Em processo de relatoria do ministro Jorge Mussi, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento a pedido do Ministério Público Federal (MPF) para cassar decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3) que impedia o início da execução da pena imposta a dois réus condenados em segunda instância por crimes contra o sistema financeiro nacional.

Ao julgar a apelação e manter a condenação, o TRF3 havia determinado no acórdão que os mandados de prisão só fossem expedidos após o trânsito em julgado, ponto sobre o qual não houve recurso da acusação. Para o ministro Jorge Mussi, porém, essa determinação não se sobrepõe à jurisprudência das cortes superiores, que admite a execução da pena após a condenação em segunda instância.

O recurso especial julgado pela turma restabeleceu a decisão proferida pelo juízo federal da 3ª Vara Criminal de São Paulo, que determinou a execução provisória das penas de seis anos de reclusão, em regime semiaberto, fixadas na apelação pelo TRF3.

Em seu voto, Jorge Mussi destacou que, a partir do HC 126.292, julgado em 17 de fevereiro de 2016 pelo Supremo Tribunal Federal (STF), o STJ tem admitido a possibilidade do cumprimento da pena desde a prolação do acórdão condenatório em segunda instância.

Habeas corpus

Após o julgamento da apelação e a expedição dos mandados de prisão pelo juiz, a defesa impetrou habeas corpus no TRF3 alegando que o próprio tribunal teria garantido aos réus que a prisão só ocorreria depois do trânsito em julgado, o que ainda não aconteceu, pois foram interpostos recursos especial e extraordinário contra a condenação, os quais estão pendentes de análise.

Disse ter havido violação ao princípio da presunção de inocência e que a exigência do trânsito em julgado, determinada no acórdão condenatório e não combatida por recurso da acusação, estaria preclusa.

O TRF3 entendeu que a decisão do STF não possui efeito vinculante e que, no caso dos pacientes, o acórdão condenatório deixou claro que o mandado de prisão só poderia mesmo ser expedido após o trânsito em julgado. Com tais fundamentos, concedeu o habeas corpus.

Sem efeito suspensivo

Ao analisar o recurso especial do Ministério Público Federal, o ministro Jorge Mussi fez uma ressalva quanto à sua posição pessoal: “Este redator entende pela impossibilidade de se ordenar a execução provisória da pena quando, na sentença, o juiz condiciona ao trânsito em julgado da condenação a expedição do mandado de prisão e o órgão acusador queda-se inerte, não manifestando qualquer irresignação, sob pena de violação aos princípios da lealdade e da boa-fé processual, bem como da non reformatio in pejus”.

A despeito desse entendimento pessoal, o ministro disse que era necessário decidir em harmonia com o pensamento majoritário das cortes superiores e citou decisões do STJ segundo as quais não há ofensa ao princípio constitucional da presunção de inocência na execução provisória da pena, mesmo existindo recurso especial ou extraordinário, pois esses não possuem efeito suspensivo.

Quanto ao fato de o acórdão condenatório ter garantido o cumprimento das penas somente após o trânsito em julgado, o ministro destacou que “a única hipótese capaz de obstar a execução provisória da sanção penal é a concessão, excepcional, de efeito suspensivo aos recursos extraordinário ou especial eventualmente interpostos”.

“Desse modo, conforme o novo posicionamento adotado pelos tribunais superiores, constata-se inexistir qualquer arbitrariedade na determinação do cumprimento imediato de condenação quando restar devidamente confirmada pelo tribunal de origem”, decidiu o ministro. 

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1676308

A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser possível a imposição de multa acima do teto de 2% fixado pelo Código de Processo Civil (CPC) de 2015 por apresentação de embargos de declaração com intenção protelatória.

A controvérsia foi analisada em embargos de declaração opostos pela Cemig Distribuição S.A. contra acórdão do STJ que, ao negar provimento a um agravo interno, manteve o reconhecimento da intempestividade do recurso especial da empresa.

A Cemig alegou que o recurso especial foi interposto no prazo, afirmando que deveria ser permitida a utilização do e-mail para apresentação de petição escrita, por ser o correio eletrônico sistema de transmissão de dados similar ao fac-símile, na forma da Lei 9.800/99.

Protelação

O relator, ministro Gurgel de Faria, explicou que o entendimento do STJ tem sido no mesmo sentido do previsto pelo artigo 1.026, parágrafo 2º, do CPC/2015, que permite a aplicação de multa não excedente a 2% do valor atualizado da causa quando interpostos embargos de declaração com intenção manifestamente protelatória.

No caso analisado, Gurgel de Faria destacou que a empresa embargante reiterou, nos declaratórios, o teor dos argumentos do agravo interno, sem explicitar omissão, obscuridade, contradição ou erro material no acórdão embargado, “razão por que se consideram protelatórios os presentes embargos”.

Insignificante

Os embargos de declaração apresentados pela Cemig foram rejeitados por unanimidade pela Primeira Turma do STJ, com imposição de multa.

Todavia, para a turma, o valor da causa, fixado em R$ 1 mil, tornaria insignificante a multa se aplicado o teto de 2%, conforme previsto no CPC. Assim, por maioria, o colegiado decidiu ser possível a fixação da multa em patamar superior ao percentual legal, e estabeleceu a sanção em R$ 2 mil.

“Considerando que o valor da causa foi fixado em R$ 1 mil, o percentual a incidir sobre esse quantum não atingirá o escopo pretendido no preceito sancionador, pelo que entendo cabível a fixação daquela sanção em R$ 2 mil”, afirmou o relator.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): AREsp 1268706

Pessoas que se machucam ao escorregar em piso molhado sem sinalização, outras que têm a vida irremediavelmente comprometida por uma bala perdida em tiroteio iniciado pelos seguranças de uma loja. Casos assim – menos ou mais cotidianos, menos ou mais dramáticos – fazem parte da rotina do Judiciário e têm em comum o fato de que a vítima, embora não haja comprado produtos ou serviços da empresa, foi, de algum modo, afetada por um evento danoso que a colocou na condição de consumidor por equiparação.

