A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concedeu mandado de segurança para assegurar a participação de uma candidata lactante no curso de formação e nas demais etapas de concurso para agente penitenciário em Minas Gerais.

O recurso em mandado de segurança foi interposto por uma candidata a agente penitenciária que estava em licença-maternidade na época em que foi convocada para a sexta etapa do certame, o curso de formação.

A candidata se inscreveu no concurso em 2012 e foi aprovada em todas as etapas, inclusive no exame médico realizado em janeiro de 2014, quando estava na fase final da gravidez. Um mês depois do nascimento da filha, ela foi convocada, mas sentiu-se impedida de realizar o curso devido à sua condição física.

Liminar cassada

Graças a uma liminar, a candidata conseguiu fazer o curso em momento posterior e foi aprovada. O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), porém, ao julgar o mérito do processo, entendeu que era inexistente o direito à remarcação de provas em razão de circunstâncias pessoais dos concorrentes, pois o edital do concurso vedava o tratamento diferenciado.

Segundo a corte mineira, a candidata não comprovou que, por ser lactante, estaria com suas condições físicas e psicológicas limitadas para o desempenho do curso de formação. Com esse fundamento, o TJMG negou o mandado de segurança e cassou a liminar, o que levou a administração pública a não reconhecer a aprovação da candidata no curso.

Proteção constitucional

O ministro relator no STJ, Gurgel de Faria, destacou que as turmas de direito público do tribunal têm acompanhado a orientação firmada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) de que não há direito à remarcação de provas em razão de circunstâncias pessoais dos candidatos, exceto se previsto em edital.

No entanto, o ministro observou que, nos casos de gestantes, o STF tem considerado possível a remarcação do teste de aptidão física, independentemente de previsão no edital (RE 630.733).

Gurgel de Faria frisou que a maternidade é constitucionalmente protegida. Segundo ele, a candidata lactante é merecedora do mesmo amparo estabelecido pelo STF para as gestantes, uma vez que a Constituição Federal garante o direito à saúde, à maternidade, à família e ao planejamento familiar.

Cuidados com o filho

O relator sublinhou que, embora a concorrente não estivesse mais grávida, ela estava em licença-maternidade e sua filha tinha apenas um mês de vida quando o curso começou.

“A candidata, ao ser convocada para o curso de formação, encontrava-se em licença-maternidade, período em que sabidamente todas as mulheres estão impossibilitadas de praticar atividades físicas, estando totalmente voltadas para amamentação e cuidados com o recém-nascido”, afirmou.

No caso em análise, o relator ressaltou que o edital previu apenas a impossibilidade de adiamento de prova de condicionamento físico e não estabeleceu nada semelhante em relação ao curso de formação.

Por unanimidade, a turma deu provimento ao recurso para garantir a presença da candidata nas demais etapas do concurso e a sua nomeação, caso seja aprovada.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):RMS 52622

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que os honorários advocatícios contratuais que adotarem a quota litis devem ser calculados com base na quantia efetivamente recebida pelo cliente ou no valor apurado na liquidação da sentença, quando o contrato assim estabelecer. A partir desse entendimento, o colegiado reformou decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

A controvérsia envolveu um trabalhador que contratou advogados, com percentual de honorários de 23%, para moverem reclamação trabalhista contra empresa que teve falência decretada. Vencedor na demanda, o recorrente teria de receber R$ 37.388, mas cedeu seu crédito pelo valor de R$ 10.782. Em ação de execução, os advogados postularam o recebimento de R$ 8.599, valor equivalente ao percentual contratado aplicado sobre R$ 37.388.

O juiz de primeiro grau considerou improcedentes os embargos à execução opostos pelo devedor na ação de execução movida pelos advogados, e o TJSP confirmou a sentença.

No STJ, o recorrente impugnou o acórdão, alegando que o valor por ele devido aos advogados deveria ser calculado sobre a quantia efetivamente recebida.

Critério

O ministro Raul Araújo, cujo voto foi seguido pela maioria da turma, observou que o contrato escrito da prestação do serviço entre o trabalhador e os advogados previu a adoção de cláusula quota litis e estabeleceu os honorários advocatícios no patamar de 23% sobre o valor apurado em liquidação de sentença.

“O contrato de prestação de serviços advocatícios elaborado pelos advogados e firmado com o contratante, ora recorrente, adotou como critério remuneratório, repita-se, a cláusula quota litis. Por meio desta, estipula-se que os honorários serão fixados com base na vantagem obtida pelo cliente, sujeitando, portanto, a remuneração do advogado ao seu sucesso na demanda, pois, em caso de derrota, nada receberá. E mais: a sua adoção implica, necessariamente, que a remuneração do advogado constituído jamais poderá ser superior às vantagens advindas em favor do constituinte”, explicou.

O ministro lembrou julgado da Terceira Turma (REsp 1.155.200) que, ao apreciar a validade de contrato de honorários com adoção de cláusula quota litis fulminado por vício de lesão, entendeu ser exorbitante a remuneração ad exitum do advogado em 50% sobre o benefício econômico do cliente, reduzindo-a para 30%.

