A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o pedido de um médico que pretendia limitar os efeitos da suspensão do exercício profissional imposta contra ele em razão da acusação de fraude na emissão de laudos. No recurso rejeitado pelo colegiado, a defesa do médico pleiteava que a suspensão fosse restrita à emissão de atestados, receitas e laudos.

O relator do caso, ministro Joel Ilan Paciornik, considerou que liberar o exercício profissional com restrições a algumas atividades, como pretendido pela defesa, poderia comprometer o atendimento dos pacientes.

De acordo com o processo, o médico foi apontado como o responsável por assinar laudos falsos de hepatite C para clientes da operadora de planos de saúde Amil. Os laudos, segundo a investigação, eram utilizados para compelir a Amil a custear o tratamento dos segurados com medicamentos importados de alto custo.

Prejuízo milionário

Os investigadores estabeleceram ligações do médico com os empresários que importavam a medicação para o tratamento da hepatite C. A Amil teve um prejuízo superior a R$ 3,3 milhões, somente em 2017, em virtude das fraudes.

O profissional chegou a ser preso e depois teve a preventiva revogada em segunda instância, com a aplicação de medidas cautelares alternativas, entre as quais o impedimento do exercício da medicina.

No recurso em habeas corpus dirigido ao STJ, o médico alegou que a restrição era muito abrangente, e a cautelar seria suficiente se fosse restrita à emissão de atestados, receitas e laudos.

No entanto, segundo o ministro Joel Ilan Paciornik, não há constrangimento ilegal que justifique o atendimento do pedido. Ele destacou que as instâncias ordinárias, soberanas na análise das provas, salientaram a gravidade concreta e as circunstâncias das ações delituosas ao fundamentar a aplicação das medidas cautelares.

Prejuízo ao paciente

O ministro afirmou que os pressupostos de cautelaridade relativos à garantia da ordem pública foram atendidos, “razão pela qual não há que se falar em afastamento das medidas impostas”.

Ele destacou que a suspensão do exercício da profissão é medida razoável devido às circunstâncias do caso.

“A suspensão parcial, como sugere a combativa defesa, não se mostra possível, pois limitar a atuação de um médico implica prejuízo ao paciente, que pode ter seu tratamento comprometido”, explicou o relator.

Paciornik citou trechos de uma resolução do Conselho Federal de Medicina segundo a qual “não é possível ser meio médico”.

“Justamente no exercício de suas atribuições de médico, o recorrente contribuiu para um prejuízo superior a R$ 3 milhões num único plano de saúde. Dessa forma, não se mostra desarrazoado, ao menos por ora, o afastamento completo de suas funções.”

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) e a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) firmaram acordo com o objetivo de reduzir o número de recursos em processos de execução fiscal.

A estimativa é que, por conta dessa parceria, até o início do recesso forense de julho, 3 mil processos envolvendo a Fazenda Nacional deixem de tramitar no STJ.

Segundo o acordo, a PGFN peticionará pela desistência nos processos com créditos de “baixa recuperabilidade”, termo utilizado pela instituição para classificar os valores de dívida ativa com rating C ou D, ou seja, com pouca chance de serem efetivamente recebidos.

O acordo busca atingir objetivos de ambas as instituições: a redução do acervo de processos é uma prioridade da atual gestão do STJ, e a otimização dos processos de execução fiscal é um dos caminhos da PGFN para dar mais eficiência à gestão pública.

Proveito econômico

Segundo o presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, a iniciativa resulta da superação de uma “visão atrasada”, de recorrer sempre em todos os processos, mesmo naqueles com pouco proveito econômico ou difíceis de serem concluídos.

“Nós observamos que em muitas situações o recurso é inviável, mas mesmo assim é interposto. Isso gera uma despesa para o STJ e para o recorrente em demandas que muitas vezes não têm proveito econômico expressivo”, comentou o ministro.

Para o procurador da Fazenda José Péricles Pereira de Sousa, coordenador de atuação judicial perante o STJ, o acordo é apenas o primeiro passo no esforço de otimização do trabalho da PGFN nos tribunais superiores.

“O STJ é um tribunal de teses. Para a Fazenda, também é interessante que o tribunal possa focar na análise dos casos complexos, deixando de lado os processos com créditos de baixa recuperabilidade”, afirmou o procurador, ao destacar os fatores que levaram a instituição a adotar a iniciativa.

