​Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), o imóvel com cláusula de inalienabilidade temporária não entra na partilha de bens do divórcio de um casal que se separou de fato durante o prazo restritivo, sendo indiferente se a sentença de divórcio foi proferida após esse período.

Com esse entendimento, o colegiado negou provimento ao recurso de uma mulher que pretendia incluir na partilha do divórcio o imóvel no qual residia com o ex-marido. O bem foi doado a ele em 2006, com registro em cartório em 2009, mas com expressa proibição de permuta, cessão, aluguel, venda ou qualquer outra forma de repasse pelo prazo de dez anos.

Ao STJ, a recorrente alegou que, quando a sentença de divórcio foi proferida, em setembro de 2016, o prazo de dez anos da cláusula de inalienabilidade já havia transcorrido, e o imóvel tinha passado a integrar o patrimônio comum do casal.

Bem doado com cláusula de inalienabilidade é patrimônio particular do donatário

O relator, ministro Marco Aurélio Bellizze, explicou que o artigo 1.668 do Código Civil prevê os casos de bens que são considerados particulares mesmo no regime da comunhão universal; no inciso I, exclui da comunhão os “bens doados ou herdados com a cláusula de incomunicabilidade e os sub-rogados em seu lugar”.

Segundo o relator, nessa hipótese, o donatário não pode praticar nenhum ato de disposição pelo qual o bem passe à titularidade de outra pessoa, “e é exatamente em decorrência dessa mutilação ao direito de propriedade (perda do poder de dispor) que o bem doado gravado com cláusula de inalienabilidade configura um bem particular do donatário e não integra o patrimônio partilhável no regime da comunhão universal de bens”.

Esse entendimento, ressaltou, foi cristalizado na Súmula 49 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual “a cláusula de inalienabilidade inclui a incomunicabilidade dos bens”.

Separação de fato é hipótese informal de dissolução da sociedade conjugal

No caso em análise, o ministro verificou que o casamento ocorreu em 20 de maio de 2012, sob o regime de comunhão universal, e que o casal está separado desde março de 2013, sem possibilidade de reconciliação.

Bellizze lembrou que a extinção do vínculo conjugal se dá pela invalidade do casamento, pela morte de um dos cônjuges ou pelo divórcio, de modo que, a partir desses marcos, não mais persistem os efeitos do matrimônio. Além disso, observou, no caso de separação de fato – hipótese informal de dissolução da sociedade conjugal –, também incide, por analogia, a regra da separação judicial ou extrajudicial prevista no artigo 1.576 do Código Civil – que tem como um dos seus efeitos o fim da eficácia do regime de bens.

De acordo com o relator, o STJ entende que os bens adquiridos durante a separação de fato não são partilháveis com a decretação do divórcio.

“Considerar como termo final do regime de bens a data da sentença de divórcio poderia gerar situações inusitadas e injustas, já que, durante o lapso temporal compreendido entre o fim da sociedade conjugal e a sentença de divórcio, um dos cônjuges poderia adquirir outros bens com recursos próprios ou até mesmo com o esforço comum de um novo companheiro (haja vista o fim do dever de fidelidade e a possibilidade de constituição de união estável), mas que seriam incluídos na partilha de bens do relacionamento extinto”, disse.

Na hipótese dos autos, o ministro apontou que a separação de fato ocorreu quando ainda vigorava a cláusula de inalienabilidade e, consequentemente, o imóvel doado não integrava o patrimônio do casal, devendo, portanto, ser reconhecida a sua incomunicabilidade.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

A promulgação da Emenda Constitucional 125, que cria o requisito da relevância para a admissão do recurso especial, veio em um ano marcante na história do Superior Tribunal de Justiça (STJ): instalada em abril de 1989, a corte viu o número de processos crescer de forma vertiginosa ao longo desses 33 anos e, em maio, registrou o recurso especial de número 2.000.000.

A marca intensificou o debate sobre um dos principais entraves à atividade judicial no Brasil. Se, por um lado, o STJ se modernizou e passou a ser capaz de julgar muito mais, por outro, o excessivo número de processos recebidos fez com que se distanciasse de seu papel uniformizador da jurisprudência infraconstitucional, ocupando-se cada vez mais da função de terceira instância revisora de causas cujo interesse é restrito às partes.

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Para o presidente do STJ, ministro Humberto Martins, os atores do mundo jurídico precisam se conscientizar de que o acesso ao Poder Judiciário por meio dos recursos de natureza especial tem finalidade específica delineada pela Constituição Federal de 1988, a qual atribuiu à corte a incumbência de unificar a interpretação da legislação federal.