Conforme explicou a ministra Nancy Andrighi no REsp 1.125.276, o conceito de consumidor não está limitado à definição restritiva contida no caput do artigo 2º do Código de Defesa do Consumidor (CDC), devendo ser extraído da interpretação sistemática de outros dispositivos da Lei 8.078/90.

Surge então a figura do consumidor por equiparação, ou bystander, “inserida pelo legislador no artigo 17 do CDC, sujeitando à proteção do CDC também as vítimas de acidentes derivados do fato do produto ou do serviço. Em outras palavras, o sujeito da relação de consumo não precisa necessariamente ser parte contratante, podendo também ser um terceiro vitimado por essa relação”, afirmou.

Dessa forma, todo aquele que não participou da relação de consumo, não adquiriu qualquer produto ou contratou serviços, mas sofreu algum tipo de lesão pode invocar a proteção da lei consumerista na qualidade de consumidor equiparado.

Piso molhado

Em março deste ano, o ministro Luis Felipe Salomão foi relator na Quarta Turma de um recurso originado de ação de reparação movida por um idoso contra o município e um posto de gasolina (AREsp 1.076.833). O autor sofreu uma queda e fraturou três costelas ao passar pela calçada do posto, pois o piso estava molhado. Havia uma mangueira no interior do estabelecimento que escoava água, porém não existia qualquer sinalização que alertasse para o perigo no local.

O idoso alegou negligência do posto por ter deixado escoar água sem providenciar a sinalização adequada. Também sustentou haver falta de fiscalização dos passeios públicos por parte do município.

O posto afirmou a não incidência da lei consumerista no caso, já que não havia fornecido qualquer produto ou serviço ao autor da ação. Disse que a culpa era exclusiva da vítima e que se tratava de caso fortuito e de força maior.

O estabelecimento foi condenado a pagar R$ 6.780,00 por danos morais. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) entendeu que incidiam as normas do CDC, já que houve defeito no serviço, pois o posto não ofereceu a segurança que o consumidor deveria esperar. Para o tribunal, a lei tutela a “segurança ou incolumidade física e patrimonial do consumidor”.

Segundo o ministro Salomão, o entendimento da corte estadual está em conformidade com a jurisprudência do STJ no sentido da proteção conferida pelo CDC a todos aqueles que, mesmo sem participar diretamente da relação de consumo, sofrem as consequências do dano, tendo sua segurança física e psíquica colocada em risco.

Cacos de vidro na via

No julgamento do REsp 1.574.784, na Terceira Turma, a ministra Nancy Andrighi também entendeu correta a equiparação do consumidor, nos termos do artigo 17 da lei consumerista, conforme decidido pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ).

Uma criança se acidentou ao tentar fugir da colisão com a porta do caminhão de uma distribuidora de cervejas Schincariol, fabricadas pela empresa Brasil Kirin Indústria de Bebidas Ltda., que transitava na via com as portas abertas. Ao desviar da porta, a criança caiu sobre garrafas de cerveja quebradas que haviam sido deixadas na calçada cinco dias antes pela mesma distribuidora. Ela sofreu cortes graves no pescoço e outras lesões leves.

O tribunal estadual manteve a condenação solidária da fabricante e da distribuidora ao pagamento de danos morais no valor de R$ 15 mil.

Para a ministra Nancy Andrighi, a jurisprudência do STJ é clara no sentido de que “a responsabilidade de todos os integrantes da cadeia de fornecimento é objetiva e solidária, nos termos dos artigos 7º, parágrafo único, 20 e 25 do CDC”, sendo “impossível afastar a legislação consumerista” e a equiparação da criança a consumidor, visto que “o CDC amplia o conceito de consumidor para abranger qualquer vítima, mesmo que nunca tenha contratado ou mantido qualquer relação com o fornecedor”.

Tiroteio na rua

No REsp 1.732.398, de relatoria do ministro Marco Aurélio Bellizze, uma jovem pediu  indenização por danos materiais, morais e estéticos em decorrência de ter sido baleada aos 12 anos de idade, quando retornava da escola e passava por uma rua onde havia começado um tiroteio. A troca de tiros ocorreu porque os seguranças privados contratados pelos donos das lojas instaladas no local reagiram a uma tentativa de roubo, e um dos tiros atingiu a jovem, deixando-a tetraplégica.

O tribunal estadual fixou o valor das indenizações por danos morais e estéticos em R$ 450 mil cada. A decisão foi confirmada pela Terceira Turma do STJ em razão da “gravidade das lesões sofridas pela autora, que revelam, por si sós, a existência de ofensa à sua integridade física, psíquica e emocional, não apenas porque dependerá, muito frequentemente, da ajuda de terceiros ou de recursos tecnológicos, não raramente de elevado custo, para realizar os atos mais simples do dia a dia, mas também porque, juntamente com sua saúde, o disparo de arma de fogo afetou grande parte dos seus sonhos, roubou-lhe a juventude e a impediu de desfrutar da própria vida de maneira plena, com reflexos de ordem pessoal, social e afetiva” – conforme apontou Bellizze.

Os comerciantes sustentaram que o crime de roubo à mão armada caracterizava fortuito externo e os tiros que atingiram a vítima foram disparados pelos assaltantes.

Segundo Bellizze, “ao reagirem de maneira imprudente à tentativa de roubo à joalheria, dando início a um tiroteio, os vigilantes frustraram a expectativa de segurança legitimamente esperada, a qual foi agravada, no caso, uma vez que a autora foi atingida por projétil de arma de fogo, sendo o fato suficiente para torná-la consumidora por equiparação, ante o manifesto defeito na prestação do serviço”.