Razoabilidade

Para Raul Araújo, no caso analisado, os honorários contratuais devidos devem ser calculados com base na quantia efetivamente recebida pelo cliente, em razão da cessão de seu crédito a terceiro.

“No presente caso, vale destacar, os advogados almejam receber quantia bem superior ao benefício gerado pela causa ao cliente, o que demonstra a ausência de razoabilidade da cobrança formulada pelos causídicos”, concluiu.

Ao dar provimento ao recurso especial, a turma, por maioria, reformou o acórdão para que o valor da execução tenha como base de cálculo o valor efetivamente recebido pelo recorrente.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1354338

Com base na teoria da ciência inequívoca, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que considerou intempestivo um recurso contra decisão proferida após a expedição do mandado de citação, mas que teve prazo recursal contado a partir da juntada do mandado aos autos.

No recurso especial, a parte alegou que não teve conhecimento da decisão ao receber a citação, já que ela foi proferida após a expedição do mandado. Porém, em conformidade com o acórdão do TJSP, o colegiado considerou que a parte teve acesso aos autos digitais para a elaboração da contestação, tendo ciência inequívoca de todos os atos processados até aquele momento.

Na ação que deu origem ao recurso especial, o juiz determinou que fosse encaminhado ofício ao cartório de registro imobiliário para a averbação da existência de processo judicial na matrícula de um imóvel.

Contra a decisão, foi interposto agravo de instrumento, mas o recurso foi considerado intempestivo pelo TJSP, que concluiu que o marco inicial do prazo de dez dias para recurso deveria ser contado a partir da juntada do mandado de citação efetivamente cumprido, em especial por serem os autos digitais.

Por meio do recurso especial, a parte agravante alegou não ter sido formalmente cientificada da decisão agravada e, mesmo se fosse o caso de ter acessado os autos digitais, ela não teria capacidade postulatória para recorrer. Dessa forma, a parte defendeu que a ciência inequívoca dos seus advogados se deu apenas no momento em que eles ingressaram nos autos, ou seja, quando apresentaram a contestação.

Acesso aos autos

O relator do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, apontou que, de acordo com a teoria da ciência inequívoca – invocada pelo TJSP para reconhecer a intempestividade do agravo de instrumento –, considera-se comunicado o ato processual independentemente de sua publicação, quando a parte ou seu representante tenha tomado conhecimento dos atos.

No caso da retirada dos autos em carga, por exemplo, o relator disse que se presume que a parte, representada pelo seu advogado, teve ciência inequívoca dos atos processados até o momento da carga.

“Assim, o tribunal de origem entendeu que a parte teve ciência inequívoca de todo o processado, inclusive da decisão interlocutória agravada que já se encontrava encartada no feito, pois acessou os autos para a elaboração da defesa, materializada na peça contestatória protocolizada logo em seguida”, relatou o ministro.

Preclusão

Segundo Villas Bôas Cueva, eventual nulidade decorrente da falta de intimação deveria ter sido apontada na primeira oportunidade que os advogados da parte tiveram para se pronunciar nos autos, conforme previsto pelo artigo 245 do Código de Processo Civil de 1973.

“Desse modo, tendo a recorrente apresentado contestação sem mencionar o alegado vício na intimação, operou-se a preclusão”, concluiu o ministro ao negar provimento ao recurso.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1656403

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que todos aqueles que ocupavam emprego público à época da entrada em vigor da Lei 8.112/1990 passaram a ser ocupantes de cargos públicos e submetidos ao Regime Jurídico Único (RJU) instituído pela lei, ainda que não fossem titulares da estabilidade prevista no artigo 19 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) da Constituição Federal de 1988.

A decisão veio por maioria após o relator do processo, ministro Napoleão Nunes Maia Filho, aderir a voto-vista do ministro Gurgel de Faria.

O recurso teve origem em ação proposta pelo Sindicato dos Trabalhadores em Saúde e Previdência do Serviço Público Federal no Estado de Santa Catarina (Sindprevis), em que a entidade, na qualidade de substituta processual, requereu o enquadramento de nove ex-empregados celetistas do extinto Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social (Inamps) no RJU dos servidores da União com base no artigo 243 da Lei 8.112/1990.

Segundo consta dos autos, os servidores iniciaram suas atividades no Inamps ainda na década de 1980, por meio de contratos com empresas que prestavam serviços ao Ministério da Saúde. Posteriormente, tiveram reconhecido o vínculo empregatício celetista com a extinta autarquia por decisão da Justiça do Trabalho.

Efetividade e estabilidade

O pedido da entidade sindical foi negado em primeira instância, decisão mantida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Ambas as instâncias entenderam que, apesar da previsão do artigo 243 da Lei 8.112/1990, a transposição para o RJU não se operou de forma automática, já que o artigo 19 da ADCT e o artigo 37 da Constituição preveem a realização de concurso público para ter direito à efetividade no cargo e ao consequente enquadramento no RJU.

