser reconhecido independentemente de eventual meação a que tenha direito a parte sobrevivente.

Mínimo necessário

O ministro Marco Buzzi, relator do recurso, explicou que o instituto do usufruto vidual tinha por objetivo a salvaguarda do mínimo necessário ao cônjuge que não era beneficiado, de forma obrigatória, com a herança do falecido, como no caso de comunhão parcial ou de separação absoluta de bens.

Segundo o relator, o Código Civil de 2002 não abarcou esse instituto nos mesmos moldes do código anterior, porém estendeu o direito real de habitação a todos os regimes de bens (artigo 1.831 do CC/2002), elevando o cônjuge ao patamar de herdeiro necessário.

Em relação ao artigo 1.611, parágrafo 1º, do CC/1916, Marco Buzzi apontou que, ao prescrever como condição para o reconhecimento do usufruto vidual que o regime de bens do casamento não fosse o da comunhão universal, há a ideia subjacente de que aquele que foi contemplado com a meação ou com quinhão igual ou superior à meação não faz jus ao usufruto.

“No caso dos autos, em razão da meação efetivamente atribuída à esposa, é incontroverso que a recorrente foi aquinhoada com significativa parcela do patrimônio do de cujus, fração esta que lhe garante meios suficientes de subsistência, tornando desnecessário, para não dizer injusto e penoso aos herdeiros, atribuir a seu favor usufruto vidual sobre a parcela dos bens objeto da herança”, concluiu o ministro ao manter o entendimento do TJSP.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1280102

​​​​​O comprador de imóvel que se submete a pacto de alienação fiduciária em garantia, caso busque judicialmente a resolução do contrato e a devolução dos valores pagos com base apenas na alegação de que não consegue mais honrar as prestações, não tem direito à devolução do dinheiro após a simples retenção de um percentual em favor do vendedor, nos moldes previstos pelo Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Nesses casos, com a configuração da hipótese de quebra antecipada do contrato, aplica-se o previsto nos artigos 26 e 27 da Lei 9.514/1997, que preveem a entrega ao devedor, concluída a venda do bem em leilão, do valor que sobrar do pagamento do total da dívida, das despesas e dos encargos incidentes.

O entendimento foi fixado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que, com base no CDC, havia determinado a resolução do contrato de compra e venda de imóvel com a retenção, em favor do credor, de 20% da quantia paga.

Relator do recurso do vendedor, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino explicou que o diferencial da alienação fiduciária é a possibilidade de realização do crédito por via extrajudicial, sendo a cobrança efetuada por meio de oficial do registro de imóveis, a quem compete intimar o devedor a pagar a dívida, acrescida de juros e demais encargos, no prazo de 15 dias.

“Não purgada a mora, ao oficial compete, ainda, promover o registro na matrícula do imóvel da consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário, quando, então, será deflagrado o procedimento de venda extrajudicial do bem mediante leilões”, acrescentou.

Entretanto, o relator lembrou que, no caso dos autos, foi o adquirente que ajuizou a ação de resolução de contrato, mesmo sem o vendedor, em princípio, ter dado causa ao litígio.

Alegação genérica

Nesse cenário, Sanseverino destacou que, na maioria das vezes, a ação de resolução – proposta normalmente pelo credor – tem como causa a ocorrência de inadimplemento, como previsto pelo artigo 475 do Código Civil. Entretanto, apontou, existem hipóteses em que o pedido de resolução é formulado pelo devedor, como no caso de bem que perece ou se deteriora sem culpa do adquirente (artigos 234 e 235 do CC/2002).

Além disso, ressaltou o ministro, é possível o pedido de resolução com base na onerosidade excessiva – hipótese, entretanto, não compatível com o caso em julgamento, no qual não foram apontados, pelo autor, os requisitos de vantagem extrema de uma das partes ou de acontecimento extraordinário ou imprevisível (artigo 478 do código).

No caso sob análise – disse Sanseverino –, se houve descumprimento, não foi por parte do credor, mas do devedor, autor da ação de resolução, que manifestou comportamento contrário à execução do contrato, alegando genericamente não ter condições de continuar pagando as prestações. Para o ministro, criou-se uma situação inusitada, fora das hipóteses previstas pela legislação.

Quebra antecipada

Paulo de Tarso Sanseverino afirmou que a conduta do adquirente pode ser relacionada ao instituto da quebra antecipada, no qual há o inadimplemento mesmo antes do vencimento, quando o devedor pratica atos abertamente contrários ao cumprimento do contrato, a exemplo da tentativa de resolução do acordo. Ainda assim – ressaltou –, o credor não discordou do pedido de resolução, mas sim da forma como os valores seriam devolvidos ao adquirente.

Em consequência, nessa hipótese, o relator entendeu que poderia ser acolhida a resolução do contrato pelo desinteresse do adquirente em permanecer com o bem; todavia, a devolução dos valores pagos não deve ocorrer na forma do artigo 53 do CDC – segundo o qual, após ressarcidas as despesas do vendedor mediante a retenção de parte do pagamento, devolve-se o restante ao adquirente.

“A devolução dos valores pagos deverá observar o procedimento estabelecido nos artigos 26 e 27 da Lei 9.514/1997, pelo qual, resolvido o contrato de compra e venda, consolida-se a propriedade na pessoa do credor fiduciário, para, então, submeter-se o bem a leilão, na forma dos parágrafos 1º e 2º do artigo 27, satisfazendo-se o débito do autor ainda inadimplido e solvendo-se as demais dívidas relativas ao imóvel, para devolver-se o que sobejar ao adquirente, se sobejar”, concluiu o ministro ao dar provimento ao recurso do credor.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1867209

​​​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que determinou que um ex-empregado desligado há mais de dez anos e sua esposa sejam mantidos em plano de saúde originalmente contratado pela empresa. Embora seja de dois anos o tempo máximo de permanência do empregado demitido no plano coletivo – como previsto no artigo 30, parágrafo 1º, da Lei 9.656/1998 –, o ex-empregador manteve o casal no plano de assistência por mais de uma década, tendo os beneficiários assumido o pagamento integral.