A causa que produziu o dano, de acordo com o ministro, não foi o assalto, “que poderia ter se desenvolvido sem acarretar nenhum dano a terceiros, mas a deflagração do tiroteio em via pública pelos prepostos dos réus, colocando pessoas comuns em situação de grande risco, o que afasta a caracterização de fortuito externo”, além de os vigilantes terem atuado coletivamente “para a produção do resultado lesivo, advindo não dos disparos em si, mas da ação que desencadeou o conflito armado. Daí a responsabilização dos estabelecimentos pelos danos ocorridos”.

Explosão em bueiro

Outro caso de consumidor por equiparação foi reconhecido no AgRg no REsp 589.789, de relatoria do ministro Villas Bôas Cueva, na Terceira Turma. O caso teve origem em uma ação indenizatória contra a Light Serviços de Eletricidade S.A. após a explosão em um bueiro em Copacabana, no Rio de Janeiro.

Os autores pediram ressarcimento pelos danos materiais, morais e estéticos, porém a Light alegou que não seria possível a aplicação do CDC ao caso por não haver relação de consumo a ser tutelada.

O entendimento unânime da Terceira Turma foi no sentido de que o acórdão do tribunal estadual estava em perfeita harmonia com a jurisprudência do STJ de que “equipara-se à qualidade de consumidor, para os efeitos legais, aquele que, embora não tenha participado diretamente da relação de consumo, sofre as consequências do evento danoso decorrente do defeito exterior que ultrapassa o objeto e provoca lesões, gerando risco à sua segurança física e psíquica”, conforme exposto pelo ministro João Otávio de Noronha no REsp 1.000.329.

Derramamento de petróleo

No AgInt nos EDcl no CC 132.505, sob relatoria do ministro Antonio Carlos Ferreira, a Segunda Seção discutiu o caso de pescadores artesanais do Espírito Santo que haviam ajuizado ação de reparação de danos contra a Chevron Brasil, em razão de um vazamento de petróleo ocorrido no litoral do Rio de Janeiro.

O óleo derramado se espalhou e prejudicou a atividade dos pescadores que moravam no Espírito Santo, considerados consumidores por equiparação.

O ministro explicou que tal entendimento estava correto e já havia sido aplicado em hipótese semelhante na Segunda Seção, quando pescadores foram considerados vítimas de acidente de consumo, visto que suas atividades pesqueiras foram prejudicadas por derramamento de óleo (CC 143.204, da relatoria do ministro Villas Bôas Cueva).

A Justiça do Espírito Santo afirmou não ser competente para julgar um crime ambiental ocorrido em outro estado. A Justiça fluminense alegou que, como os pescadores são consumidores equiparados, poderiam ajuizar ação em seus domicílios, conforme preconiza o artigo 101, inciso I, do CDC.

Segundo o ministro Antonio Carlos, havendo a incidência das regras consumeristas, “a competência é absoluta”, razão pela qual deve ser fixada no domicílio do consumidor, ou seja, “apesar de o acidente ter ocorrido no litoral do Rio de Janeiro, seus reflexos danosos se estenderam para outras localidades, entre as quais o território pesqueiro onde os autores da ação laboravam, que deve ser considerado o local do fato, para fins de incidência do artigo 100, inciso V, alínea a, do Código de Processo Civil”.

“Nesse sentido, aplicam-se ao caso as regras definidoras de competência do artigo 101 do CDC, as quais, nos termos da jurisprudência do STJ, têm natureza absoluta, podendo ser conhecidas de ofício pelo juízo, sendo improrrogável, sobretudo quando tal prorrogação for desfavorável à parte mais frágil”, disse o relator.

A quitação do contrato de financiamento não extingue a obrigação da seguradora de indenizar os compradores por vícios ocultos na construção de imóveis adquiridos pelo Sistema Financeiro da Habitação (SFH).

O entendimento foi firmado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento a recurso de compradores de imóveis financiados pelo SFH, que pediam a cobertura do seguro para vícios de construção que somente foram revelados depois de quitado o financiamento.

Segundo os autos, as casas objeto da ação, construídas em um conjunto habitacional de Natal, apresentaram rachaduras, paredes fissuradas, quedas de reboco e instabilidade dos telhados. Diante da ameaça de desmoronamento, os proprietários buscaram a Justiça para que a seguradora contratada junto com o financiamento fizesse os reparos.

Em primeiro grau, a seguradora foi condenada a pagar aos autores da ação, a título de indenização, os valores individuais necessários à recuperação dos imóveis. Todavia, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte (TJRN) deu provimento à apelação da seguradora e julgou improcedente o pedido. Os compradores recorreram então ao STJ.

Cobertura

De acordo com a relatora, ministra Nancy Andrighi, o seguro habitacional é requisito obrigatório para financiar um imóvel pelo SFH. Isso porque o seguro habitacional tem conformação diferenciada por integrar a política nacional de habitação, destinada a facilitar a aquisição da casa própria, especialmente pelas classes de menor renda.

A ministra explicou ainda que o seguro habitacional é contrato obrigatório com o objetivo de proteger a família e o imóvel e garantir o respectivo financiamento, “resguardando, assim, os recursos públicos direcionados à manutenção do sistema”.

“Por qualquer ângulo que se analise a questão, conclui-se, à luz dos parâmetros da boa-fé objetiva e da proteção contratual do consumidor, que os vícios estruturais de construção estão acobertados pelo seguro habitacional, cujos efeitos devem se prolongar no tempo, mesmo após a conclusão do contrato, para acobertar o sinistro concomitante à vigência deste, ainda que só se revele depois de sua extinção (vício oculto)”, esclareceu a ministra.

Boa-fé

Nancy Andrighi afirmou que, conforme preceitua o Código Civil, o contrato de seguro, tanto na conclusão como na execução, está fundado na boa-fé dos contratantes, no comportamento de lealdade e confiança recíprocos, sendo qualificado pela doutrina como um verdadeiro “contrato de boa-fé”.