O acórdão recorrido fez ainda a distinção entre estabilidade – que constitui o direito de permanência no serviço – e efetividade – prerrogativa conferida apenas aos ocupantes de cargo público que prestaram concurso.

Estáveis e não estáveis

No STJ, a Primeira Turma, vencida a ministra Regina Helena Costa, deu provimento ao recurso interposto pelo Sindprevis sob o fundamento de que a Lei 8.112/1990, ao estabelecer o RJU para os servidores federais, não fez distinção entre aqueles que foram abrangidos pela estabilidade prevista no artigo 19 do ADCT e os que não foram por ela contemplados.

Para o colegiado, o novo modelo estabelecido pela 8.112 não deixou espaço para a permanência de servidores vinculados ao regime celetista. As únicas ressalvas foram feitas em relação aos ocupantes de funções de confiança e aos celetistas contratados por prazo determinado.

A turma destacou ainda o fato de que tal entendimento pode ser confirmado pela posterior edição da Lei 9.527/1997, que acrescentou o parágrafo 7º ao artigo 243 da Lei 8.112/1990, segundo o qual foi facultado à administração pública, de acordo com critérios estabelecidos em regulamento, exonerar mediante indenização os servidores não amparados pela estabilidade prevista no artigo 19 do ADCT.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1546818

Em julgamento inédito no Superior Tribunal de Justiça (STJ), realizado nesta terça-feira (26), a Terceira Turma reconheceu o direito de preservação do corpo de um brasileiro em procedimento de criogenia, nos Estados Unidos. A criogenia é a técnica de preservação do cadáver congelado em temperaturas extremamente baixas, na esperança de que ele possa ser ressuscitado no futuro.

De forma unânime, o colegiado considerou que a legislação brasileira, apesar de não prever a criogenia como forma de destinação do corpo, também não impede a realização do procedimento. Além disso, a turma levou em consideração a própria manifestação de vontade do falecido, transmitida à sua filha mais próxima, que conviveu com ele por mais de 30 anos.

“Na falta de manifestação expressa deixada pelo indivíduo em vida acerca da destinação de seu corpo após a morte, presume-se que sua vontade seja aquela apresentada por seus familiares mais próximos”, apontou o relator do recurso, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Na ação que gerou o recurso no STJ, duas filhas do primeiro casamento contestavam a decisão de sua irmã paterna, filha do segundo casamento, de submeter o corpo do pai, falecido em 2012, ao congelamento no Instituto de Criogenia de Michigan, nos Estados Unidos. Para as autoras da ação, o corpo do pai deveria ser sepultado no Rio Grande do Sul, ao lado de sua ex-esposa.

Em primeira instância, o juiz julgou procedente o pedido das irmãs e autorizou o sepultamento do corpo. No primeiro julgamento da apelação, ainda em 2012, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) reformou a sentença e determinou a continuação do procedimento de criogenia. Após essa decisão, a filha do segundo casamento encaminhou o corpo ao exterior.

No entanto, em análise de embargos infringentes, o próprio TJRJ restabeleceu a sentença, sob o fundamento de que, em virtude da ausência de autorização expressa deixada pelo pai em vida, não seria razoável permitir o congelamento pela vontade de uma de suas filhas.

Liberdade de escolha

O ministro Marco Aurélio Bellizze destacou inicialmente que a questão analisada no recurso não diz respeito aos efeitos da criogenia sobre o corpo, ou seja, se os avanços da ciência permitirão que ele retorne à vida algum dia, como prometem os defensores dessa técnica. O ponto central em discussão, apontou, é se seria possível reconhecer que o desejo do falecido era o de ser criopreservado após a morte, bem como se a sua vontade afrontaria o ordenamento jurídico brasileiro.

O ministro destacou que, na ausência de previsão legal sobre a criogenia pós-morte, o artigo 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro prevê que o juiz deve decidir de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.

Aplicando a analogia jurídica, Bellizze apontou que a legislação brasileira, além de proteger as manifestações de vontade do indivíduo, contempla formas distintas de destinação do corpo humano após a morte, além do sepultamento tradicional, como a cremação, a doação de órgãos para transplante, a entrega para fins científicos, entre outras.

“Nota-se, portanto, que o ordenamento jurídico confere certa margem de liberdade à pessoa para dispor sobre seu patrimônio jurídico após a morte, assim como protege essa vontade e assegura que seja observada. Demais disso, as previsões legais admitindo a cremação e a destinação do cadáver para fins científicos apontam que as disposições acerca do próprio corpo estão incluídas nesse espaço de autonomia. Trata-se do direito ao cadáver”, declarou o ministro.

Respeito ao corpo

De acordo com o relator, além de não haver norma que proíba a submissão de corpos à criogenia, não há ofensa à moral ou aos bons costumes, já que não há a transformação do corpo em uma espécie de “patrimônio”. De igual forma, não há exposição pública do cadáver – o que seria incompatível com as normas sanitárias e de saúde pública. Além disso, ressaltou, o procedimento é realizado com respeito aos restos mortais, pois o corpo é acondicionado em local preservado sem impedir a visitação pelos entes queridos.