Sobre os 2 milhões de recursos especiais, ele afirmou que “essa marca representa a confiança da sociedade em suas instituições, mas também um problema e uma grande responsabilidade, pois as controvérsias sem maior repercussão na uniformização da jurisprudência acabam assoberbando os órgãos de superposição do Poder Judiciário”.

O empenho para garantir uma prestação jurisdicional uniforme, eficiente e justa

O recurso especial é a mais importante classe processual das várias que se enquadram na competência do Tribunal da Cidadania, relacionando-se diretamente com a missão constitucional da corte e com a própria razão de sua criação pela Constituinte de 1987-1988. Resultou do desmembramento do recurso extraordinário, que manteve no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento de questões constitucionais e transferiu a uma nova corte, o STJ, a tarefa de analisar supostas violações da lei federal e de uniformizar nacionalmente a sua aplicação.

O STJ chegou ao recurso especial de número 1.000.000 em 2007, 18 anos após receber seu primeiro processo, em maio de 1989, mas precisou de três anos a menos para atingir a marca de 2 milhões nessa classe processual.​​​​​​​​​

Em 2021, o STJ recebeu 408.770 processos (de todas as classes) e julgou 427.906. Apesar da redução do estoque nos últimos anos, a demanda alta prejudica o cumprimento da missão preponderante da corte.​

Diante do grande volume de demandas submetidas aos tribunais brasileiros, o Poder Judiciário tem buscado formas de reduzir a judicialização – como o incentivo à mediação, à conciliação e à arbitragem – e outros meios de proteger o papel institucional de cada órgão julgador.

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Um dos instrumentos adotados pelo STJ para preservar o seu papel de corte de precedentes foi, desde o princípio, a Súmula 7. Segundo o enunciado, aprovado pouco mais de um ano após a instalação da corte, “a pretensão de simples reexame de prova não enseja recurso especial”. Isso significa que, no julgamento desse recurso, não cabe ao STJ reapreciar fatos nem reexaminar provas, mas, sim, analisar questões eminentemente jurídicas.

Nas palavras do ministro Luis Felipe Salomão (AgInt no REsp 1.677.653), “o recurso especial tem como escopo a defesa da higidez do direito objetivo e a unificação da jurisprudência em matéria infraconstitucional, não se admitindo que o STJ funcione como mera instância revisora, pois não é essa sua missão constitucional”.

Novas ferramentas para dar mais rapidez e segurança à Justiça

O empenho por um sistema processual mais racional, que também envolve os Poderes Legislativo e Executivo, teve um grande momento em 2015, com a promulgação do novo Código de Processo Civil (CPC/2015).

Sem prejuízo dos esforços já empreendidos por meio do Código de Processo Civil de 1973 (CPC/1973) e de suas reformas para garantir a celeridade processual e a segurança jurídica, o CPC/2015 trouxe ferramentas inovadoras e aperfeiçoou o sistema de julgamento das demandas de massa ou que envolvam relevantes questões de direito. Nessa nova ordem processual, destaca-se a disciplina do recurso repetitivo, do Incidente de Assunção de Competência (IAC) e do Incidente de Resolução de Demandas Repetitivas (IRDR).

Conforme a exposição de motivos do CPC/2015, “criaram-se figuras para evitar a dispersão excessiva da jurisprudência. Com isso, haverá condições de se atenuar o assoberbamento de trabalho no Poder Judiciário, sem comprometer a qualidade da prestação jurisdicional”.

Possibilidade de suspensão dos processos que tratem de idêntica questão

No recurso repetitivo, o STJ define uma tese para ser aplicada aos processos em que se discute idêntica questão de direito. A escolha do processo para ser julgado como repetitivo pode recair em recurso indicado pelo tribunal de origem como representativo de controvérsia (artigo 256-I do Regimento Interno do STJ – RISTJ) ou em recurso já em tramitação na corte superior.

Como inovação, o CPC/2015 trouxe a possibilidade de suspensão do processamento das demais ações que versem sobre o mesmo tema jurídico. Com isso, evita-se a reforma em instâncias superiores para a aplicação da tese, uma vez que os processos aguardarão o julgamento do repetitivo.

Para aperfeiçoar o sistema de precedentes qualificados, que fortalecem a jurisprudência e evitam a multiplicação de recursos sobre questões idênticas, foram criados no STJ a Comissão Gestora de Precedentes (Cogepac) e o Núcleo de Gerenciamento de Precedentes e de Ações Coletivas (Nugepnac).