Pereira de Sousa explicou que os dados de cada processo são analisados em um sistema eletrônico da PGFN, que considera informações sobre o credor e avalia a qualidade dos créditos. Ele disse que, dos mais de 20 mil processos nos quais a Fazenda Nacional figura como parte no STJ, a análise foi restrita a cerca de 9 mil em que ela recorre para buscar a satisfação dos créditos.

Segundo o procurador, há casos em que a Fazenda levaria até 15 anos para recuperar algum crédito, e outros em que o credor já faliu há muito tempo, o que pode justificar a desistência. Nessas hipóteses, a estratégia da PGFN é buscar a satisfação dos créditos por outros meios.

Desistência por blocos

Pereira de Sousa disse que as desistências serão homologadas por blocos de 50 processos cada, somando, ao todo, 20 petições num primeiro momento, para totalizar mil processos. Posteriormente, o procedimento será repetido duas vezes, até atingir os 3 mil processos que já passaram pelo sistema de triagem.

O ministro João Otávio de Noronha destacou que iniciativas assim contribuem para que os ministros possam se concentrar no julgamento de processos complexos e de grande repercussão econômica para os contribuintes e para a própria União.

“Uma atitude como essa era inimaginável há uma década. É muito bom verificar a mudança na cultura organizacional aliada aos avanços tecnológicos, permitindo a otimização do tempo de todos”, afirmou.

O presidente do STJ lembrou que a tramitação em massa de processos sem a adoção de critérios racionais, além de congestionar o Judiciário, representa perdas para o governo e para a sociedade.

Noronha informou que o STJ pretende discutir esse tipo de iniciativa com outros órgãos e entidades, além de aprofundar a parceria com a PGFN.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que o termo inicial da incidência dos juros de mora sobre as parcelas vencidas posteriormente à citação (denominadas vincendas) deve observar o vencimento da respectiva parcela, pois é desse momento em diante que elas passam a ser exigíveis.

Para o colegiado, o entendimento não conflita com a tese firmada pela Segunda Seção no julgamento do Recurso Especial Repetitivo 1.301.989 (Temas 658, 659 e 741), segundo a qual, “sobre o valor dos dividendos não pagos, incide correção monetária desde a data de vencimento da obrigação, nos termos do artigo 205, parágrafo 3º, da Lei 6.404/1976, e juros de mora desde a citação”.

Segundo os ministros, a situação específica e excepcional – referente ao termo inicial dos juros moratórios decorrentes da obrigação de pagar dividendos convertida em perdas e danos sobre as parcelas vincendas – não estava em questão naquele julgamento, não tendo a seção de direito privado tratado sobre ela.

Distinção

O recurso chegou ao STJ após o trânsito em julgado do processo de conhecimento contra a empresa Oi, a qual argumentou que os juros de mora deveriam ser computados, por via de regra, a partir da citação, salvo em relação às parcelas vincendas, quando o critério deveria ser decrescente, uma vez que a mora passaria a existir a cada vencimento, e não retroativamente (da anterior citação).

O relator, ministro Villas Bôas Cueva, observou que as turmas que compõem a Segunda Seção, contudo, têm afirmado que a tese do repetitivo não teria feito distinção quanto à incidência dos juros moratórios sobre as parcelas vencidas e vincendas, aplicando a sua incidência, indistintamente, a partir da data da citação.

Para o ministro, porém, é necessário aplicar a técnica do distinguishing a fim de adequar a tese já consolidada ao conteúdo das sentenças proferidas nas diversas demandas levadas à apreciação do Poder Judiciário.

“Assim, as parcelas que passaram a ser devidas a partir do período compreendido entre a data da citação e a do trânsito em julgado (denominadas vincendas pela recorrente) devem observar as datas dos respectivos vencimentos para que possa ter início o cômputo dos juros de mora, pois é desse momento em diante que elas passam a ser exigíveis e, uma vez não pagas, vencidas”, disse Villas Bôas Cueva.

Segundo o relator, na hipótese, não há como exigir da recorrente, por exemplo, o pagamento de dividendos relativos ao exercício de 2007, devidos a partir de abril de 2008, computando-se juros de mora desde a citação, realizada em março de 2006, ou seja, mais de dois anos antes do vencimento da obrigação.

Mora do devedor

Em seu voto, Villas Bôas Cueva citou precedentes da sua relatoria e da Quarta Turma no sentido de que os juros moratórios são contados a partir da citação, no tocante às parcelas vencidas por ocasião da propositura da ação, e de cada vencimento, quanto às vincendas.