Em relação à manifestação de vontade do falecido, Bellizze afirmou que, ao contrário da conclusão do TJRJ, a legislação brasileira não exige formalidade específica para confirmar a expressão de última vontade, podendo ser presumida pela manifestação de seus familiares mais próximos.

No caso dos autos, o ministro disse que, a despeito de as partes em litígio terem o mesmo grau de parentesco em relação ao falecido, a filha responsável pelo procedimento de criogenia conviveu com ele por mais de 30 anos e, portanto, é a pessoa que melhor poderia revelar seus desejos e convicções. Por outro lado, acrescentou o relator, as irmãs não demonstraram convivência próxima com o pai, e o pedido de sepultamento revelou ser um desejo delas próprias, não do falecido.

Além de considerar a vontade do falecido, o ministro Bellizze lembrou que o corpo já se encontra congelado desde 2012, o que implica certa consolidação da situação no tempo, motivo também levado em conta pelo colegiado para a permanência do corpo do brasileiro no instituto de criogenia americano.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1693718
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A duas semanas de completar 30 anos de funcionamento, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) protocolizou na última sexta-feira (22) o habeas corpus de número 500.000 – um pedido formulado contra decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) relacionado a tráfico de drogas.

Instalado em 7 de abril de 1989, o STJ levou 19 anos para chegar ao HC de número 100.000. Para acumular os últimos 100 mil e completar meio milhão de habeas corpus impetrados, foram precisos apenas um ano e dez meses.

Segundo o ministro Rogerio Schietti Cruz, presidente da Terceira Seção (que reúne as duas turmas do STJ especializadas em direito penal), o aumento expressivo do número de habeas corpus é uma tendência difícil de ser revertida, e a marca de meio milhão de impetrações é significativa.

Curiosamente, observou o ministro, “o HC 500 mil aborda o tipo de crime mais comum, o tráfico de drogas, e tem origem no tribunal que mais gera a impetração de HCs, que é o TJSP”.

Na opinião do presidente da Sexta Turma, ministro Nefi Cordeiro, é preciso repensar o sistema para que os recursos com contraditório possam tramitar de forma mais célere. Por outro lado, a marca de 500 mil também demonstra o lado positivo do crescente acesso à Justiça.

“É a concretização da cidadania aos criminalmente processados. Nenhum dano à liberdade, direto ou indireto, pode permitir demora em sua reparação: seja soltando, seja excluindo o ilegal, ainda é o habeas corpus a via rápida e eficaz”, refletiu Nefi Cordeiro.

Momento de reflexão

O ministro Reynaldo Soares da Fonseca, presidente da Quinta Turma, disse que a marca histórica exige uma reflexão.

“O momento é de reflexão dos atores do direito, a fim de que possamos encontrar critérios de racionalização e valorização desse remédio constitucional fundamental ao tecido social”, disse ele.

Segundo o ministro, a existência do habeas corpus garante o exercício do direito fundamental à liberdade e o próprio Estado democrático de direito. Entretanto, alerta Reynaldo Soares da Fonseca, o HC não pode servir de sucedâneo recursal, “nem sua utilização pode enfraquecer a função constitucional principal do STJ, que é dizer o direito infraconstitucional, por meio do julgamento dos recursos especiais”.

Rogerio Schietti Cruz destacou que o Brasil é o país que talvez tenha a maior abrangência quanto à utilização do habeas corpus, prática referendada pela doutrina jurídica.

“Em outros países, o HC é usado especificamente em situações de violação do direito à liberdade. No Brasil, a legislação permite a impetração para questionar uma série de ilegalidades que poderiam ser questionadas por meio de recurso ordinário.”

Atualmente, o HC é normatizado por alguns artigos do Código de Processo Penal (CPP), como o artigo 647, e a jurisprudência dos tribunais tem admitido sua impetração em situações bastante diversas.

Violência e acesso à Justiça

Schietti citou o aumento da violência em geral e do número de presos, a disseminação do tráfico de drogas, a criação de normas legais – como a Lei Maria da Penha –, a digitalização dos processos e a expansão da Defensoria Pública como fatores que ajudam a explicar o número crescente de habeas corpus em todos os tribunais.

O ministro lembrou que o Supremo Tribunal Federal (STF) e o STJ adotaram em 2012 o entendimento de não conhecer de impetrações substitutivas de recurso ordinário, mas essa tentativa de reduzir o número de HCs teve efeito apenas simbólico, que acabou criando decisões paradoxais quando o órgão julgador não conhecia do HC, mas concedia a ordem de ofício para sanar ilegalidades flagrantes.

“Qualquer tentativa de restringir a utilização do habeas corpus não é bem recebida, e outras medidas, como a melhoria na qualidade das decisões judiciais, poderiam colaborar para reduzir o excesso de impetrações”, avaliou.

