Se o segurado efetua o reparo do veículo em oficina cujo orçamento havia sido recusado pela seguradora e assina um termo de cessão de créditos, a seguradora tem a obrigação de ressarcir a oficina pelas despesas, nos limites do orçamento aprovado por ela.

A conclusão foi da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao julgar recurso da Mapfre Seguros. A turma reduziu o valor que a seguradora terá de pagar a uma oficina ao montante do orçamento aprovado por ela, descontados os valores referentes à franquia, os quais já foram pagos diretamente pelo segurado.

No caso analisado, o segurado fez os reparos do veículo em oficina cujo orçamento de R$ 4.400 havia sido recusado pela seguradora, a qual autorizou o conserto no valor máximo de R$ R$ 3.068.

O cliente pagou o valor referente à franquia (R$ 1.317) e assinou um documento para que a oficina tivesse o direito de cobrar o restante da seguradora.

O relator do caso no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que, apesar da negativa da seguradora, os serviços foram prestados, o segurado pagou a franquia e firmou um termo para que a oficina pudesse cobrar da companhia de seguros a diferença de valores.

Direito creditório

As instâncias ordinárias entenderam que não houve sub-rogação convencional, tratando-se, na realidade, de mera cessão de crédito. O ministro afirmou que a oficina apenas prestou os serviços ao cliente, “ou seja, não pagou nenhuma dívida dele para se sub-rogar em seus direitos”. Segundo o relator, houve cessão de crédito, nos termos do artigo 286 do Código Civil.

“Verifica-se, assim, que o termo firmado entre a oficina e o segurado se enquadra, de fato, como uma cessão de crédito, visto que este, na ocorrência do sinistro, possui direito creditório decorrente da apólice securitária, mas tal direito é transmissível pelo valor incontroverso, qual seja, o valor do orçamento aprovado pela seguradora”, afirmou.

No caso, o valor incontroverso a ser pago pela seguradora à oficina é o valor autorizado para o conserto (R$ 3.068), menos o montante já pago pelo segurado a título de franquia (R$ 1.317).

Escolha livre

Villas Bôas Cueva citou norma da Superintendência de Seguros Privados (Susep) que garante expressamente a livre escolha de oficinas pelos segurados. Segundo o ministro, essa livre escolha não subtrai da seguradora o poder de avaliar o estado do bem sinistrado, e também o orçamento apresentado.

“Assim, ressalvados os casos de má-fé, o conserto do automóvel é feito conforme o orçamento aprovado, nos termos da autorização da seguradora”, disse o relator.

O ministro lembrou que as seguradoras comumente oferecem benefícios especiais para o uso da rede de credenciadas, mas é direito do segurado escolher a empresa na qual o veículo será reparado, já que poderá preferir uma de sua confiança.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1336781

Um ato tão rotineiro como comprar alimentos algumas vezes pode causar transtornos inesperados. Em meio aos processos julgados pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), existem desde aquelas situações que geram sentimento de indignação, como perceber que na embalagem havia menos produto do que o anunciado, até casos repugnantes, como descobrir larvas de barata, teias de aranha, insetos ou até objetos inimagináveis nos alimentos adquiridos – e, por vezes, ingeridos.

A jurisprudência do tribunal sobre esses casos têm seus fundamentados no Código de Defesa do Consumidor (CDC). Segundo a ministra Nancy Andrighi, o artigo 8º do código evidencia a existência de “um dever legal imposto ao fornecedor de evitar que a saúde ou segurança do consumidor sejam colocadas sob risco”, obrigando ainda que sejam dadas as informações necessárias e adequadas a respeito do produto ou serviço comercializado.

Caso esse dever não seja cumprido, os fabricantes, produtores, construtores e importadores deverão reparar os danos causados por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos, independentemente da existência de culpa, conforme preconiza o artigo 12.

Dano moral

A maioria dos julgados do STJ considera necessária a ingestão do alimento com o corpo estranho para que se configure o dano moral indenizável. Conforme esse entendimento, a aquisição do produto considerado impróprio para o consumo, em virtude de presença de corpo estranho, sem que se tenha ingerido o seu conteúdo, não revela sofrimento capaz de ensejar indenização por danos morais.

São exemplos dessa posição o AgInt no AREsp 1.018.168, da relatoria do ministro Antonio Carlos Ferreira, o REsp 1.395.647, do ministro Villas Bôas Cueva, e o AgRg no REsp 1.537.730, do ministro João Otávio de Noronha.

Em outros julgados, o tribunal entendeu que o simples fato de levar à boca o alimento industrializado com corpo estranho, independentemente de sua ingestão, é suficiente para caracterizar o dano moral. Isso porque o alimento em tais situações expõe o consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, mesmo não ocorrendo a ingestão do corpo estranho, o que gera direito à compensação por dano moral, “dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana”, conforme afirmou Nancy Andrighi no REsp 1.424.304.

No mesmo sentido foi julgado o AgRg no REsp 1.354.077, da relatoria do ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

Preservativo masculino

Imagine a seguinte situação: em março de 2013, uma mulher compra uma lata de extrato de tomate da marca Elefante, pertencente ao grupo Cargil, com prazo de validade para outubro de 2014. Ela prepara uma macarronada para seu filho. No dia seguinte, ao utilizar o restante do produto no preparo de outro prato, percebe que há algo estranho na lata. Ao analisar detalhadamente, constata que se trata de um preservativo masculino.