O ministro concluiu que, ainda que a regra geral estabeleça que os juros moratórios devam fluir a partir da citação, nos termos do artigo 405 do Código Civil de 2002, “os juros moratórios devem ter incidência a partir do vencimento de cada parcela que se originar posteriormente à data da citação (denominadas vincendas), pois é somente a partir desse termo que essas rubricas passam a ter exigibilidade e, com isso, materializa-se a mora do devedor, a qual não existia na data da citação. Aplica-se, no ponto, por especialidade, a regra do artigo 396 do CC”.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1601739

Se não houver no processo sinais de que o devedor esteja ocultando patrimônio, não será possível adotar meios executivos atípicos – como a suspensão da carteira de motorista –, uma vez que, nessa hipótese, tais medidas não seriam coercitivas para a satisfação do crédito, mas apenas punitivas.

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o juiz pode adotar meios executivos indiretos desde que – verificada a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio para cumprir a obrigação – eles sejam empregados de modo subsidiário, por decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com a observância do contraditório e da proporcionalidade.

Com esse fundamento, o colegiado julgou dois recursos especiais nos quais os recorrentes pediam a suspensão da Carteira Nacional de Habilitação e o recolhimento do passaporte dos devedores para a satisfação de seus créditos. No primeiro caso, relativo a uma execução de título extrajudicial, os ministros negaram provimento ao recurso, pois já teriam sido realizadas várias tentativas de localização de bens passíveis de penhora, todas infrutíferas, não havendo sinais de ocultação patrimonial.

No segundo, no qual a dívida resultou de acidente automobilístico, determinou-se o retorno dos autos para novo exame no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), onde o pedido de adoção das medidas coercitivas foi negado sob o fundamento de que a responsabilidade do devedor seria referente apenas ao aspecto patrimonial, e não pessoal – entendimento que, para os ministros, não se coaduna com o do STJ.

Elasticidade

A relatora dos recursos, ministra Nancy Andrighi, explicou que o Código de Processo Civil (CPC) positivou a regra segundo a qual incumbe ao juiz “determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária”.

Segundo a ministra, essa cláusula, inserida no inciso IV do artigo 139, trata das medidas executivas atípicas, que conferem “maior elasticidade ao desenvolvimento do processo satisfativo, de acordo com as circunstâncias de cada caso e com as exigências necessárias à tutela do direito material anteriormente reconhecido”. No entanto, a relatora alertou que isso não significa que qualquer modalidade executiva possa ser adotada de forma indiscriminada.

Execução indireta

Para Nancy Andrighi, não se pode confundir a natureza jurídica das medidas de coerção psicológica – que são apenas medidas executivas indiretas – com sanções civis de natureza material, capazes de ofender a garantia da patrimonialidade, por configurarem punições pelo não pagamento da dívida.

A diferença “mais notável” entre os dois institutos, segundo ela, é que, “na execução de caráter pessoal e punitivo, as medidas executivas sobre o corpo ou a liberdade do executado têm como característica substituírem a dívida patrimonial inadimplida, nela sub-rogando-se, circunstância que não se verifica quando se trata da adoção de meios de execução indiretos”.

Como exemplo dessa última modalidade, a ministra citou a prisão civil decorrente de dívida alimentar, na qual a privação temporária da liberdade não exime o devedor de alimentos do pagamento das prestações vencidas ou vincendas, inexistindo sub-rogação. Assim, resumiu a relatora, na execução indireta, “as medidas executivas não possuem força para satisfazer a obrigação inadimplida, atuando tão somente sobre a vontade do devedor”.

Condições

Para que seja adotada qualquer medida executiva atípica, a ministra ressaltou que o juiz deve intimar previamente o executado para pagar o débito ou apresentar bens destinados a saldá-lo, seguindo-se aos atos de expropriação típicos.

A relatora ainda lembrou que é necessária a fundamentação a partir das circunstâncias específicas do caso; assim como o esgotamento prévio dos meios típicos de satisfação do crédito exequendo. Além disso, a decisão deve atender aos fins sociais do ordenamento jurídico, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana, como exige o artigo 8° do CPC; bem como os princípios da proporcionalidade, da razoabilidade, da legalidade, da publicidade e da eficiência.

“Respeitado esse contexto, portanto, o juiz está autorizado a adotar medidas que entenda adequadas, necessárias e razoáveis para efetivar a tutela do direito do credor em face de devedor que, demonstrando possuir patrimônio apto a saldar o débito em cobrança, intente frustrar sem razão o processo executivo”, explicou Nancy Andrighi.