Lei específica

Em artigo na edição de fevereiro da revista Justiça & Cidadania, Schietti defendeu a edição de uma lei específica para regulamentar o habeas corpus.

“Cremos ser mais acertada a opção por uma lei especial sobre o habeas corpus, na qual se possam fixar parâmetros mais seguros para o manejo dessa ação constitucional, minimizando as oscilações que derivam de uma jurisprudência instável, propícia a subjetivismos e voluntarismos judiciais, algo típico de um país ainda pouco afeito ao sistema de precedentes”, afirmou na ocasião.

Na Câmara dos Deputados, tramita desde 2010 o projeto de lei do novo Código de Processo Penal, o PL 8.045/2010. A proposta teve origem em anteprojeto elaborado por uma comissão de juristas presidida pelo ministro do STJ Hamilton Carvalhido, hoje aposentado. Na primeira versão apresentada ao Congresso, a proposta vinculava o HC às hipóteses de prisão ou ameaça de prisão ilegal, mas houve forte resistência de setores que enxergaram aí uma tentativa de cercear o uso desse instrumento constitucional.

O ministro Nefi Cordeiro ressaltou que, independentemente da reforma que seja feita para regulamentar o habeas corpus, “jamais se poderá permitir que a Justiça seja buscada por meios injustos, que o abuso se faça presente na persecução criminal, que formalidades impeçam a proteção do acusado”, preservando-se a possibilidade de impetração com fins de sanar ilegalidade patente.

Evolução histórica

Nos primeiros 20 anos de atuação, o STJ recebeu pouco mais de 100 mil HCs. Nos últimos dez anos, quase 400 mil foram impetrados, o que demonstra o explosivo crescimento da utilização do remédio constitucional.

Segundo o Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), a população carcerária brasileira dobrou de 2005 a 2016, passando de 361 mil presos para 726 mil – grande parte deles em situação de prisão provisória. Não é mera coincidência o aumento exponencial de impetrações no STJ.

Para entender o ritmo do crescimento das impetrações, veja abaixo a data de ingresso de nove ações de habeas corpus no STJ. E também o volume de HCs protocolizados no tribunal nos últimos cinco anos.

Nos casos de furto de energia elétrica, diferentemente do que acontece na sonegação fiscal, o pagamento do valor subtraído antes do recebimento da denúncia não permite a extinção da punibilidade. Nessas hipóteses, a manutenção da ação penal tem relação com a necessidade de coibir ilícitos contra um recurso essencial à população. Além disso, em razão da natureza patrimonial do delito, é inviável a equiparação com os crimes tributários, nos quais é possível o trancamento da ação penal pela quitação do débito.

A tese foi fixada, por maioria de votos, pela Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que pacificou a jurisprudência da corte sobre o tema, superando o entendimento divergente segundo o qual a extinção de punibilidade prevista no artigo 34 da Lei 9.249/1995 para os crimes tributários também poderia ser aplicada ao furto de energia.

“O papel do Estado, nos casos de furto de energia elétrica, não deve estar adstrito à intenção arrecadatória da tarifa. Deve coibir ou prevenir eventual prejuízo ao próprio abastecimento elétrico do país, que ora se reflete na ausência ou queda do serviço público, ora no repasse, ainda que parcial, do prejuízo financeiro ao restante dos cidadãos brasileiros”, apontou o autor do voto vencedor no julgamento, ministro Joel Ilan Paciornik.

No caso analisado pela seção, duas pessoas foram denunciadas por, supostamente, terem subtraído energia para abastecer um hotel, causando prejuízo de R$ 75 mil.

Reflexos coletivos

No pedido de habeas corpus, a defesa buscava o trancamento da ação penal sob o argumento de que, antes do recebimento da denúncia, os investigados parcelaram a dívida com a autarquia municipal de energia elétrica.

O ministro Joel Ilan Paciornik explicou que o crime de furto de energia está situado no campo dos delitos patrimoniais, com tratamento distinto dos delitos tributários, em virtude da necessidade de preservação da continuidade do serviço e do atendimento regular à população. No caso de crimes patrimoniais, apontou o ministro, o Estado imprime tratamento ainda mais rigoroso, como medida de segurança pública.

“O furto de energia elétrica, além de atingir a esfera individual, tem reflexos coletivos e, não obstante seja tratado na prática como conduta sem tanta repercussão, se for analisado sob o aspecto social, ganha conotação mais significativa, ainda mais quando considerada a crise hidroelétrica recentemente vivida em nosso país”, afirmou o ministro.

Diminuição de pena

Além disso, Joel Ilan Paciornik entendeu não ser possível a aplicação analógica do artigo 34 da Lei 9.249/1995 aos crimes contra o patrimônio, em razão da previsão legal específica de diminuição da pena nos casos de pagamento da dívida antes do recebimento da denúncia. Nessas hipóteses, o artigo 16 do Código Penal prevê o instituto do arrependimento posterior, que não afeta o prosseguimento da ação penal, mas constitui motivo para a redução da pena.