A situação aconteceu de fato, e o caso foi julgado pela Terceira Turma no REsp 1.558.010, sob a relatoria do ministro Moura Ribeiro.

Narram os autos que, enojada, ela procurou a delegacia e registrou boletim de ocorrência, sendo o produto encaminhado para análise no Instituto de Criminalística. O laudo constatou a presença do preservativo e considerou o produto impróprio para o consumo. Após ingerir a macarronada, seu filho passou mal, sendo atendido e medicado em hospital.

Na sentença, mantida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), a Cargil foi condenada a pagar indenização de R$ 6.780 à autora, porém, o pedido de reparação em relação ao filho foi considerado improcedente.

No recurso especial, a Cargil alegou que, ao conferir reparação por dano moral, mesmo não tendo ocorrido a comprovação da ingestão do produto, o TJMG divergiu da jurisprudência já pacificada no STJ.

O ministro Moura Ribeiro, mesmo sem poder rever a conclusão do tribunal mineiro quanto aos fatos, em razão da Súmula 7, citou posicionamento da ministra Nancy Andrighi segundo o qual “a aquisição de produto de gênero alimentício contendo em seu interior corpo estranho, expondo o consumidor a risco concreto de lesão à sua saúde e segurança, ainda que não ocorra a ingestão de seu conteúdo, dá direito à compensação por dano moral, dada a ofensa ao direito fundamental à alimentação adequada, corolário do princípio da dignidade da pessoa humana”.

Aliança no biscoito

Essa posição foi defendida pela ministra Nancy Andrighi no REsp 1.644.405, julgado em novembro de 2017. Nesse caso, uma criança de oito anos encontrou uma aliança ao mastigar um biscoito, mas a cuspiu antes de engolir. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS) reformou a sentença que condenava o fabricante a pagar indenização de R$ 10 mil por danos morais, pois considerou que, como a criança não ingeriu o corpo estranho e não houve consequência significativa da situação, apenas risco potencial à saúde, não ficou demonstrado dano concreto.

De acordo com Nancy Andrighi, a jurisprudência da corte está consolidada no sentido de que há dano moral na hipótese em que o produto alimentício em condições impróprias é consumido, ainda que parcialmente. Porém, para ela, o entendimento mais justo e adequado ao CDC é aquele que “dispensa a ingestão, mesmo que parcial, do corpo estranho indevidamente presente nos alimentos”.

“É indubitável que o corpo estranho contido no recheio de um biscoito expôs o consumidor a risco, na medida em que, levando-o à boca por estar encoberto pelo produto adquirido, sujeitou-se à ocorrência de diversos tipos de dano, seja à sua saúde física, seja à sua integridade psíquica. O consumidor foi, portanto, exposto a grave risco, o que torna ipso facto defeituoso o produto”, explicou.

Para a ministra, “o simples ‘levar à boca’ o corpo estranho possui as mesmas consequências negativas à saúde e à integridade física e psíquica do consumidor que sua deglutição propriamente dita, pois desde este momento poderá haver contaminações e lesões de diversos tipos”.

Inseto no suco

Já no caso do REsp 1.597.890, julgado em maio de 2016, o consumidor comprou uma garrafa lacrada do suco Skinka Frutas Cítricas, fabricado pela Brasil Kirin Indústria de Bebidas S.A., e quando foi consumir a bebida, viu um inseto e uma substância esbranquiçada no fundo da embalagem. Alegou que teria sentido grande a repulsa e indignação, então pediu a devolução da quantia paga e indenização por danos morais.

O relator do caso, ministro Moura Ribeiro, considerou que a jurisprudência do STJ é pacífica no sentido de que “inexiste dano moral quando não ocorre ingestão do produto considerado impróprio para consumo em razão da presença de objeto estranho no seu interior, pois tal circunstância não implica desrespeito à dignidade da pessoa humana”.

Larvas no chocolate 

No AREsp 1.095.795, da relatoria da ministra Isabel Gallotti, julgado em março de 2018, a autora da ação foi às Lojas Americanas e comprou dois tabletes de chocolate Bis, pertencente à Mondelez Brasil Ltda. (Lacta). Ela comeu um e deu o outro para o namorado, que mordeu um pedaço, mas notou sabor estranho e achou que o produto estava velho. Foi quando identificou a existência de larvas e de teia de aranha no chocolate, bem como a presença de furos possivelmente causados por algum inseto.

Os dois ajuizaram ação de reparação contra as Lojas Americanas e a Lacta. O TJMG manteve a sentença que condenou as empresas solidariamente à devolução do valor dos produtos e à indenização por dano moral no valor de R$ 8 mil, sendo R$ 4 mil para cada autor: mulher e namorado.

No STJ, a Mondelez alegou que seria caso de culpa exclusiva da revendedora, pelo mau armazenamento do produto. Mesmo sem rever a posição do tribunal mineiro, em razão da Súmula 7, a ministra concluiu que, em se tratando de relação de consumo, “são solidariamente responsáveis todos da cadeia produtiva, nada impedindo que a parte que comprovar não ter a culpa possa exercer ação de regresso para ser reembolsada do valor da indenização”, como estabelece o artigo 18 do CDC.