Dessa maneira, segundo a relatora, a boa-fé objetiva impõe que a seguradora dê informações claras e objetivas sobre o contrato para que o segurado compreenda, com exatidão, o alcance da garantia contratada. Também obriga que a seguradora evite subterfúgios para tentar se eximir de sua responsabilidade com relação aos riscos previamente cobertos pela garantia.

Ao dar provimento ao recurso e reformar o acórdão do TJRN, a ministra afirmou que, quando constatada a existência de vícios estruturais cobertos pelo seguro habitacional, os recorrentes devem ser devidamente indenizados pelos prejuízos sofridos, conforme estabelece a apólice.

Leia o acórdão.

A Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu parcial provimento a um recurso do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) para determinar o respeito ao limite de 50 metros de Área de Preservação Permanente (APP) na recuperação de uma região de mata atlântica ocupada de forma ilegal em Porto Belo (SC).

No caso analisado, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) manteve a sentença que delimitou a recuperação da APP ao limite de 15 metros a contar do curso de água, justificando a metragem com base na Lei de Parcelamento Urbano (Lei 6.766/79). O Ibama recorreu ao STJ para aplicar a regra de 50 metros prevista no antigo Código Florestal (Lei 4.771/65), vigente à época dos fatos.

Segundo o relator do recurso, ministro Og Fernandes, a controvérsia é saber qual norma incide no caso. Para o ministro, o conflito de normas é apenas aparente, tendo em vista que o próprio ordenamento jurídico fornece diretrizes para superar o suposto conflito, sem a necessidade de afastar a incidência de uma delas.

“Mediante análise teleológica, compreendo que a Lei de Parcelamento Urbano impingiu reforço normativo à proibição de construção nas margens dos cursos de água, uma vez que indica uma mínima proteção à margem imediata, delegando à legislação específica a possibilidade de ampliar os limites de proteção”, afirmou.

Legislação específica

De acordo com Og Fernandes, a Lei de Parcelamento Urbano reconhece não ser sua especificidade a proteção ambiental nos cursos de água, razão pela qual indica a possibilidade de a legislação específica impor maior restrição.

O ministro destacou que o Código Florestal é mais específico no que diz respeito à proteção dos cursos de água.

“Mediante leitura atenta do diploma legal, percebe-se que, ao excepcionar a tutela das edificações, a norma impôs essencial observância aos princípios e limites insculpidos no Código Florestal. Logo, cuida-se de permissão para impor mais restrições ambientais, jamais de salvo-conduto para redução do patamar protetivo”, concluiu.

Direito fundamental

Segundo o relator, a preservação do meio ambiente é prioridade nas sociedades contemporâneas, tendo em vista sua essencialidade para a sobrevivência da espécie humana.

Ele declarou ser inaceitável “qualquer forma de intervenção antrópica dissociada do princípio do ambiente ecologicamente equilibrado, uma vez que se trata de direito fundamental da nossa geração e um dever para com as gerações futuras”.

O ministro ressaltou a necessidade de proteção marginal dos cursos de água e disse que reduzir o tamanho da APP com base na Lei de Parcelamento Urbano implicaria “verdadeiro retrocesso em matéria ambiental”, razão pela qual o particular deverá recuperar integralmente a faixa de 50 metros.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1518490

“Nenhuma matéria tem maior importância para o Brasil e para seus juízes do que a proteção ao meio ambiente. Não podemos deixar que o direito ao meio ambiente seja apenas uma promessa do legislador constituinte, mas devemos trabalhar para que ele seja assegurado para as futuras gerações”, afirmou o presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), João Otávio de Noronha, ao discursar no encerramento do 2° Colóquio de Jurisprudência Comparada entre o Superior Tribunal de Justiça do Brasil e a Corte de Cassação da França: Direito Ambiental.

Para o ministro Noronha, o STJ tem o dever de discutir, atuar e agir para assegurar o direito de todos em relação ao meio ambiente. “Esse é o papel fundamental das decisões dos tribunais, sobretudo da jurisprudência do STJ, que traça pautas de comportamento para os agentes sociais. Essa pauta de comportamento tem sido cada vez mais elaborada, detalhada, para preservar a maior riqueza do Brasil, que são nossas florestas, nossa água potável, a flora e a fauna”, afirmou.

Papel das associações

Durante a tarde desta segunda-feira (22), as cortes fizeram o intercâmbio de entendimentos jurisprudenciais e precedentes envolvendo questões ambientais. No painel em que se discutiu o dano ambiental e o papel das associações, o ministro Villas Bôas Cueva fez uma análise da questão do nexo de causalidade ambiental e mencionou precedente de relatoria do ministro Herman Benjamin, no qual foi estabelecido que, “para fins de apuração de nexo de causalidade no plano ambiental, equiparam-se quem faz, quem não faz quando deveria fazer, quem deixa fazer, quem não se importa que façam, quem financia para que façam e quem se beneficia para que outros façam”.

O ministro Christian Pers, da Corte de Cassação da França, afirmou que as associações têm papel essencial na proteção ambiental. Pers ressaltou a atuação das chamadas associações acreditadas, as quais podem apresentar denúncias referentes aos danos ambientais. “O papel das associações é essencial e pode evoluir”, disse.

Para a ministra Assusete Magalhães, o Ministério Público Federal e o dos estados têm papel de destaque na proteção do meio ambiente. Ela afirmou que, “embora a atuação das associações seja importante para a proteção do meio ambiente, no Brasil, infelizmente, as associações têm enfrentado dificuldades de ordem financeira e organizacional para postularem a reparação de dano ambiental. Na verdade, no Brasil, a instituição que mais tem demandado a proteção de direito ambiental é, sem dúvida, o Ministério Público”.

Durante o debate, a ministra Regina Helena Costa falou sobre “Responsabilização Civil Ambiental e a Teoria do Fato Consumado”. Apresentou precedente pioneiro a respeito do tema, que concluiu inexistir direito adquirido a poluir ou degradar o meio ambiente. “No âmbito do direito ambiental, este tribunal construiu, ao longo dos últimos anos, uma jurisprudência no sentido de rechaçar a aplicação dessa teoria”, concluiu Regina Helena Costa.