Ainda em relação à impossibilidade de equiparação do furto de energia aos crimes tributários, Paciornik destacou que a tarifa ou preço público (formas de remuneração pela prestação do serviço público de fornecimento de energia) não possuem caráter tributário. Por isso, não haveria possibilidade de incluí-las como tributos ou contribuições sociais – estas sim sujeitas à previsão legal de extinção de punibilidade.

“Dessa forma, não há como se atribuir o efeito pretendido aos diversos institutos legais, considerando que os dispostos no artigo 34 da Lei 9.249/1995 e no artigo 9º da Lei 10.684/2003 fazem referência expressa e, por isso, taxativa, aos tributos e contribuições sociais, não dizendo respeito às tarifas ou preços públicos”, concluiu o ministro ao negar o pedido de trancamento da ação penal.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):RHC 101299
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A 16ª edição do Prêmio Innovare foi lançada oficialmente às 11h desta quinta-feira (21), no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Desde sua criação, em 2004, o Innovare tem reconhecido iniciativas que colaboram para aprimorar o sistema de Justiça brasileiro, organizando-as em uma plataforma de consulta on-line para que as pessoas interessadas possam acessá-las e reproduzi-las.

Além do presidente do STJ, ministro João Otávio de Noronha, estiveram presentes ao lançamento o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli; a procuradora-geral da República, Raquel Dodge; o advogado-geral da União, André Mendonça; o presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Felipe Santa Cruz; e o presidente do Conselho Superior do Instituto Innovare, ministro Carlos Ayres Britto, entre outras autoridades.

Também compareceram os ministros do STJ Francisco Falcão, Mauro Campbell Marques, Antonio Carlos Ferreira, Sebastião Reis Júnior, Nefi Cordeiro, Gurgel de Faria, Ribeiro Dantas e Gilson Dipp (aposentado), e o ministro aposentado do STF Sepúlveda Pertence.

Incentivo à pesquisa

Ao abrir o evento, o ministro João Otávio de Noronha ressaltou a importância do Prêmio Innovare no âmbito jurídico. “O Innovare estimula, em um primeiro momento, a criatividade, mas ele é mais profundo. O Innovare tem incentivado a pesquisa fora da universidade, e essa edição terá um prêmio Destaque para a prática que tiver por principal objetivo a promoção da defesa dos direitos humanos”, afirmou.

Para o ministro Dias Toffoli, iniciativas como o Prêmio Innovare contribuem para a evolução da Justiça brasileira. “O prêmio já integra o sistema de Justiça e a democracia brasileira. Se, desde a Constituição Federal de 1988, nosso país já evoluiu muito no fortalecimento das instituições do sistema de Justiça, na afirmação dos direitos do cidadão, esse progresso também se deve a iniciativas como as premiações feitas pelo Instituto Innovare, as quais encurtam o caminho entre o presente e o futuro”, disse ele.

O presidente do STF informou que em 12 de março foi celebrado um termo de cooperação técnica entre o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e o Instituto Innovare. “O objetivo é unir esforços para promover, otimizar e expandir a adoção de práticas reconhecidamente eficazes no aprimoramento do Poder Judiciário. O CNJ tem buscado instituir novos paradigmas de gestão e aprimoramento da prestação jurisdicional, atividade que tem sido desenvolvida também pelo Instituto Innovare.”

Segundo o ministro Carlos Ayres Britto, o Prêmio Innovare é importante para a descoberta e divulgação de novas práticas. “Sartre disse que ‘a experiência antecede a consciência’. O prêmio busca práticas; portanto, experiência e aperfeiçoamento do sistema de Justiça”, ressaltou.

Iniciativa premiada

Representando os vencedores do Innovare, o juiz Iberê de Castro Dias, do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), falou sobre a experiência de participar da premiação e apresentou a prática “Adote um Boa Noite!”, vencedora da categoria Tribunal em 2018.

O projeto consiste na criação de um site aberto ao público, com fotos e relatos de crianças e adolescentes acolhidos pelo Poder Judiciário, que não tinham chance de adoção pela falta de interessados. O objetivo da iniciativa é ampliar o número de adoções de crianças com mais de sete anos de idade e com deficiência.

“A partir de uma conversa informal entre três juízes, ao pensar em ideias de como resolver essa questão que toca profundamente todos os juízes de infância, acabou surgindo um projeto vencedor do Prêmio Innovare. O prêmio foi fundamental para alavancar o projeto, colocando-o em outro patamar em termos de credibilidade. Como resultado, conseguimos concretizar sete adoções com sentenças transitadas em julgado, e há mais 25 outros processos em andamento”, afirmou o juiz.

Como participar

Podem concorrer ao Prêmio Innovare profissionais do meio jurídico nas categorias Tribunal, Juiz, Ministério Público, Defensoria Pública e Advocacia. Na categoria Justiça e Cidadania, também podem participar profissionais de todas as áreas do conhecimento que desenvolvam práticas relacionadas ao aprimoramento e à administração do sistema de Justiça e dos serviços prestados por esse sistema à população.