Sardinha de menos

Os casos de produtos alimentícios em condições impróprias vão muito além dessas situações de presença de corpos estranhos. Em maio deste ano, a Terceira Turma julgou um caso envolvendo produto com alteração de peso (REsp 1.586.515). O colegiado manteve a condenação por danos morais coletivos imposta à proprietária da marca Gomes da Costa pela venda de sardinha em lata com peso diferente do que constava na embalagem.

O Ministério Público do Rio Grande do Sul havia recebido denúncias de consumidores que afirmavam a diminuição da quantidade de sardinhas nas latas e o consequente aumento de óleo. A empresa se recusou a assinar um termo de ajustamento de conduta, então o MP ajuizou ação civil pública.

A primeira e segunda instâncias condenaram a empresa a pagar R$ 100 mil por danos morais coletivos e a proibiram de vender as sardinhas com peso inferior ao anunciado.

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, afirmou que o STJ adota a orientação de que esse tipo de dano ocorre in re ipsa, ou seja, de forma presumida, pois sua configuração “decorre da mera constatação da prática da conduta ilícita”.

Leite estragado

Em 2016, o mesmo colegiado, sob a relatoria do ministro Villas Bôas Cueva, determinou a condenação por danos morais e materiais em razão da comercialização de leite da marca Parmalat em condições impróprias para consumo, em supermercado do Rio Grande do Sul (REsp 1.334.364).

O Ministério Público do Rio Grande do Sul propôs ação civil pública contra o supermercado e a Parmalat do Brasil S.A. com base em denúncia de consumidora que comprou algumas caixas do leite no estabelecimento e, ao chegar em casa, verificou que, embora dentro do prazo de validade, o produto estava estragado.

A perícia técnica concluiu que o leite estava talhado e com aspectos físico-químicos alterados, portanto, impróprio para o consumo. Diante disso, o MP pediu a retirada do mercado do lote questionado, a publicação da condenação em jornal de grande circulação e a indenização genérica aos consumidores lesados.

O TJRS determinou que os produtos que ainda estivessem disponíveis ao consumidor fossem retirados de circulação. Entretanto, afastou a indenização tanto a título genérico aos consumidores potencialmente lesados como por violação de direitos difusos da população.

No STJ, o ministro Villas Bôas Cueva reconheceu ser devida a condenação genérica por danos morais e materiais na forma dos artigos 6º, inciso VI, 91 e 95 do CDC e 13 da Lei 7.347/85, pois, segundo ele, o caso apresenta “a violação do direito básico do consumidor à incolumidade de sua saúde, já que a disponibilização de produto em condições impróprias para o consumo não apenas frustra a justa expectativa do consumidor na fruição do bem, como também afeta a segurança que rege as relações consumeristas. No caso, laudos demonstraram a potencialidade de lesão à saúde pelo consumo do produto comercializado: leite talhado”.

A regra da impenhorabilidade do bem de família, prevista na Lei 8.009/90, também abrange os imóveis em fase de aquisição, a exemplo daqueles objeto de compromisso de compra e venda ou de financiamento para fins de moradia, sob pena de impedir que o devedor adquira o bem necessário à habitação de seu grupo familiar.

Com base nesse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou a devolução de processo ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) a fim de que a corte analise a presença dos demais requisitos legais para o reconhecimento de um imóvel alienado como bem de família. O tribunal paulista havia afastado a alegação de impenhorabilidade do bem, mas o acórdão foi reformado de forma unânime pela turma.

O recurso especial teve origem em exceção de pré-executividade apresentada sob a alegação de ilegitimidade ativa da parte para promover a execução dos títulos, além da impossibilidade de penhora dos direitos sobre bem de família.

A impugnação foi rejeitada pelo juiz de primeiro grau, que entendeu ser possível a penhora de imóvel dado em alienação fiduciária, já que, se o próprio devedor nomeia o imóvel para garantir a obrigação assumida, não pode considerá-lo impenhorável.

O TJSP manteve a decisão por concluir que a penhora não recaiu sobre a propriedade do imóvel, mas somente sobre os direitos obrigacionais que o devedor possui em relação a ele, ficando assegurado ao credor fiduciário o domínio do bem.

Extensão da proteção

O relator do recurso especial do devedor, ministro Villas Bôas Cueva, apontou jurisprudência do STJ no sentido da impossibilidade de penhora do bem alienado fiduciariamente em execução promovida por terceiros contra o devedor fiduciante, tendo em vista que o patrimônio pertence ao credor fiduciário. Contudo, afirmou que é permitida a penhora dos direitos decorrentes do contrato de alienação fiduciária.

“Todavia, a hipótese dos autos distingue-se dos casos já apreciados por esta Corte Superior porque está fundada na possibilidade, ou não, de estender eventual proteção dada ao bem de família legal sobre o direito que o devedor fiduciante tem sobre o imóvel alienado fiduciariamente e utilizado para sua moradia”, disse o ministro.