Leia os acórdãos no REsp 1.782.418 e no REsp 1.788.950.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1782418REsp 1788950

O morador que esteja com as mensalidades do condomínio em atraso não pode ser impedido de usar as áreas comuns do prédio, como piscina, brinquedoteca, salão de festas ou elevadores.

O entendimento foi adotado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento ao recurso de uma proprietária de apartamento que estava impedida de usar as áreas comuns do condomínio por causa do não pagamento das cotas condominiais.

Por unanimidade, o colegiado considerou inválida a regra do regulamento interno que impedia o uso das áreas comuns em razão de inadimplência das taxas.

No caso discutido no recurso, a dívida acumulada era de R$ 290 mil em 2012, quando a condômina entrou com ação para poder utilizar as áreas comuns após ter sido proibida pelo condomínio.

Ela alegou que a inadimplência ocorreu devido a uma situação trágica, pois ficou impossibilitada de arcar com as despesas depois que seu marido foi vítima de latrocínio. Além disso, afirmou que já há duas ações de cobrança em andamento, nas quais foram penhorados imóveis em valor superior à dívida.

O pedido foi julgado improcedente em primeira instância – decisão mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que entendeu que a utilização de serviços não essenciais sem contraprestação seria um incentivo à inadimplência.

Controvérsia

Em 2016, a Terceira Turma do STJ, ao julgar um caso semelhante, decidiu no mesmo sentido, declarando a impossibilidade de regras regimentais restringirem o acesso às áreas comuns em caso de não pagamento de taxas condominiais.

O relator do recurso especial analisado pela Quarta Turma, ministro Luis Felipe Salomão, destacou o ineditismo da questão no colegiado, lembrando que a doutrina tem posições divergentes quanto à possibilidade de restrição do uso de áreas comuns em caso de inadimplência.

Salomão disse que o Código Civil estabeleceu como característica a mescla da propriedade individual com a copropriedade sobre as partes comuns, perfazendo uma unidade orgânica e indissolúvel.

O ministro destacou a regra do inciso II do artigo 1.335 do Código Civil – clara, segundo ele, na garantia do uso das áreas comuns como um direito do condômino.

“Além do direito a usufruir e gozar de sua unidade autônoma, têm os condôminos o direito de usar e gozar das partes comuns, desde que não venham a embaraçar nem excluir a utilização dos demais”, afirmou o relator.

Segundo o ministro, o condomínio não pode impor sanções que não estejam previstas em lei para constranger o devedor ao pagamento do débito. Ele disse que “não há dúvidas de que a inadimplência dos recorrentes vem gerando prejuízos ao condomínio”, mas que o próprio Código Civil estabeleceu meios legais “específicos e rígidos” para a cobrança de dívidas, “sem qualquer forma de constrangimento à dignidade do condômino e demais moradores”.

Sem previsão legal

O relator concordou com um dos argumentos da recorrente, de que o parágrafo 1º do artigo 1.336 do CC/2002 é claro quanto às penalidades a que está sujeito o condômino inadimplente, e entre elas não está a proibição de utilização das áreas comuns.

Salomão disse que o Código Civil, ao dispor sobre direitos dos condôminos, quando quis restringir ou condicionar algum desses direitos em razão da falta de pagamento o fez de forma expressa.

“E como é sabido, por uma questão de hermenêutica jurídica: as normas que restringem direitos devem ser interpretadas restritivamente, não comportando exegese ampliativa.”

O ministro ressaltou que a falta de pagamento das taxas condominiais vem sendo desestimulada em razão da possibilidade de perda do imóvel, por ser exceção expressa à impenhorabilidade do bem de família.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1699022

Ao longo de seus 30 anos, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve uma atuação com grande impacto no direito e na sociedade brasileira, acompanhando suas mudanças e sua evolução. Ao cumprir a missão de uniformizar a interpretação da legislação federal infraconstitucional, o Tribunal da Cidadania afeta de modo imediato a vida dos brasileiros, possibilitando acesso a medicamentos e tratamentos de saúde, ao emprego e a benefícios previdenciários, a relações familiares sadias, à reparação de danos, à dignidade – entre muitos outros direitos.

Como parte das atividades comemorativas do 30º ano da instalação do tribunal (ocorrida em 7 de abril de 1989), está sendo lançada neste domingo (26) a revista digital Panorama STJ – 30 anos, 30 histórias, com relatos de pessoas que tiveram suas vidas impactadas por algumas das decisões mais significativas proferidas nessas três décadas. Nas histórias que compõem a publicação, além do entendimento da corte sobre as questões jurídicas em debate, os problemas por trás de cada processo são revelados na perspectiva de quem os vivenciou na prática.