Os trabalhos, que podem ser de todos os estados e do Distrito Federal, são visitados pelos consultores especializados para verificação de sua eficácia, com base nos critérios de eficiência, celeridade, qualidade, criatividade, praticidade, ineditismo, exportabilidade (possibilidade de ser replicado em outras regiões), alcance social e satisfação do usuário final.

Prêmio Destaque

A novidade desta edição é o prêmio Destaque, que será concedido para a prática que tiver como principal objetivo a “Promoção e Defesa dos Direitos Humanos”. A escolha desse tema é uma forma de homenagear os 70 anos da Declaração dos Direitos Humanos, comemorados em 10 de dezembro de 2018.  Nas demais categorias, o tema é livre.

Desde sua criação, o Prêmio Innovare recebeu mais de 6,9 mil trabalhos e premiou 213 práticas. As iniciativas premiadas estão disponíveis no banco de práticas do Innovare, que pode ser consultado na guia Premiação do site do instituto. As inscrições  para a 16ª edição estão abertas até as 18h de 25 de abril, no site www.premioinnovare.com.br. A previsão é que os vencedores sejam anunciados em dezembro, em cerimônia de premiação no STF.

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, afirmou que o Brasil vive um momento delicado, um momento de tensão, em que é de fundamental importância que o Ministério Público, a Polícia Federal e o Poder Judiciário superem eventuais divergências e se unam em busca de soluções para combater a macrocriminalidade. “Todos são agentes importantes no compromisso com a ordem pública”, disse ele.

A declaração foi feita pelo ministro em Belo Horizonte, ao participar na segunda-feira (18) da abertura da segunda edição do seminário Macrocriminalidade – Desafios da Justiça Federal. Promovido pela Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) com o apoio da Seção Judiciária de Minas Gerais, o evento tem como objetivo discutir prevenção ao crime organizado e compliance.

Noronha também destacou que a garantia de segurança pública efetiva exige muito mais que alterações nas leis. Segundo ele, é necessária uma mudança no processo educacional do país, com um trabalho permanente e conjunto entre as instituições envolvidas na gestão do ensino de crianças e adolescentes.

“Mudamos a Lei do Crime Hediondo, eles continuam; catalogamos um número maior de crimes. Instituímos em boa hora a Lei Maria da Penha, as mulheres continuam apanhando nas periferias deste Brasil, aliás, até nos lares mais ricos. Nós endurecemos a pena de tráfico, ele continua a ser praticado. E ninguém enxerga isso?”, questionou o ministro.

Combate à corrupção

O presidente do STJ ressaltou ainda a necessidade de fortalecer as ações voltadas ao combate à corrupção, com a separação entre empresa e empresário.

Para ele, é preciso afastar e proceder ao devido julgamento do político ou do empresário responsável pela má gestão de obras e serviços públicos, sem com isso paralisar o funcionamento de empresas que por vezes são essenciais para a preservação das economias municipais e para a promoção da qualidade de vida da população.

Valorização

Noronha fez um apelo para que os juízes julguem com imparcialidade, sem dar ouvidos a clamores externos, obedecendo sempre ao que determina o ordenamento jurídico pátrio.

“Nós temos que combater a corrupção com energia e determinação, nos termos que determinam a lei e Constituição. Fora daí é a prevalência da força sem o direito.”

Por fim, o magistrado falou da importância da valorização dos membros do Judiciário, com respeito às suas decisões. “É hora de valorizarmos todos os juízes brasileiros, é hora de entender que o Supremo dá a última palavra na interpretação da Constituição e é assim em todos os países que são democráticos.”

O evento

O seminário prossegue até quinta-feira (21). Entre os participantes convidados estão juízes, desembargadores federais, procuradores, delegados da Polícia Federal e outros agentes públicos e operadores do direito.

Além do presidente do STJ, compuseram a mesa da cerimônia de abertura o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, o presidente da Ajufe, Fernando Mendes, e o senador Rodrigo Pacheco.

O seminário está dividido em oito painéis, sendo que o sexto, que trata do tema “Prisão cautelar e a evolução jurisprudencial”, terá como palestrantes os ministros do STJ Joel Ilan Paciornik e Reynaldo Soares da Fonseca.

Confira a programação do evento.

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que a concessão da pensão por morte, embora legitime o pensionista a pedir a revisão da aposentadoria do falecido, não tem como efeito reabrir o prazo decadencial para essa discussão. Assim, caso já tenha decorrido o prazo de dez anos para a revisão do benefício originário, a contagem não pode ser reaberta para a parte dependente, beneficiária da pensão.

A tese foi fixada no julgamento de embargos de divergência e pacificou entendimentos distintos ainda existentes entre a Primeira Turma – com julgados no sentido de que a instituição da pensão não reabre o prazo – e a Segunda Turma – com decisões no sentido de que a concessão da pensão daria início a novo prazo para pedir a revisão do benefício.