Terrorismo ecológico

O ministro Rogerio Schietti Cruz coordenou o painel “Jurisprudência Comparada na Voz dos Ministros Julgadores da Corte de Cassação da França e do STJ: Direito Penal Ambiental”. O ministro Christian Pers destacou que o novo Código Penal francês reconhece o crime de terrorismo ecológico – tudo que causa dano à saúde animal e do homem. Mas, para o magistrado, isso não é suficiente quando se trata da questão ambiental. “Buscamos também a diretiva de harmonizar a questão das infrações com as sanções, para evitar que autores desses delitos não se aproveitem das divergências.”

O ministro Nefi Cordeiro, por sua vez, ressaltou o reconhecimento pelo STJ da possibilidade de responsabilização da pessoa jurídica em matéria ambiental, embora ainda persista a dificuldade dessa abordagem com relação ao processo penal. “Vivemos uma situação de inúmeros danos em uma grande extensão territorial, o que dificulta a persecução penal, inclusive com relação à definição do ramo do Judiciário que julgará cada questão, por exemplo”, salientou.

Presidente da Quinta Turma do STJ, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca apresentou sua contribuição ao colóquio ressaltando que “o Brasil está avançando, desde a Constituição Federal de 1988, para a garantia dos direitos de terceira geração, com uma jurisprudência que efetivamente aplica o direito penal para a proteção do meio ambiente”. Para o ministro, a Lei 9.605/98 consolidou a responsabilização penal ambiental não só para pessoa física, mas também para pessoa jurídica”. Ele destacou julgado do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que reconheceu a possibilidade de responsabilização penal de pessoa jurídica de direito público.

O ministro Ribeiro Dantas fechou a discussão do painel comparando que a França inseriu a questão dos crimes ambientais no Código Penal; o Brasil, por sua vez, optou por definir o tema em uma lei, a 9.605/98, que criminalizou a pessoa jurídica em matéria ambiental. O ministro lembrou a grande extensão do território brasileiro – “15,4 vezes o tamanho da área da França” – e a dificuldade enfrentada na fiscalização de uma área tão vasta. Para ele, deve-se contar cada vez mais com a estrutura do Ministério Público Federal nessa fiscalização. O magistrado lembrou o caso de uma empresa do ramo alimentício acusada de crime ambiental que tentou trancar uma ação penal por meio de habeas corpus, o que foi negado pelo STJ, por entender ser inviável, por meio de habeas corpus, o trancamento de ação penal envolvendo pessoa jurídica.

Ao abrir o painel de conclusões do colóquio, o ministro Luis Felipe Salomão enfatizou a importância da discussão sobre o direito ambiental e da troca de experiências ocorrida durante o evento, o que enriqueceu o debate e demonstrou a evolução do tema.

Participantes

O encontro aconteceu no STJ e contou com a presença de juízes brasileiros e ministros do STJ, além de dois membros da Corte de Cassação da França, os ministros Denis Jardel e Christian Pers.

Participaram do evento os ministros Maria Thereza de Assis Moura (vice-presidente do STJ), Nancy Andrighi, Herman Benjamin, Napoleão Nunes Maia Filho, Luis Felipe Salomão, Benedito Gonçalves, Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva, Marco Buzzi, Assusete Magalhães, Sérgio Kukina, Moura Ribeiro, Regina Helena Costa, Rogerio Schietti Cruz, Nefi Cordeiro, Gurgel de Faria, Reynaldo Soares da Fonseca e Ribeiro Dantas.

Estiveram presentes ainda a presidente em exercício da Associação dos Magistrados Brasileiros, Renata Videira; o presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil, Fernando Mendes; o desembargador Eladio Lecey, da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam); a juíza Patrícia Leydner e o juiz Álvaro Valery Mirra.

Livro

O ministro Herman Benjamin agradeceu a participação dos ministros franceses, dos ministros brasileiros, dos juízes e desembargadores, e destacou que mais da metade dos integrantes do STJ estiveram presentes ao evento.

Herman Benjamin destacou que as conclusões de todos os participantes do 2º Colóquio de Jurisprudência Comparada a respeito dos aspectos comuns e divergentes da jurisprudência das duas cortes sobre direito ambiental serão apresentadas pelos participantes no livro que está sendo preparado sobre o encontro.

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Ministros do STJ e ministros franceses participam de colóquio sobre direito ambiental

Depois de reconhecida a ocorrência do dano moral, segue-se a tarefa “extremamente difícil para o julgador”, nas palavras da ministra Nancy Andrighi, de quantificar o suficiente para compensar a vítima, sobretudo diante da ausência de critérios objetivos e específicos para o arbitramento de valores.

Um meio de definir o montante das indenizações por danos morais que vem sendo adotado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) é o método bifásico. Nesse modelo, um valor básico para a reparação é analisado considerando o interesse jurídico lesado e um grupo de precedentes. Depois, verificam-se as circunstâncias do caso para fixar em definitivo a indenização.

Julgados antigos já ponderavam esses dois grupos de fatores na busca de uma solução que mantivesse coerência com casos semelhantes e, ao mesmo tempo, evitasse reparações irrisórias e o enriquecimento sem causa.

Um exemplo foi a análise feita pela Terceira Turma em 2006 sobre a indenização a ser paga aos familiares de vítimas fatais de acidente rodoviário com ônibus. Ao julgar o REsp 710.879, a ministra Nancy Andrighi destacou que o inconformismo com o arbitramento da indenização ocorre quando o valor fixado destoa daqueles estipulados em outros julgados recentes do tribunal, observadas as peculiaridades de cada litígio.

A ministra afirmou que, em situações semelhantes (falecimento de familiar), os valores oscilavam entre o equivalente a 200 e 625 salários mínimos, sendo razoável o ajuste no caso concreto, já que as indenizações haviam sido estipuladas inicialmente em 1.500 salários mínimos e reduzidas em segunda instância para 142 salários.