Na apresentação da revista, o presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, lembra que o tribunal completa 30 anos empenhado em ampliar o uso da tecnologia, mas que o ser humano deve continuar a ser, sempre, a preocupação central do magistrado. “O que nenhum de nós, julgadores, pode deixar de considerar é que lá na ponta existe uma pessoa”, diz ele.

“No STJ, vamos lançar mão de algoritmos capazes de analisar esses processos e sugerir soluções judiciais com mais rapidez. A ficção científica vai dando espaço à realidade. Porém, no início e no fim do processo, ainda temos um ser humano, e ele tem pressa! Nos próximos 30 anos, em que vamos viver a verdadeira transformação digital do direito, queremos que a inteligência artificial aproxime o tempo da Justiça do tempo dos homens, porque, como sabemos, justiça que chega tarde não é justiça efetiva”, afirma o ministro.

A revista – cujos textos foram originalmente publicados no site do STJ entre outubro de 2018 e abril deste ano, sempre nos fins de semana – fala também de pessoas que ajudaram a escrever a trajetória da corte. São exemplos extraídos de um universo enorme: magistrados, servidores, advogados e até os participantes dos programas socioeducativos e de sustentabilidade mantidos pelo tribunal.

Reportagens, edição e projeto gráfico da revista são um trabalho da Secretaria de Comunicação Social do STJ.

Algumas histórias

Entre os casos apresentados está o da menina Anny Fischer, que sofria até 60 crises convulsivas por mês desde os 40 dias de vida. Sua condição só ficou sob controle quando ela passou a tomar o canabidiol (substância extraída da Cannabis sativa), em novembro de 2014. Sua família – que precisou inicialmente importar o medicamento de forma ilegal – ganhou esperança com uma decisão da Segunda Turma do STJ, que autorizou a importação direta do canabidiol para o tratamento de uma criança com epilepsia, moradora de Pernambuco.

As decisões do STJ também aumentaram as possibilidades de mudança de vida para sentenciados, ao ampliar as hipóteses de remição de pena com base na realização de atividades educacionais e profissionais não previstas expressamente da Lei de Execução Penal (LEP). Na revista Panorama STJ – 30 anos, 30 histórias, é contado o caso de Adealdo Ferreira Cardoso, que superou um histórico de crimes ao trabalhar e estudar enquanto cumpria pena. Com só as duas primeiras séries do ensino fundamental e sem nunca ter exercido atividade profissional, Adealdo trabalhou, concluiu os níveis fundamental e médio enquanto esteve na penitenciária, e obteve a remição de dois anos e meio de pena. Já foi gerente de uma associação que oferece vagas de trabalho para egressos do sistema prisional e hoje, aos 56 anos, é líder religioso.

A identidade de gênero é outro tema abordado na revista. O STJ, que tem desempenhado um papel de destaque nesse assunto, firmou em maio de 2017 o entendimento de que o direito dos transexuais de retificar a certidão de nascimento em relação ao nome e ao sexo não pode ser condicionado à realização de cirurgia de adequação sexual. A reportagemmostra a experiência de Paula Benett, mulher transexual, assistente social e ativista do movimento LGBT. “A decisão do STJ foi de suma importância, pois tem a ver com o respeito da identidade de gênero, tem a ver com quem realmente nós somos. Tem a ver com liberdade”, diz ela.

Uma outra perspectiva

Para um dos redatores da revista, Rodrigo Lopes de Aguiar, a possibilidade de ir além da cobertura jornalística das decisões judiciais e ouvir as histórias das pessoas que vivenciaram os mesmos problemas debatidos nas sessões de julgamento foi um dos aspectos mais interessantes do projeto. Entre as matérias mais marcantes para Rodrigo está a história de Deborah, adolescente de 15 anos que tem uma doença rara e, para continuar vivendo, precisa de um medicamento de alto custo fornecido pelo poder público.

“Sem a medicação, a expectativa de vida da menina não ultrapassava os oito anos de idade. Na casa de Deborah, a mãe dela nos contou a batalha diária da família para que os remédios não faltem, e para que a Deborah possa ter, na medida do possível, uma vida igual à de qualquer adolescente. Foi comovente e bonito ouvir o relato da família”, afirmou Rodrigo.

Segundo a redatora Neblina Orrico Rocha, foi gratificante mostrar o alcance das decisões do STJ sob um novo ângulo. Para Neblina, o projeto expõe a vanguarda dos julgados do tribunal e a perspectiva de quem teve a vida diretamente afetada por eles. “Nas entrevistas, o que mais me impressionou foi o quanto as decisões judiciais, principalmente as do STJ, são capazes de mudar não só na vida dos envolvidos no processo, mas na sociedade como um todo.”