Villas Bôas Cueva ressaltou que, para a aplicação da regra de impenhorabilidade do bem de família, exige-se, em regra, que a propriedade pertença ao casal ou à entidade familiar, pois a Lei 8.009/90 utiliza o termo “imóvel residencial próprio”. Por consequência, se o imóvel submetido à constrição pertence a terceiro não integrante do grupo familiar, não poderia ser invocada, em tese, a proteção legal.

Segundo o relator, a definição que representa melhor o objetivo legal consiste em compreender que a expressão “imóvel residencial próprio” engloba a posse oriunda de contrato celebrado com a finalidade de transmissão da propriedade, a exemplo do compromisso de compra e venda ou de financiamento de imóvel para fins de moradia.

“No caso, trata-se de contrato de alienação fiduciária em garantia, no qual, havendo a quitação integral da dívida, o devedor fiduciante consolidará a propriedade para si (artigo 25, caput, da Lei 9.514/97). Assim, havendo a expectativa da aquisição do domínio, deve prevalecer a regra de impenhorabilidade”, concluiu o ministro ao determinar o retorno dos autos ao TJSP.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1677079

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro João Otávio de Noronha, afirmou nesta terça-feira (9), em Buenos Aires, que o Brasil atravessa um período de intenso combate à corrupção com a ordem constitucional em pleno vigor.

Noronha participa em Buenos Aires do evento J20 –  A Conferência Judicial das Supremas Cortes do G20, que começou segunda-feira (8) e termina nesta quarta (10). Direitos sociais, o Judiciário no combate à corrupção e ao narcotráfico e justiça e gênero são alguns dos temas debatidos no encontro.

No painel “O Papel da Justiça na Luta Contra a Corrupção”, o presidente do STJ afirmou que a recente experiência brasileira é um modelo de combate à corrupção, tendo em vista as operações que resultaram na prisão de importantes empresários, políticos e outros agentes públicos.

Neutralidade

“Vivenciamos um processo de apuração de casos de corrupção, desse crime organizado que financiou campanhas eleitorais fazendo com que o Congresso não representasse a vontade popular. Isso acabou. As últimas eleições já foram realizadas sem doações de empresas, tornando a representação popular mais legítima”, disse Noronha.

Segundo o ministro, o Brasil conseguiu a proeza de combater a corrupção mantendo a plenitude do regime democrático. Para ele, coube ao Poder Judiciário ficar neutro no processo e garantir a aplicação de normas de forma indistinta a todos os envolvidos nos escândalos.

“É importante frisar que a lei incidiu igualmente para todos, incluindo empresários, políticos e os demais. Destaco que isso só é possível porque impera no Brasil a ordem constitucional”, acrescentou.

Esplendor democrático

João Otávio de Noronha disse que o Brasil vivencia um “esplendor democrático de fazer inveja a outros países”. Ele destacou que todos os que disputaram as eleições no último domingo (7) respeitaram as regras do jogo e não há risco de ruptura institucional, seja qual for o resultado do segundo turno.

“Nenhum preso no Brasil pode se declarar preso político. Temos muitos políticos condenados e presos, todos dentro do devido processo legal. As sentenças são baseadas em provas devidamente constituídas. O Poder Judiciário é plenamente independente”, afirmou o ministro ao destacar que o papel do Judiciário no combate à corrupção é aplicar rigorosamente a lei.

Noronha lembrou que há não muito tempo o brasileiro questionava se valia a pena ser honesto, tendo em vista os escândalos de corrupção e a impunidade. “Hoje, posso dizer que não vale a pena ser corrupto no Brasil, porque a ordem jurídica incide para o pequeno e para o grande, independentemente de raça, cor ou poder econômico”, asseverou.

Na avaliação do ministro, esses resultados foram obtidos graças à coragem do Judiciário, com destaque para a atuação dos juízes de primeira instância, do Ministério Público e da Polícia Federal. Ele citou também importantes aperfeiçoamentos da legislação nacional, como a lei que regulamentou a colaboração premiada e possibilitou o avanço das investigações, permitindo ainda a recuperação de recursos desviados das estatais.

Por outro lado, o presidente do STJ reconheceu que o Brasil não teve o mesmo sucesso no combate à criminalidade geral, citando, por exemplo, o tráfico de drogas. Noronha afirmou ser preciso refletir sobre a estratégia utilizada, pois o modelo atual de combate a esse tipo de crime fracassou. Ele disse que é preciso estancar o crescimento do crime organizado, incluindo medidas como o aprimoramento do sistema prisional.

Apesar de sua caracterização como crime no artigo 28 da Lei 11.343/06, o porte de drogas com a finalidade de consumo pessoal tem previsão de punição apenas com medidas distintas da restrição de liberdade, sem que haja possibilidade de conversão dessas medidas para prisão em caso de descumprimento.

Além disso, considerando que mesmo contravenções penais puníveis com pena de prisão simples não configuram hipótese de reincidência, seria desproporcional considerar delito anterior de porte de entorpecente como óbice para, após condenação por novo crime, aplicar a redução da pena estabelecida pelo artigo 33, parágrafo 4º, da Lei de Drogas.