A Terceira Turma estabeleceu um valor equivalente a 514 salários mínimos, de modo a não ser irrisório, tampouco significar enriquecimento sem causa para os familiares das vítimas.

Duas etapas

Em setembro de 2011, ao julgar o REsp 1.152.541, a Terceira Turma detalhou o conceito do método bifásico para a definição do montante a ser pago a título de indenização por danos morais.

Uma mulher havia sido incluída em cadastro de devedores sem aviso prévio. A sentença extinguiu o processo sem julgar o mérito, mas o tribunal de segunda instância reconheceu o direito da consumidora à indenização, fixada em R$ 300,00. No STJ, os ministros aumentaram o valor para 20 salários mínimos.

Na ocasião, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino, relator, destacou a necessidade de elevar a indenização na linha dos precedentes da corte, considerando as duas etapas que devem ser percorridas para o arbitramento do valor.

“Na primeira etapa, deve-se estabelecer um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes jurisprudenciais que apreciaram casos semelhantes. Na segunda etapa, devem ser consideradas as circunstâncias do caso, para fixação definitiva do valor da indenização, atendendo à determinação legal de arbitramento equitativo pelo juiz”, justificou.

Problema delicado

De acordo com o relator, na primeira etapa assegura-se uma exigência da justiça comutativa, que é uma razoável igualdade de tratamento para casos semelhantes, da mesma forma como situações distintas devem ser tratadas desigualmente na medida em que se diferenciam.

Na segunda, partindo-se da indenização básica, eleva-se ou reduz-se o valor definido de acordo com as circunstâncias particulares do caso (gravidade do fato em si, culpabilidade do agente, culpa concorrente da vítima, condição econômica das partes), até se alcançar o montante definitivo, realizando um “arbitramento efetivamente equitativo, que respeita as peculiaridades do caso”.

Sanseverino afirmou que o procedimento segue as regras previstas no artigo 953 do Código Civil de 2002, aplicado por analogia ao caso concreto.

O ministro disse ainda que a questão relativa à reparação de danos extrapatrimoniais, especialmente a quantificação da indenização correspondente, constitui um dos problemas mais delicados da prática forense na atualidade, em razão da dificuldade de fixação de critérios objetivos para o seu arbitramento.

Ele citou comentários de sua autoria publicados no livro Princípio da Reparação Integral – Indenização no Código Civil, em que expõe fundamentos do critério bifásico, procurando compatibilizar o interesse jurídico lesado com as circunstâncias do caso.

Segundo Sanseverino, a legislação nacional evoluiu de hipóteses de tarifamento legal indenizatório para o arbitramento equitativo, conforme disposto no artigo 953 do Código Civil.

“Nessas hipóteses de tarifamento legal, sejam as previstas pelo Código Civil de 1916, sejam as da Lei de Imprensa, que eram as mais expressivas de nosso ordenamento jurídico para a indenização por dano moral, houve a sua completa rejeição pela jurisprudência do STJ, com fundamento no postulado da razoabilidade”, declarou.

Reparação satisfatória

“Diante da impossibilidade de uma indenização pecuniária que compense integralmente a ofensa ao bem ou interesse jurídico lesado, a solução é uma reparação com natureza satisfatória, que não guardará uma relação de equivalência precisa com o prejuízo extrapatrimonial, mas que deverá ser pautada pela equidade”, acrescentou o ministro.

Sanseverino explicou que a autorização legal para o arbitramento não representa a outorga de um poder arbitrário, já que o valor deve ser fixado com base na razoabilidade e fundamentado com a indicação dos critérios utilizados.

“A doutrina e a jurisprudência têm encontrado dificuldades para estabelecer quais são esses critérios razoavelmente objetivos a serem utilizados pelo juiz nessa operação de arbitramento da indenização por dano extrapatrimonial. Tentando proceder a uma sistematização dos critérios mais utilizados pela jurisprudência para o arbitramento da indenização por prejuízos extrapatrimoniais, destacam-se, atualmente, as circunstâncias do evento danoso e o interesse jurídico lesado”, disse Sanseverino.

Uniformização

Em 2016, ao aplicar o método bifásico em um processo que tramitou sob segredo de Justiça na Quarta Turma, o ministro Luis Felipe Salomão afirmou que a adoção dessa técnica uniformizava o tratamento da questão nas duas turmas do tribunal especializadas em direito privado.

O magistrado explicou que o método bifásico analisa inicialmente um valor básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base em grupo de precedentes que apreciaram casos semelhantes. Em um segundo momento, o juízo competente analisa as circunstâncias do caso para fixação definitiva do valor.

Salomão, em voto que foi acompanhado pelos demais ministros da turma, disse que na segunda fase do método o juiz pode analisar a gravidade do fato em si e suas consequências; a intensidade do dolo ou o grau de culpa do agente; a eventual participação culposa do ofendido; a condição econômica do ofensor e as condições pessoais da vítima. Para o magistrado, o método é mais objetivo e adequado a esse tipo de situação.

“Realmente, o método bifásico parece ser o que melhor atende às exigências de um arbitramento equitativo da indenização por danos extrapatrimoniais, uma vez que minimiza eventual arbitrariedade de critérios unicamente subjetivos do julgador, além de afastar eventual tarifação do dano”, argumentou.

Ponto de equilíbrio

Ainda em 2016, ao julgar outro processo que tramitou sob segredo de Justiça, a Quarta Turma analisou o valor da indenização a ser paga por um clube recreativo à família de uma criança que morreu afogada em uma de suas piscinas.

Na ocasião, o ministro relator, Luis Felipe Salomão, justificou a análise do valor da indenização tendo em vista a situação especial do caso. Ele afirmou que o método bifásico, como parâmetro para a aferição da indenização por danos morais, atende às exigências de um arbitramento equitativo, pois, além de minimizar eventuais arbitrariedades, evitando a adoção de critérios unicamente subjetivos pelo julgador, afasta a tarifação do dano.