A revista traz matérias com personalidades importantes dessa história de 30 anos, como o primeiro presidente da corte, ministro Evandro Gueiros Leite; o atual presidente, ministro João Otávio de Noronha; o ministro aposentado Pádua Ribeiro, atuante na Constituinte em defesa da criação do novo tribunal; a artista plástica Marianne Peretti e alguns dos servidores que participaram da construção da sede do STJ.

A edição especial Panorama STJ – 30 anos, 30 histórias está permanentemente disponível na aba Comunicação, no menu superior do site.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que decidiu não ser possível a colação dos valores correspondentes ao uso gratuito de apartamento, com a respectiva garagem, em um inventário, uma vez que o imóvel foi utilizado em comodato.

O colegiado também entendeu como correta a decisão do TJSP que indeferiu outro pedido para incluir nos autos do inventário a companheira da herdeira recorrida. Segundo o tribunal paulista, eventual cobrança de aluguel da ocupante do imóvel deve ser objeto de ação própria.

No recurso apresentado ao STJ, os recorrentes sustentaram que a dispensa de pagamento de aluguéis pelo uso do apartamento e da garagem pela recorrida deveria ser trazida à colação de bens, uma vez que a mulher fazia uso do imóvel a título gratuito desde 1992.

Empréstimo gratuito

Ao desprover o recurso, o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, explicou que somente a doação transfere a propriedade do bem, o que poderia provocar eventual desequilíbrio entre as cotas-partes atribuídas a cada herdeiro durante o inventário.

No caso analisado, segundo o ministro, não se pode confundir comodato – que é o empréstimo gratuito de coisas não fungíveis – com doação – mediante a qual uma pessoa, por liberalidade, transfere bens ou vantagens de seu patrimônio para outra.

“Mostra-se correto entendimento firmado pelo acórdão recorrido, no sentido de que a utilização do imóvel ‘decorre de comodato’ e ‘a colação restringe-se a bens doados a herdeiros, e não a uso e ocupação a título de empréstimo gratuito’, razão pela qual não se vislumbra ofensa ao artigo 2.002 do Código Civil”, ressaltou.

Institutos distintos

O ministro explicou que, segundo o Código Civil, a colação é o ato pelo qual o descendente, que concorre com outros descendentes à sucessão de ascendente comum ou com o cônjuge do falecido, confere o valor das doações que recebeu do autor da herança em vida.

Para Sanseverino, é necessário fazer a distinção entre o contrato de comodato e a doação. “Somente na doação há transferência da propriedade, tendo o condão de provocar desequilíbrio entre as cotas-partes dos herdeiros necessários, importando, por isso, em regra, no adiantamento da legítima”, explicou.

O relator destacou ainda que a ocupação e o uso do imóvel também não podem ser considerados “gasto não ordinário”, nos termos do artigo 2.010 do CC, pois a autora da herança nada despendeu em favor de uma das herdeiras a fim de justificar a necessidade de colação.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1722691

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser abusiva, nos contratos de plano de saúde anteriores à Lei 9.656/1998, a cláusula que exclui a cobertura de lentes intraoculares em cirurgias de catarata, sendo passíveis de reembolso os valores que os clientes da SulAmérica Companhia de Seguro Saúde gastaram com a compra das lentes para a realização da cirurgia nos últimos cinco anos.

Ao confirmar acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), o colegiado julgou procedentes os pedidos formulados em ação civil pública para reconhecer o direito à cobertura de lentes intraoculares aos segurados do plano de saúde da SulAmérica que tenham feito ou venham a fazer a cirurgia, além do reembolso.

O Ministério Público Federal, a SulAmérica e a União apresentaram recursos ao STJ questionando o acórdão do TRF3.

Cláusula abusiva

De acordo com o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, em virtude do disposto no artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor (CDC), é manifesto o abuso da cláusula que exclui da cobertura do plano a prótese essencial para a operação de catarata, impedindo que os segurados que sofrem da doença restabeleçam a visão e a saúde mediante cirurgia.

“A cirurgia em questão em nada tem a ver com procedimentos estéticos ou elitistas, sendo necessária à devolução da função da visão ao cidadão segurado e, por isso, deve estar coberta no todo compreensivo da prestação de serviços de saúde contratada, sob pena de se negar o conteúdo principal do negócio celebrado”, explicou.