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A Cogepac, atualmente presidida pelo ministro Paulo de Tarso Sanseverino, tem como missão coordenar os procedimentos administrativos relacionados ao julgamento de casos repetitivos, de IAC, de Suspensão em IRDR (SIRDR), bem como ao monitoramento e à sistematização das informações relativas ao julgamento das ações coletivas no âmbito do Tribunal da Cidadania. 

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Já o Nugepnac, unidade vinculada ao gabinete da Presidência, é responsável pela gestão da sistemática dos precedentes qualificados previstos no CPC/2015 – repercussão geral, recursos repetitivos, IAC e SIRDR –, bem como por fortalecer o monitoramento e a busca de eficácia no julgamento das ações coletivas. 

Observância dos precedentes melhora o desempenho das instâncias ordinárias

“Nos últimos anos, pudemos observar a sensível melhoria da gestão dos recursos repetitivos no âmbito do STJ, inclusive com a possibilidade do emprego da inteligência artificial para a identificação de casos que concentram grande volume de processos cuja discussão de fundo é a mesma”, afirmou o presidente do STJ durante a abertura da Semana Jurídica da Universidade Santo Amaro (Unisa), em outubro de 2020.​​​​​​​​​

Desde a criação do recurso repetitivo pela Lei 11.672/2008 e até o encerramento do primeiro semestre deste ano, o STJ julgou 896 temas. No mesmo período, também foram julgados 12 IACs.​

No mesmo evento, Humberto Martins destacou que “a efetiva observância dos precedentes judiciais não somente auxiliará o STJ, enquanto unificador da jurisprudência infraconstitucional, como também trará mais segurança e produtividade aos juízos de primeiro e segundo graus, que terão um norte para seguir quando se depararem com teses jurídicas firmadas nas instâncias superiores”.

Sobre a vinculação, o ministro ponderou que “é irrefutável a necessidade de destacar a força vinculante dos precedentes formados nos tribunais brasileiros e seu impacto na uniformização da jurisprudência pátria”.

Para prevenir ou compor divergência entre órgãos julgadores

Segundo o artigo 947 do CPC/2015, é admissível a assunção de competência quando o julgamento de recurso, de remessa necessária ou de processo de competência originária envolver relevante questão de direito, com grande repercussão social, sem repetição em múltiplos processos, bem como quando ocorrer relevante questão de direito a respeito da qual seja conveniente a prevenção ou a composição de divergência entre câmaras ou turmas do tribunal.

“Com efeito, o novel incidente, nascido de disposição expressa do Código de Processo Civil, destina-se, entre outros fins, à prevenção e à composição de divergência jurisprudencial, cujos efeitos são inegavelmente perversos para a segurança jurídica e para a previsibilidade do sistema processual”. A afirmação foi feita pelo ministro Marco Aurélio Bellizze, relator do primeiro IAC em recurso especial (REsp 1.604.412) admitido pelo STJ.

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Na ocasião, a Terceira Turma discutia os seguintes temas: cabimento da prescrição intercorrente e a eventual imprescindibilidade de intimação prévia do credor; e necessidade de oportunidade para o autor dar andamento ao processo paralisado por prazo superior àquele previsto para a prescrição da pretensão veiculada na demanda.

Com a aprovação do incidente, a Segunda Seção passou a ser responsável pelo julgamento do caso. A propor a assunção de competência, Bellizze destacou a relevância das questões jurídicas e a divergência de entendimentos entre a Terceira e a Quarta Turmas do tribunal, especializadas em direito privado.

Assim como os recursos especiais repetitivos e os enunciados de súmula do STJ, os acórdãos proferidos em julgamento de IAC são identificados como precedentes qualificados (artigo 121-A do Regimento Interno do STJ). Na prática, isso significa que as teses adotadas em assunção de competência devem ser observadas de forma estrita por juízes e tribunais.

Uma solução na origem para questões com potencial repetitivo

Criado com inspiração no direito alemão, o IRDR, previsto nos artigos 976 a 987 do CPC/2015, é admissível quando identificada, em primeiro grau, controvérsia com potencial de gerar multiplicação expressiva de demandas e o risco de decisões conflitantes.

Instaurado perante o tribunal local, por iniciativa do juiz, do Ministério Público, da Defensoria Pública ou pelo próprio relator, o IRDR tem preferência de julgamento sobre os demais feitos, salvo os que envolvam réu preso ou pedido de habeas corpus (exposição de motivos do CPC/2015).