Para o colegiado, o longo tempo de permanência no plano despertou nos beneficiários a confiança de que não perderiam a assistência de saúde, de modo que a sua exclusão neste momento, passada uma década do desligamento profissional e quando eles já estão com idade avançada, violaria o princípio da boa-fé objetiva.

De acordo com o processo, em razão do contrato de trabalho, o ex-funcionário era beneficiário, com sua esposa, do plano de saúde. Ele foi demitido em 2001, mas a participação no plano foi estendida até 2013, quando o ex-empregado, então com 72 anos de idade, foi notificado pelo antigo empregador de sua exclusão.

Ao determinar o restabelecimento do plano de saúde e a indenização aos beneficiários pelos gastos com a contratação de um novo plano assistencial, o TJRJ levou em consideração que a idade avançada do ex-empregado dificultava a adesão a novos planos, em razão do elevado valor do prêmio. Além disso, de acordo com o tribunal fluminense, o idoso deve ser considerado pessoa vulnerável, nos termos do artigo 230 da Constituição.

Confiança e supressio

Tanto o ex-empregador quanto o plano de saúde recorreram ao STJ. Segundo o ex-empregador, o julgamento do TJRJ violou o artigo 30, parágrafo 1º, da Lei 9.656/1998 ao determinar que o beneficiário permaneça eternamente vinculado ao plano. Já a empresa que administra o plano de saúde questionou, entre outros pontos, a ordem para disponibilizar apólices individuais aos beneficiários, pois ela não comercializaria mais essa modalidade de assistência.

A relatora dos recursos, ministra Nancy Andrighi, mencionou a doutrina sobre o tema para dizer que, segundo o princípio da responsabilidade pela confiança – uma das vertentes da boa-fé objetiva –, aquele que origina a confiança de alguém deve responder, em certas circunstâncias, pelos danos causados.

supressio, exemplo da responsabilidade pela confiança – traduzida como um “não exercício abusivo do direito”, nas palavras da ministra –, indica a possibilidade de se considerar suprimida determinada obrigação contratual na hipótese em que o credor, por não a exigir, fizer surgir no devedor a legítima expectativa de que essa supressão se prorrogará no tempo.

“Implica, assim, a redução do conteúdo obrigacional pela inércia qualificada de uma das partes, ao longo da execução do contrato, em exercer determinado direito ou faculdade, criando para a outra a percepção válida e plausível – a ser apurada casuisticamente – de ter havido a renúncia àquela prerrogativa”, explicou.

Frustração

No caso dos autos, Nancy Andrighi entendeu que a manutenção do ex-empregado no plano de saúde por liberalidade do antigo empregador, consolidada pelo prolongado decurso do tempo, é circunstância capaz de criar no beneficiário a confiança de que a empresa renunciara ao direito de exclui-lo.

Por isso, segundo a ministra, “esse exercício agora, quando já passados dez anos, e quando os beneficiários já contam com idade avançada, gera uma situação de desequilíbrio inadmissível entre as partes, que se traduz no indesejado sentimento de frustração”.

Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1879503

Em ações de divórcio, não apenas as propriedades constituídas formalmente compõem a lista de bens adquiridos pelos cônjuges na constância do casamento e sujeitos à partilha, mas também tudo aquilo que tem expressão econômica e que, por diferentes razões, não se encontra legalmente regularizado ou registrado sob a titularidade do casal. É o caso das edificações em lotes irregulares sobre os quais os ex-cônjuges têm direitos possessórios.

Estabelecendo essa tese, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ reformou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP, que, ao julgar processo de divórcio litigioso, entendeu que não seria possível a partilha dos direitos possessórios sobre um imóvel localizado em área irregular. Para a Justiça paulista, caso houvesse a regularização posterior do bem, poderia ser requerida a sobrepartilha.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso especial, lembrou que a partilha do patrimônio, seja por motivo de falecimento ou dissolução de vínculo conjugal, está normalmente associada à ideia de divisão final das propriedades constituídas anteriormente, possuindo “ares de definitividade” na solução quanto à titularidade dos bens.

Fatores que levam à falta de regularização do imóvel

Andrighi lembrou que, em alguns casos, a falta de regularização do imóvel que se pretende partilhar não ocorre por má-fé ou desinteresse das partes, mas por outras razões, como a incapacidade do Poder Público de promover a formalização da propriedade ou, até mesmo, pela hipossuficiência das pessoas para dar continuidade aos trâmites necessários para a regularização.

Nessas situações, esclareceu a relatora, os titulares dos direitos possessórios devem, sim, receber a tutela jurisdicional. Ao dar provimento ao recurso, Andrighi concluiu que a melhor solução para tais hipóteses é admitir a possibilidade de partilha dos direitos possessórios sobre o bem edificado em loteamento irregular, quando não for identificada má-fé dos possuidores.

A solução, segundo a ministra, resolve “em caráter particular e imediatamente, a questão que diz respeito somente à dissolução do vínculo conjugal, relegando a um segundo e oportuno momento as eventuais discussões acerca da regularidade e da formalização da propriedade sobre o bem imóvel”. O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)