Segundo o magistrado, o método “traz um ponto de equilíbrio, pois se alcançará uma razoável correspondência entre o valor da indenização e o interesse jurídico lesado, além do fato de estabelecer montante que melhor corresponda às peculiaridades do caso”.

Em primeira instância, o pedido de indenização havia sido negado. Após recurso, o tribunal estadual fixou em R$ 30 mil o valor a ser pago por danos morais. No STJ, o valor foi aumentado para R$ 220 mil (250 salários mínimos da época), e os ministros incluíram na condenação o pagamento de pensão mensal à mãe da vítima.

Ao aplicar o método bifásico, Salomão explicou que os danos experimentados em relação à mãe e aos irmãos da vítima são diferentes, sendo necessário encontrar critérios de discriminação plausíveis e razoáveis. O colegiado fixou a indenização em 150 salários para a mãe e 50 salários para cada irmão.

Ofensa pela internet

Em decisão unânime em outro processo que tramitou sob segredo de Justiça, a Quarta Turma definiu em 130 salários mínimos a indenização por danos morais devida a uma jovem, na época menor de idade, que teve fotos íntimas com o namorado postadas na internet por terceiros. A indenização havia sido fixada pelo tribunal de origem em 30 salários mínimos.

Ao classificar os transtornos sofridos como imensuráveis e injustificáveis, o ministro Luis Felipe Salomão entendeu pela majoração da indenização, utilizando o método bifásico.

A turma considerou que o valor de 130 salários mínimos (equivalente a R$ 114,4 mil na ocasião do julgamento) era razoável como reprimenda e compatível com o objetivo de desestimular condutas semelhantes.

O ministro levou em conta a ação voluntária com o objetivo único de difamação; o meio utilizado (internet), que permite a perpetuação da violação à intimidade; os danos psicológicos à adolescente; a gravidade do fato e o descaso com a vida da adolescente, assim como o fato de a vítima ser menor de idade à época. A soma desses fatores, segundo o magistrado, justificou o aumento da indenização.
“A conduta do recorrido é aquilo que se conceituou sexting, forma cada vez mais frequente de violar a privacidade de uma pessoa, que reúne em si características de diferentes práticas ofensivas e criminosas. Envolve ciberbullying por ofender moralmente e difamar as vítimas, que têm suas imagens publicadas sem seu consentimento, e, ainda, estimula a pornografia infantil e a pedofilia em casos envolvendo menores”, justificou Salomão.
Destaques de hoje

O método bifásico para fixação de indenizações por dano moral
Terceira Turma admite cumulação de multa cominatória com dano moral por descumprimento da mesma ordem
Cabe ação anulatória contra sentença arbitral parcial
Simples modificação do nome da ação não afasta decadência e prescrição

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):
REsp 710879
REsp 1152541

No caso de bens apreendidos e mantidos sob a guarda de depositário judicial cujo paradeiro é desconhecido, é válida a ordem de bloqueio de dinheiro do devedor, até o valor total da dívida.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou provimento ao recurso de um devedor que buscava afastar o bloqueio em sua conta bancária por entender que a penhora dos bens era suficiente para garantir a execução.

Segundo a relatora do caso, ministra Nancy Andrighi, a penhora dos bens apreendidos se frustrou porque o paradeiro do depositário é desconhecido, e não em razão de qualquer ato diretamente imputado às partes.

“Diante desse cenário, justifica-se a substituição da penhora por dinheiro, como concluiu o Tribunal de Justiça de São Paulo, porque não podem os recorridos suportar o prejuízo a que não deram causa, ficando impedidos de prosseguir no cumprimento de sentença ou obrigados a fazê-lo a menor”, disse a magistrada.

Bacenjud

Nancy Andrighi lembrou que a consequência desse ato é a devolução dos bens ao recorrente (devedor no processo), e que cabe ao depositário judicial – e não aos credores – responder pelos prejuízos a ele causados, até que se opere a devida restituição.

O recorrente era locatário de um imóvel utilizado para fins empresariais. Após inadimplência e decisão judicial para rescindir o contrato, os donos do imóvel ficaram com crédito de R$ 63 mil. Máquinas e outros bens móveis foram apreendidos no curso da ação para satisfazer a dívida.

Como os bens se encontravam em local desconhecido, o juízo de primeiro grau autorizou o bloqueio na conta do devedor, até o valor total da dívida, por meio do sistema Bacenjud.

Mero detentor

A relatora destacou que o depositário judicial é mero detentor dos bens, e está sujeito a penalidades por não cumprir com a função.

“Como mero detentor dos bens, cabe ao depositário judicial restituí-los a quem tenha o direito de levantá-los, quando assim ordenado pelo juízo; do contrário, altera-se o título dessa detenção, podendo se sujeitar o depositário, além da indenização na esfera cível, à pena do crime de apropriação indébita, majorada pela circunstância de cometê-lo no exercício da respectiva função”, explicou Nancy Andrighi.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1758774

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, nas hipóteses de recuperação judicial, não é possível o sobrestamento, ainda que parcial, da chamada trava bancária quando se trata de cessão de créditos ou recebíveis em garantia fiduciária a empréstimo tomado pela empresa devedora.

Para o colegiado, a lei não autoriza que o juízo da recuperação judicial impeça o credor fiduciário de satisfazer seu crédito diretamente com os devedores da empresa recuperanda.

No caso analisado, um banco pediu a reforma de acórdão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) que determinou a liberação das travas bancárias que impediam uma empresa de informática em recuperação judicial de ter acesso às contas bancárias e aos valores nelas retidos.

A decisão do TJGO baseou-se na alegação da empresa de que os valores seriam bens de capital essenciais, necessários para o seu funcionamento, e que a utilização da trava bancária poderia constituir grave entrave ao êxito da recuperação judicial.