Ao adotar essa tese, já aplicada pela Sexta Turma, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) mudou seu entendimento sobre o tema e pacificou a jurisprudência da corte. No caso analisado, os ministros da Quinta Turma afastaram a reincidência com base no delito de porte de drogas para consumo próprio e, em virtude das circunstâncias pessoais favoráveis do réu, reduziram para um ano e oito meses de reclusão a pena que lhe havia sido imposta pelo tráfico de 7,2 gramas de crack.

Por unanimidade, o colegiado estabeleceu o regime inicial aberto para cumprimento da pena, com a substituição da pena privativa de liberdade por medidas restritivas de direitos, que deverão ser fixadas pelo juízo das execuções criminais.

A reincidência tinha sido reconhecida pela Justiça de São Paulo em razão do cometimento anterior do delito previsto pelo artigo 28 da Lei de Drogas. Com o afastamento da possibilidade de redução da pena, a condenação foi fixada em cinco anos de reclusão, em regime inicial fechado.

Despenalização

Em habeas corpus, a defesa buscava o reconhecimento da ilegalidade da condenação do réu pelo crime de tráfico. De forma subsidiária, também pedia o afastamento da reincidência e a aplicação da redução prevista pelo parágrafo 4º do artigo 33 da Lei de Drogas (tráfico privilegiado), com a consequente nova dosimetria da pena.

Em relação à caracterização do crime de tráfico, o ministro Reynaldo Soares da Fonseca, relator, apontou que o Tribunal de Justiça de São Paulo firmou sua convicção sobre a ocorrência do delito com base em amplo exame das provas, e sua reanálise não é possível em habeas corpus.

O relator também destacou que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do RE 430.105, entendeu que a conduta de porte de substância para consumo próprio foi despenalizada pela Lei de Drogas, mas não descriminalizada.

Desproporção

Segundo o ministro, ainda que não tenha havido abolitio criminis, a legislação prevê a punição da conduta apenas com advertência sobre os efeitos das drogas, prestação de serviços à comunidade ou participação em curso educativo. Além disso, lembrou, não existe a possibilidade de converter essas penas em privativas de liberdade em caso de descumprimento.

“Cabe ressaltar que as condenações anteriores por contravenções penais não são aptas a gerar reincidência, tendo em vista o que dispõe o artigo 63 do Código Penal, que apenas se refere a crimes anteriores. E, se as contravenções penais, puníveis com pena de prisão simples, não geram reincidência, mostra-se desproporcional o delito do artigo 28 da Lei 11.343/2006 configurar reincidência, tendo em vista que nem é punível com pena privativa de liberdade”, disse o ministro.

Após afastar os efeitos da reincidência, Reynaldo Soares da Fonseca ressaltou que, para ter direito ao reconhecimento da redutora prevista pelo parágrafo 4º do artigo 33, o condenado deve preencher, cumulativamente, todos os requisitos legais – ser primário, de bons antecedentes, não se dedicar a atividades criminosa nem integrar organização criminosa.

“No caso, verifico que a redutora não foi aplicada apenas em razão da reincidência e, tendo em vista o afastamento dessa agravante, a benesse deve ser reconhecida e aplicada na fração máxima de dois terços, sobretudo em razão da não expressiva quantidade de droga apreendida (7,2 gramas de crack)”, concluiu o ministro ao redimensionar a pena e fixar o regime inicial aberto.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): HC 453437

Em decisão unânime, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) fixou tese no sentido de que configura prática abusiva da empresa aérea, por violação direta do Código de Defesa do Consumidor, o cancelamento automático e unilateral do bilhete de retorno em virtude do não comparecimento do passageiro para o trecho de ida.

O julgamento pacifica o entendimento sobre o tema nas duas turmas de direito privado do STJ. Em novembro de 2017, a Quarta Turma já havia adotado conclusão no mesmo sentido – à época, a empresa aérea foi condenada a indenizar em R$ 25 mil uma passageira que teve o voo de volta cancelado após não ter se apresentado para embarque no voo de ida.

Com efeito, obrigar o consumidor a adquirir nova passagem aérea para efetuar a viagem no mesmo trecho e hora marcados, a despeito de já ter efetuado o pagamento, configura obrigação abusiva, pois coloca o consumidor em desvantagem exagerada, sendo, ainda, incompatível com a boa-fé objetiva que deve reger as relações contratuais (CDC, artigo 51, IV)”, afirmou o relator do recurso especial na Terceira Turma, ministro Marco Aurélio Bellizze.

Segundo o ministro, a situação também configura a prática de venda casada, pois condiciona o fornecimento do serviço de transporte aéreo de volta à utilização do trecho de ida. Além da restituição dos valores pagos com as passagens de retorno adicionais, o colegiado condenou a empresa aérea ao pagamento de indenização por danos morais de R$ 5 mil para cada passageiro.

Engano

No caso analisado pela Terceira Turma, dois clientes adquiriram passagens entre São Paulo e Brasília, pretendendo embarcar no aeroporto de Guarulhos. Por engano, eles acabaram selecionando na reserva o aeroporto de Viracopos, em Campinas (SP), motivo pelo qual tiveram que comprar novas passagens de ida com embarque em Guarulhos.

Ao tentar fazer o check-in no retorno, foram informados pela empresa aérea de que não poderiam embarcar, pois suas reservas de volta haviam sido canceladas por causa do no show no momento da ida. Por isso, tiveram que comprar novas passagens.