Para o ministro, a simples restrição da cobertura, com a exigência de pagamento adicional de prêmio para a inclusão da prótese, já evidencia o caráter abusivo da cláusula, violando a boa-fé objetiva. Sanseverino lembrou precedentes do STJ que reconhecem como abusiva a limitação do fornecimento de próteses necessárias para o sucesso de atos cirúrgicos.

Prescrição

O ministro destacou ainda que não há especificação legal sobre o prazo prescricional aplicável ao reembolso, por parte da seguradora, dos valores pagos pelos segurados em relação às lentes intraoculares não cobertas com base em cláusula abusiva.

“A pretensão condenatória decorre da revisão do contrato, ou seja, da declaração de abusividade de determinada cláusula contratual, o que não possui prazo específico no ordenamento jurídico”, afirmou.

Sanseverino aplicou ao caso em análise os mesmos fundamentos adotados pela Terceira Turma em julgado semelhante (REsp 1.473.846).

Ao negar provimento aos três recursos apresentados, a turma, por unanimidade, confirmou a decisão tomada pelo TRF3, afastando também o pedido de ressarcimento do SUS pelas lentes intraoculares de usuários que procuraram a rede pública para realizar a cirurgia de catarata.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1585614

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que determinou ao Banco Santander que forneça aos seus clientes, gratuitamente, a segunda via dos comprovantes impressos em papel termossensível nos terminais de autoatendimento. A segunda via, quando solicitada, deverá ser fornecida por até cinco anos após o encerramento da conta.

Os papéis termossensíveis, ou térmicos, são conhecidos por se desbotarem rapidamente, o que faz desaparecer a mensagem impressa. Para evitar que as informações se apaguem novamente, a segunda via deverá ser emitida aos consumidores em outro tipo de papel.

O entendimento da turma é inédito no âmbito do STJ e foi fixado de forma unânime em ação civil pública.

“Condicionar a durabilidade de um comprovante às condições de armazenamento, além de incompatível com a segurança e a qualidade que se exige da prestação de serviços, torna a relação excessivamente onerosa para o consumidor, parte mais sensível da relação, que, além dos custos de emitir um novo comprovante, em outra forma de impressão (fotocópia), por sua própria conta, teria o ônus de arcar em caso de perda com uma nova tarifa pela emissão de segunda via do recibo, o que se mostra abusivo e desproporcional”, apontou o relator do recurso especial, ministro Luis Felipe Salomão.

Na ação civil pública contra o Banco Santander, o Instituto de Defesa do Consumidor e do Trabalhador de Teresópolis (RJ) buscava impedir a utilização do papel termossensível nas máquinas de autoatendimento e pedia a emissão gratuita da segunda via dos comprovantes. O instituto também requeria a fixação de R$ 3 milhões a título de indenização por danos morais coletivos.

Simples verificação

O juiz de primeiro grau julgou procedente o pedido de fornecimento gratuito da segunda via dos comprovantes – vedado o uso de papel termossensível –, mas negou o pedido de abstenção de utilização desse tipo de papel e a condenação em danos morais. O TJRJ excluiu da condenação apenas a obrigação de o banco publicar a sentença em jornal de grande circulação.

Por meio de recurso especial, a instituição financeira alegou que a emissão dos comprovantes pelas máquinas de autoatendimento em papel termossensível cumpre a função de verificação, pelo usuário, da regularidade da transação bancária realizada.

Segundo o banco, os comprovantes não visam conferir ao consumidor um meio de prova – por isso o caráter transitório do documento. A instituição também apontou que o cliente dispõe de outros meios para a verificação das transações, como o acesso à conta pela internet.

Vício do serviço

O ministro Luis Felipe Salomão destacou que o Código de Defesa do Consumidor previu que o fornecedor responderá pelos vícios de qualidade que tornem os serviços impróprios ao consumo ou lhes diminuam o valor ou, ainda, pelos decorrentes da disparidade com as indicações constantes da oferta ou mensagem publicitária.

No caso dos autos, Salomão afirmou que a impressão termossensível, apesar da vantagem do baixo custo, tem como problema a possibilidade de que a mensagem se apague com o tempo. Segundo o relator, por sua própria escolha e em busca de maiores lucros, a instituição bancária passou a ofertar o serviço de forma inadequada, emitindo comprovantes cuja durabilidade não atende às exigências do consumidor, violando o princípio da confiança.

“É da natureza específica do tipo de serviço prestado emitir documentos de longa vida útil, a permitir que os consumidores possam, quando lhes for exigido, comprovar as operações realizadas, não cabendo, por óbvio, a argumentação de desgaste ou deterioração natural da impressão no papel”, afirmou o relator.