Por maioria de votos, o colegiado concluiu que, apesar de o princípio actio nata renovar, para o titular da pensão por morte, o prazo prescricional para o ajuizamento da ação de revisão, o fundamento não pode servir de justificativa legal para atingir direito já alcançado pelo decurso de prazo decadencial.

“Realmente, o direito de revisar o benefício originário pertencia ao falecido segurado, que não o exerceu. Por conseguinte, considerando que o direito decaiu, não poderá, posteriormente, ser invocado pela titular da pensão por morte, a quem restará, tão somente, em sendo o caso, o direito de revisar os critérios utilizados no cálculo da renda mensal inicial da própria pensão, por exemplo, se inobservados os parâmetros estabelecidos no artigo 75 da Lei 8.213/91”, apontou a ministra Assusete Magalhães, cujo voto prevaleceu no julgamento.

Reflexos financeiros

No caso analisado pela seção, a titular da pensão por morte buscava aumentar os valores do benefício. Alegava direito adquirido de seu falecido pai à aposentadoria mais vantajosa, com renda mensal inicial calculada nos termos da Lei 6.950/81, diferentemente da aposentação concedida pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em 1991.

Ao julgar o recurso especial, a Primeira Turma entendeu que, embora o pedido fosse de revisão da pensão por morte, o objetivo da autora era, na verdade, revisar a renda mensal da aposentadoria que deu origem à pensão, o que geraria reflexos financeiros no benefício derivado.

Como o benefício de aposentadoria que antecedeu a pensão por morte foi concedido em julho de 1991, mas a ação de revisão foi proposta apenas em setembro de 2011, a Primeira Turma – com base na tese fixada pelo STJ ao julgar o Tema 544 dos recursos repetitivos – entendeu que a possibilidade de revisão foi atingida pelo prazo decadencial de dez anos.

Por meio de embargos de divergência, a autora do recurso apontou entendimento da Segunda Turma no sentido de que o início do prazo decadencial do direito de revisão da pensão por morte, ancorado na revisão de benefício originário recebido pelo segurado em vida, é a partir da concessão da pensão. Como a pensão foi concedida em 2008, a recorrente alegava que não teria havido a decadência.

Actio nata

No voto apresentado à seção, o relator dos embargos de divergência, ministro Mauro Campbell Marques, defendeu a tese segundo a qual o prazo decadencial deve ter como marco inicial a data da concessão da pensão por morte. Segundo o ministro, em razão do princípio actio nata, a concessão do benefício derivado inaugura nova relação jurídica e, por consequência, um novo prazo decadencial, pois apenas neste momento nasce a legitimidade do pensionista para o pleito de revisão.

Por isso, para o relator, não incidiria a decadência em relação à pretensão de revisão de pensão por morte, se proposta antes de decorridos dez anos do ato de sua concessão, ainda que o ato revisional implique a revisão do benefício originário.

Direito material

Todavia, no voto que foi acompanhado pela maioria do colegiado, a ministra Assusete Magalhães apresentou uma distinção entre o direito de ação – vinculado ao prazo prescricional para exercê-lo – e o direito material em si, que pode, caso não seja exercido em certo prazo, ser atingido pela decadência.

O prazo decadencial, explicou a ministra, é fixado em relação ao direito, não em relação à pessoa, de forma que nem mesmo os incapazes escapam dos seus efeitos. Por isso, segundo Assusete Magalhães, a morte do pai da autora e a concessão da pensão não interferem na decadência do direito de revisão do beneficiário originário – decadência essa que, no caso dos autos, já havia ocorrido antes mesmo do óbito.

“Nesse panorama, se já havia decaído, para o instituidor da pensão, o direito de revisão de sua aposentadoria, o titular da pensão por morte não mais poderá exercê-lo, porquanto ele já perecera – situação que, a meu ver, não pode ser mitigada, por força do princípio da actio nata, que, como acima se destacou, diz respeito ao direito de ação, não fazendo ressurgir o direito material correspondente”, apontou.

Segundo a ministra, no caso analisado, o pedido de revisão da pensão por morte exige, como pressuposto necessário, a revisão da renda mensal inicial da aposentadoria que a originou.  “Se o direito de revisão não mais existia – quando ocorrido o óbito, em 2008, e concedida a pensão –, em face da inércia do falecido titular, instituidor da pensão, não é possível reconhecê-lo, posteriormente, para os seus dependentes”, afirmou Assusete Magalhães.

“A morte do titular do benefício originário e a consequente concessão da pensão por morte não podem reabrir o prazo decadencial já exaurido, sob pena de violação ao citado dispositivo legal, de modo que o pedido de revisão – no caso, para a titular da pensão – está limitado à graduação econômica da própria pensão, não podendo alcançar o cálculo do benefício que a originou, se, como no caso em julgamento, está o respectivo direito fulminado pela decadência”, concluiu a ministra ao decidir conforme o entendimento da Primeira Turma.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):EREsp 1605554