O pedido de indenização por danos morais e materiais foi julgado improcedente em primeiro grau, sentença mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Para o tribunal, o equívoco dos clientes quanto ao aeroporto de partida gerou o cancelamento automático do voo de retorno, não havendo abuso, venda casada ou outras violações ao CDC.

Venda casada

O ministro Marco Aurélio Bellizze apontou inicialmente que, entre os diversos mecanismos de proteção ao consumidor trazidos pelo CDC, destaca-se o artigo 51, que estabelece hipóteses de configuração de cláusulas abusivas em contratos de consumo. Além disso, o artigo 39 da lei fixa situações consideradas abusivas, entre elas a proibição da chamada “venda casada” pelo fornecedor.

“No caso, a previsão de cancelamento unilateral da passagem de volta, em razão do não comparecimento para embarque no trecho de ida (no show), configura prática rechaçada pelo Código de Defesa do Consumidor, devendo o Poder Judiciário restabelecer o necessário equilíbrio contratual”, afirmou o ministro.

Além da configuração do abuso, o relator lembrou que a autorização contratual que permite ao fornecedor cancelar o contrato unilateralmente não está disponível para o consumidor, o que implica violação do artigo 51, parágrafo XI, do CDC. Bellizze disse ainda que, embora a aquisição dos bilhetes do tipo “ida e volta” seja mais barata, são realizadas duas compras na operação (uma passagem de ida, outra de volta), tanto que os valores são mais elevados caso comparados à compra de apenas um trecho.

“Dessa forma, se o consumidor, por qualquer motivo, não comparecer ao embarque no trecho de ida, deverá a empresa aérea adotar as medidas cabíveis quanto à aplicação de multa ou restrições ao valor do reembolso em relação ao respectivo bilhete, não havendo, porém, qualquer repercussão no trecho de volta, caso o consumidor não opte pelo cancelamento”, concluiu o ministro ao condenar a empresa aérea ao pagamento de danos morais e materiais.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1699780

Quarta Turma decide que planos têm de cobrir uso off label de medicamentos com registro na Anvisa

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que os planos de saúde devem pagar pelo uso off label de medicamento registrado na Anvisa. A decisão unifica o entendimento do tribunal sobre a questão, pois a Terceira Turma, que também analisa processos de direito privado, já havia se manifestado no mesmo sentido de que a falta de indicação específica na bula não é motivo para a negativa de cobertura do tratamento.

No recurso especial, a operadora do plano de saúde contestava acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que deu provimento ao pedido de uma beneficiária que precisava usar medicação fora das hipóteses da bula em tratamento da doença trombocitemia essencial.

A paciente tinha a medicação custeada pelo plano, mas, ao precisar trocar o remédio por causa da gravidez, teve o pedido de cobertura negado. A médica prescreveu outro fármaco permitido durante a gestação, mas cuja bula não o indicava para aquela doença. A operadora invocou orientação da Agência Nacional de Saúde (ANS) no sentido da inexistência de obrigação de cobertura para tratamento off label.

Segundo o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, o off label corresponde ao uso “essencialmente correto de medicação aprovada em ensaios clínicos e produzida sob controle estatal, apenas ainda não aprovado para determinada terapêutica”.

O ministro explicou que, embora o uso de medicação fora das hipóteses da bula deva ter respaldo em evidências científicas (clínicas), ele seria corriqueiro “e, sob pena de se tolher a utilização, para uma infinidade de tratamentos, de medicamentos eficazes para a terapêutica, não cabe, a meu juízo, ser genericamente vedada sua utilização”.

Em seu voto, Salomão disse que tal forma de tratamento é respaldada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Citou o Enunciado 31 da I Jornada de Direito da Saúde, que recomenda ao juiz, nesses casos, a obtenção de informações do Núcleo de Apoio Técnico ou Câmara Técnica e, na sua ausência, de outros serviços de atendimento especializado, tais como instituições universitárias e associações profissionais.

Tratamento experimental

Nas alegações do recurso, a operadora argumentou que o artigo 10 da Lei 9.656/98 expressamente excluiria da relação contratual a cobertura de tratamento clínico ou cirúrgico experimental, fornecimento de medicamentos importados não nacionalizados e tratamentos não reconhecidos pelas autoridades competentes.

No entanto, o ministro Salomão explicou que há uma confusão entre os conceitos de uso off label e tratamento experimental. Segundo ele, a lei que regula os planos de saúde deve ser interpretada em harmonia com o artigo 7º da Lei 12.842/13, que estabelece entre as competências do Conselho Federal de Medicina (CFM) – e não da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) – a edição de normas para definir o caráter experimental de procedimentos em medicina, autorizando ou vedando sua prática pelos médicos.

Assim, explicou o ministro, ainda que não tenha uma definição uniforme, o CFM entendeu que o uso off label ocorreria por indicação médica pontual e específica, sob o risco do profissional que o indicou. Em seu voto, o relator informou que o CFM optou por não editar norma geral para tratar do uso de remédios fora das hipóteses da bula, pois entendeu que estaria disciplinando de forma genérica situações que são específicas e casuísticas.