Alternativas

Ao negar provimento ao recurso do banco, Salomão também lembrou que estão em andamento discussões legislativas sobre a substituição das impressões em papéis termossensíveis. Nesses debates, apontou o ministro, tem-se levantado como desafio da medida a necessidade de substituição de todo o parque tecnológico das empresas.

Por outro lado, há proposta alternativa no sentido de que os fornecedores enviem aos consumidores, em formato eletrônico, os comprovantes das transações bancárias realizadas nos caixas eletrônicos.

“Assim, malgrado o vício do serviço, penso que agiu bem o acórdão recorrido em determinar, mantendo a sentença de piso, apenas a abstenção da cobrança pela emissão de segunda via do comprovante, que não seja em papel termossensível (sob pena de renovar o problema do desbotamento de informações), como suficiente para assegurar o cumprimento dos direitos do consumidor e dos preceitos da Lei 8.078/1990, até que eventual normativo disponha ou determine de forma diversa”, concluiu o ministro.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1414774

“O Brasil precisa retomar o crescimento. Primeiro, tem que parar de tuitar e começar a dialogar. E, ao dialogar, precisamos resolver rápido a reforma da Previdência. Mas a falta da reforma da Previdência não é o que está trazendo impacto negativo para a economia agora. Também precisamos de outras medidas, e até agora não tivemos nenhuma medida de estímulo à economia.” A declaração foi feita pelo presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, nesta quinta (16), durante o 91º Encontro Nacional da Indústria da Construção (ENIC), no Rio de Janeiro.

Noronha participou do seminário Judiciário e o Mercado Imobiliário: um diálogo necessário, ao lado do advogado Melhim Chalhub. O presidente do STJ falou sobre a recuperação da economia, o ativismo judicial e a importância da construção civil.

Para o presidente do Superior Tribunal de Justiça, o momento é de muita sensibilidade, principalmente no que diz respeito à gestão do orçamento público. Para ele, o Brasil precisa gastar melhor, rever as estruturas, otimizar os recursos e buscar mais eficiência para o setor público.

“Um país com déficit de emprego enorme precisa investir na infraestrutura, na construção civil, que é a maior geradora de emprego. Mas precisamos conversar, dialogar e ajustar a ordem jurídica para que esses investimentos, resolvendo o problema da economia, possam ser retomados”, destacou.

Ativismo

Ao abordar o tema “Distratos imobiliários e a segurança jurídica”, Noronha comentou o ativismo judicial. Para ele, o ativismo é ruim quando se contrapõe à ordem jurídica ou quando a inovação trazida por ele importa na invasão de outra esfera de poder.

Segundo o ministro, uma das tarefas mais difíceis do juiz é medir a repercussão das suas decisões, que podem inviabilizar negócios ou retirar produtos do mercado. “É preocupante quando as decisões judiciais não vêm calibradas. Também preocupa quando elas são inovadoras na ordem jurídica”, observou.

Noronha disse ainda que existe um ativismo revelador, que mostra as regras que estão latentes no sistema jurídico, e esse tipo de ativismo “é muito positivo”. Ele lembrou que as decisões judiciais, muitas vezes, repercutem muito mais do que o juiz pode esperar.

O ministro citou exemplos de temas que, segundo ele, ainda têm espaço para muita discussão entre o setor imobiliário e o Judiciário brasileiro: rescisão contratual de compra e venda de imóvel, prescrição decenária, contratos, correção monetária, garantias e custo de oportunidade.

Custo

O presidente do STJ disse ainda que a indústria revisionista tem um impacto grande no Judiciário brasileiro. “Temos uma quantidade irracional de processos tramitando no Brasil”, afirmou.  Noronha lembrou que tudo isso tem um custo, porque a quantidade de processos em tramitação exige um sistema caro para processá-los.

“É hora de acontecer um grande debate entre a sociedade e o Legislativo. Acho que os lobbiesprecisam mostrar que o crescimento passa pela aprovação de uma série de regramentos pelo Congresso Nacional. Também deveríamos abandonar a burocracia excessiva que temos. Só os latinos ainda gostam do carimbo. Feito isso, acredito que seremos o Brasil do presente. Um Brasil que não tem tempo para ser do futuro, porque o desemprego é muito grande. O Brasil tem que ser de ontem e de hoje. E para isso precisamos nos entender. Esse é o meu desejo: que o Brasil se entenda”, concluiu.