No recurso apresentado ao STJ, a instituição financeira questionou a decisão, apontando que o crédito oriundo de cessão fiduciária de recebíveis seria extraconcursal, não podendo ser submetido aos efeitos da recuperação judicial por não se constituir em bem de capital.

Bem de capital

O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, destacou que, para ser caracterizado como bem de capital, o bem precisa ser corpóreo (móvel ou imóvel), deve ser utilizado no processo produtivo e deve se encontrar na posse da empresa.

De acordo com o ministro, a Lei 11.101/05, embora tenha excluído expressamente dos efeitos da recuperação judicial o crédito de titular da posição de proprietário fiduciário de bens imóveis ou móveis, acentuou que os bens de capital, objeto de garantia fiduciária, essenciais ao desenvolvimento da atividade empresarial, permaneceriam na posse da recuperanda durante o período de proteção (stay period).

“A exigência legal de restituição do bem ao credor fiduciário, ao final do stay period, encontrar-se-ia absolutamente frustrada, caso se pudesse conceber o crédito, cedido fiduciariamente, como sendo bem de capital”, afirmou o ministro.

Bellizze explicou que a utilização do crédito garantido fiduciariamente, independentemente da finalidade, “além de desvirtuar a própria finalidade dos ‘bens de capital’, fulmina por completo a própria garantia fiduciária, chancelando, em última análise, a burla ao comando legal que, de modo expresso, exclui o credor, titular da propriedade fiduciária, dos efeitos da recuperação judicial”.

Natureza do direito

Para Bellizze, no caso analisado, a natureza do direito creditício sobre o qual recai a garantia fiduciária – “bem incorpóreo e fungível” –, faz com que ele não possa ser classificado como bem de capital.

Assim, segundo o relator, não se configurando como bem de capital os valores objeto do questionamento, “afasta-se por completo, desse conceito, o crédito cedido fiduciariamente em garantia, como se dá, na hipótese dos autos, em relação à cessão fiduciária de créditos dados em garantia ao empréstimo tomado pela recuperanda”.

Isso porque, segundo Bellizze, por meio da cessão fiduciária de direitos sobre coisas móveis ou de títulos de crédito, o devedor fiduciante, a partir da contratação, cede “seus recebíveis” à instituição financeira, como garantia, o que permitiria à instituição financeira se apoderar diretamente do crédito ou receber o pagamento diretamente do terceiro.

Ao dar provimento ao recurso para restabelecer a trava bancária, o ministro destacou: “Pode-se concluir, in casu, não se estar diante de bem de capital, circunstância que, por expressa disposição legal, não autoriza o juízo da recuperação judicial obstar que o credor fiduciário satisfaça seu crédito diretamente com os devedores da recuperanda, no caso, por meio da denominada trava bancária”.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1758746

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que a cláusula arbitral não prevalece quando o consumidor procura a via judicial para a solução de litígios. Segundo os ministros, é possível esse tipo de solução extrajudicial em contratos de adesão, mas desde que haja concordância entre as partes, pois o consumidor sempre terá a possibilidade de optar por levar o caso à Justiça estatal.

O autor da ação que resultou no recurso especial buscava a rescisão contratual e a restituição das quantias pagas após desistir de comprar um imóvel. Em primeiro grau, os pedidos foram julgados parcialmente procedentes. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO), porém, declarou a incompetência da Justiça comum para julgar a ação, tendo em vista a existência de cláusula arbitral entre as partes.

Segundo a empresa, essa cláusula foi redigida em negrito e exigiu a assinatura do comprador. Nela estava estabelecido que todas as controvérsias do contrato seriam resolvidas por arbitragem.

Nulidade

Para a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, a relação de consumo do caso está corporificada em um contrato de adesão, como foi reconhecido em primeiro grau. Segundo ela, a dúvida seria se nesse tipo de contrato haveria incompatibilidade entre as leis consumeristas e a da arbitragem.

A ministra disse que o Código de Defesa do Consumidor (CDC) se limitou a vedar a adoção prévia e compulsória desse tipo de solução extrajudicial no momento da celebração do contrato, mas não impediu que, posteriormente, havendo consenso entre as partes, fosse instaurado o procedimento arbitral diante de eventual litígio.

Segundo explicou, a aparente incompatibilidade das normas não se sustenta ao se aplicar o princípio da especialidade das normas, uma vez que a Lei de Arbitragem versou apenas sobre contratos de adesão genéricos, subsistindo, portanto, a disposição do CDC nas hipóteses em que o contrato, mesmo que de adesão, regule uma relação de consumo.

“Ainda que o contrato chame a atenção para o fato de que se está optando pela arbitragem, o consumidor, naquele momento, não possui os elementos necessários à realização de uma escolha informada”, explicou a ministra ao citar precedentes do STJ no sentido de considerar nula a convenção de arbitragem compulsoriamente imposta ao consumidor.

Três regramentos

Em seu voto, ela esclareceu que, com a promulgação da Lei de Arbitragem, passaram a conviver em harmonia três regramentos de diferentes graus de especificidade.

A regra geral impõe a observância da arbitragem quando pactuada pelas partes, com a derrogação da jurisdição estatal. A regra específica, contida no artigo 4° da Lei 9.307/96, é aplicável aos contratos de adesão genéricos, restringindo a eficácia da cláusula compromissória. Por fim, há a regra ainda mais específica, no artigo 51 do CDC, que impõe a nulidade de cláusula que determine a utilização compulsória da arbitragem, em contratos de adesão ou não.

“A atitude do consumidor de promover o ajuizamento da ação principal perante o juízo estatal evidencia, ainda que de forma implícita, a sua discordância em submeter-se ao procedimento arbitral, não podendo, pois, nos termos do CDC, prevalecer a cláusula que impõe a sua utilização, visto ter-se dado de forma compulsória”, informou.

A Terceira Turma deu provimento ao recurso especial para determinar o retorno do processo ao TJGO, a fim de prosseguir no julgamento, afastada a cláusula arbitral.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1753041