Segundo Salomão, há expressa vedação legal ao fornecimento de medicamento sem registro na Anvisa e à cobertura de tratamento experimental, “não havendo cogitar, nessas hipóteses, em existência de legítima pretensão a ensejar o ajuizamento de ação vindicando o fornecimento de remédio, pela operadora de plano privado de saúde, em flagrante desacordo com a legislação sanitária e de regência dos planos e seguros de saúde”.

O relator ressaltou que o Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC) apresentou entendimento sobre o conceito de tratamento experimental, quando convidado, como amicus curie, a trazer subsídios no julgamento do REsp 1.628.854. Para o IDEC, o tratamento experimental teria o intuito de pesquisa clínica e não propriamente de tratamento. O objetivo seria o de alcançar resultado eficaz e apto ao avanço das técnicas terapêuticas empregadas, ocorrendo em benefício do pesquisador e do patrocinador da pesquisa.

Por entenderem que o uso de medicamento off label não corresponde a uso incomum e não traz risco à saúde da autora, os ministros confirmaram a decisão das instâncias ordinárias e negaram provimento ao recurso especial da operadora.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1729566

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, nos recursos de apelação, a técnica de julgamento ampliado prevista pelo artigo 942 do Código de Processo Civil de 2015 deve ser utilizada tanto nos casos em que há reforma da sentença quanto nos casos em que a sentença é mantida, desde que a decisão não seja unânime.

Para o relator, ministro Luis Felipe Salomão, a lei não deixa dúvidas quanto ao cabimento da técnica do artigo 942 nas hipóteses em que o resultado não for unânime no julgamento da apelação.

“Não obstante as críticas à opção do legislador de adotar um escopo amplo para a técnica do artigo 942 do CPC de 2015 na apelação, entendo que a interpretação não pode afastar-se da letra da lei, que não deixa dúvidas quanto ao seu cabimento em todas as hipóteses de resultado não unânime de julgamento da apelação, e não apenas quando ocorrer a reforma de sentença de mérito”, disse.

Pedido negado

No caso analisado pelo colegiado, uma seguradora apresentou recurso ao Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) contra sentença que a condenou a inserir nos contratos de seguro residencial a cobertura para as modalidades de furto simples e qualificado, sob pena de multa diária.

A turma julgadora do TJSC negou provimento à apelação, por maioria de votos. A seguradora então questionou o tribunal, por petição, sobre a possibilidade de se utilizar a técnica de julgamento do artigo 942 do CPC. A corte catarinense indeferiu o pedido, afirmando que o julgamento ampliado só seria possível na hipótese de reforma da sentença.

A empresa recorreu ao STJ alegando divergência jurisprudencial no que diz respeito à aplicação do artigo 942. Segundo a seguradora, a aplicação do julgamento estendido não poderia ter sido afastada, pois o único requisito do dispositivo legal é que o julgamento da apelação não tenha sido unânime.

Automático e obrigatório

O ministro Salomão destacou que o legislador priorizou a celeridade processual no novo CPC. Com a extinção dos embargos infringentes (cabíveis contra a reforma não unânime da sentença), previa-se maior rapidez no processo. “No entanto, o legislador, no apagar das luzes, resolveu criar uma técnica de julgamento, de ofício, com contornos muito semelhantes aos do recurso de embargos infringentes, mas que com ele não se confunde”, disse o relator.

Segundo Salomão, a técnica de julgamento prevista pelo artigo 942 não é uma espécie recursal nova, já que não há voluntariedade ou facultatividade do direito de recorrer. Para o ministro, o emprego da técnica é automático e obrigatório, conforme indica a expressão “o julgamento terá prosseguimento”, constante do caput do dispositivo.

“É possível perceber que o interesse havido na manutenção do procedimento correspondente aos infringentes – ainda que mediante a extinção do recurso – não é apenas das partes, mas também público, dada a uniformização e a amplitude da discussão que possibilita junto aos julgados não unânimes”, apontou.

O ministro citou o jurista Alexandre Freitas Câmara, para quem a técnica de complementação de julgamento não tem natureza recursal, mas funciona por meio de uma ampliação do colegiado, que passa a ser formado por cinco desembargadores, e não mais três.

Nova sessão

Ao analisar o caso concreto, diante da pretensão da recorrente, o relator afirmou que não é possível outra interpretação senão a de que a técnica de julgamento ampliado é passível de ser utilizada também nos casos em há manutenção da sentença por maioria de votos.

“No caso, segundo penso, como houve julgamento não unânime quanto ao resultado da apelação, mister seria a aplicação da técnica prevista no artigo 942, sem nenhuma condicionante”, afirmou Salomão.

Ao dar provimento ao recurso, a Quarta Turma, por maioria, declarou a nulidade do acórdão recorrido e determinou o retorno dos autos ao tribunal de origem, com a convocação de nova sessão para prosseguimento do julgamento da apelação interposta pela seguradora, nos moldes do artigo 942.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1733820

O crime de organização criminosa não é admitido como antecedente da lavagem de dinheiro nos fatos ocorridos antes da Lei 12.850/13, já que até então não havia tipificação para aquele delito.

Com base nesse entendimento, a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) absolveu, por atipicidade da conduta, um homem acusado de lavagem de dinheiro, já que a prática foi descrita como consequência das ações de organização criminosa, em fatos consumados antes da Lei 12.850/13, que estabeleceu o conceito de organização criminosa.

O relator do caso, ministro Ribeiro Dantas, explicou que a lei vigente à época dos fatos trazia rol exaustivo de quais práticas eram consideradas crimes antecedentes à lavagem de dinheiro. O ministro destacou que a lei sobre os crimes de lavagem foi modificada para ampliar o conceito somente em 2012, após a ocorrência dos fatos.

“Conquanto o advento da Lei 12.683/12 tenha afastado o rol exaustivo dos crimes-base previsto na redação original da Lei 9.613/98, tendo passado a admitir que bens, valores ou direitos oriundos de qualquer crime ou contravenção penal possam ser objeto de lavagem de dinheiro, não se revela possível aplicar tal entendimento, por ser ele mais gravoso ao réu, a atos de branqueamento perpetrados antes da sua entrada em vigor”, declarou o ministro.

Ribeiro Dantas disse que, por se tratar de crime acessório, derivado ou parasitário, o crime de lavagem de dinheiro pressupõe a existência de infração anterior, que constitui uma circunstância elementar da lavagem.

Absolvição

A atipicidade da conduta impõe a absolvição referente à lavagem de dinheiro, segundo o ministro.

“A teor da jurisprudência desta corte, dada a ausência de definição jurídica à época dos fatos, a qual somente foi inserida no ordenamento jurídico pela Lei 12.850/13, o crime praticado por organização criminosa não era admitido como antecedente da lavagem de dinheiro”, disse Ribeiro Dantas.

O relator explicou que, mesmo que se considere que os membros da organização criminosa foram condenados com base no artigo 288 do Código Penal, é preciso reconhecer que tal delito não estava elencado entre os crimes antecedentes previstos na redação anterior da Lei 9.613/98.

Segundo o ministro, o ato de lavagem de dinheiro atribuído ao réu – auxílio na ocultação da compra de aeronave por meio de contrato de leasing envolvendo o líder da associação criminosa – foi perpetrado antes da entrada em vigor da lei definidora do crime de organização criminosa, “restando demonstrada a atipicidade da conduta”.

Destaques de hoje
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):

Nos contratos de alienação fiduciária com garantia de bem imóvel, a responsabilidade pelo pagamento de despesas condominiais é do devedor quando ele estiver na posse direta do imóvel. Os encargos só podem ser atribuídos ao credor fiduciário se houver a consolidação de sua propriedade, tornando-se ele o possuidor do bem. Em caso de utilização da garantia, o credor recebe o imóvel no estado em que se encontra, inclusive com os débitos condominiais anteriores, tendo em vista o caráter propter rem das obrigações.

As teses foram fixadas pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao dar provimento a recurso especial de uma administradora de consórcios – credora fiduciária – e afastar sua responsabilidade pelo pagamento de encargos condominiais em solidariedade com o devedor. A decisão foi unânime.

Originalmente, o condomínio ingressou com ação de cobrança de despesas condominiais contra o devedor e a administradora de consórcios. Em primeira instância, o juiz condenou os réus a pagar, de forma solidária, os encargos vencidos e vincendos.

A sentença foi mantida pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), para o qual, como a empresa administradora do consórcio é proprietária do imóvel que lhe foi dado como garantia, ela também possui legitimidade para figurar no polo passivo do processo.

Posse direta

O ministro Villas Bôas Cueva lembrou que, de acordo com a Lei 9.514/97, a alienação fiduciária é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de bem imóvel. Nos termos do artigo 27, parágrafo 8º, da mesma lei, o fiduciante responde pelo pagamento de contribuições condominiais até a data em que o fiduciário vier a ser imitido na posse.

“A exegese legal é no sentido de que a obrigação de pagar as contribuições condominiais recai sobre o devedor fiduciante, enquanto ele estiver na posse direta do imóvel. Entretanto, essa responsabilidade passará ao credor fiduciário se ele for imitido na posse. Desse modo, em contrato de alienação fiduciária de bem imóvel, a lei de regência estabelece que o referido encargo é do possuidor direto do imóvel (no caso, o fiduciante)”, explicou o ministro.

Além disso, Villas Bôas Cueva ressaltou que o credor fiduciário apenas é considerado proprietário do imóvel para fins de execução da garantia, inclusive havendo restrição legal ao seu direito de dispor do bem – a própria legislação, por exemplo, não autoriza o credor a ficar com o patrimônio alienado se a dívida não for paga no vencimento.

“Nessa linha, não é cabível atribuir a responsabilidade do credor fiduciário pelas dívidas condominiais antes de fazer uso da garantia sob pena de desvirtuar o próprio instituto da alienação fiduciária. O fiduciário e o condomínio são prejudicados com a inadimplência do devedor fiduciante, haja vista que se a instituição financeira consolidar a propriedade para si, receberá o imóvel no estado em que se encontra, até mesmo com os débitos condominiais, pois são obrigações de caráter propter rem (por causa da coisa)”, concluiu o ministro ao afastar a responsabilidade do credor pelo pagamento dos encargos condominiais.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 169603