O IRDR integra o microssistema dos repetitivos (artigo 928 do CPC/2015). Como lembrou o ministro Og Fernandes, ao relatar o REsp 1.869.867, o acórdão em IRDR (que tem efeito na área de jurisdição do tribunal de segundo grau) pode ser combatido por recurso especial e extraordinário, os quais, quando julgados, pacificam a questão em todo o território nacional – o que confirma a importância desse instrumento para a uniformização da jurisprudência e a garantia da segurança jurídica.

Exatamente por isso, existe a possiblidade de ajuizamento do pedido de suspensão nacional da tramitação de processos que cuidem da mesma questão de direito objeto de um IRDR, a chamada SIRDR (artigo 271-A do RISTJ).

De acordo com Og Fernandes, interposto recurso especial ou extraordinário contra o acórdão que julgou IRDR, “a suspensão dos processos realizada pelo relator ao admitir o incidente só cessará com o julgamento dos referidos recursos, não sendo necessário, entretanto, aguardar o trânsito em julgado”.

No caso de indeferimento do pedido apresentado na SIRDR, essa decisão resultará, em regra, na manutenção da suspensão dos processos pendentes, individuais ou coletivos, que tramitam no estado ou na região, conforme determinado no IRDR pelo tribunal de origem, se houver. 

Decisões importantes sobre o IRDR

Como um instrumento novo no sistema jurídico brasileiro, ainda restam muitas dúvidas sobre o manejo do IRDR, porém, o STJ tem atuado para dirimir tais questionamentos. No julgamento do REsp 1.798.374, de relatoria do ministro Mauro Campbell Marques, a Corte Especial definiu a seguinte tese:

“Não cabe recurso especial contra acórdão proferido pelo tribunal de origem que fixa tese jurídica em abstrato em julgamento do IRDR, por ausência do requisito constitucional de cabimento de ‘causa decidida’, mas apenas naquele que aplique a tese fixada, que resolva a lide, desde que observados os demais requisitos do artigo 105, III, da Constituição Federal e dos dispositivos do Código de Processo Civil que regem o tema.”

A Terceira Turma, no julgamento do REsp 1.631.846, acompanhando o voto da ministra Nancy Andrighi , entendeu que não cabe recurso especial contra acórdão de segundo grau que admite, ou não, o IRDR suscitado por alguns de seus legitimados.

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Em webinário realizado em agosto de 2021, o presidente do STJ comentou que “o IRDR possui relevância ímpar para a uniformização das jurisprudências local, federal e trabalhista, reduzindo a atividade repetitiva e o envio aos tribunais superiores de processos que poderiam ser finalizados na origem”.

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Na mesma ocasião, a ministra Assusete Magalhães destacou que “o IRDR é um relevante instrumento concebido pelo CPC/2015 que visa a atender à racionalização do trabalho e aos princípios da celeridade processual, da isonomia e da segurança jurídica na entrega da prestação jurisdicional”.

O critério da relevância contra o abarrotamento da máquina judiciária

Promulgada no dia 14 de julho deste ano, a Emenda Constitucional 125 constitui um marco na história do STJ. A instituição do filtro de relevância para a admissão de recursos especiais no tribunal é o resultado de uma década de debates.

A nova emenda altera a redação do artigo 105 da Constituição Federal, exigindo do recorrente a demonstração da relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no processo. A admissibilidade do recurso somente poderá ser recusada pela manifestação de dois terços dos membros do órgão competente para julgamento.

A intenção é que o STJ se concentre no julgamento das demandas que permitem o cumprimento de seu papel de uniformização da lei federal, com discussões que transcendam a importância do tema exclusivamente para as partes.

“A Emenda Constitucional 125 é uma conquista, sobretudo, para a sociedade, que certamente colherá os frutos dessa importante alteração no sistema de interposição de recursos especiais, em que o STJ reforça sua atuação em questões de grande relevância para o jurisdicionado”, avaliou o presidente da corte.

​O defensor público, atuando em nome da Defensoria Pública (DP), tem legitimidade para impetrar mandado de segurança em defesa de suas funções institucionais, nos termos do artigo 4º, inciso IX, da Lei Complementar 80/1994, pois essa atribuição não é exclusiva do defensor público-geral.

Com base nos princípios institucionais da unidade e da indivisibilidade da DP, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) firmou esse entendimento ao reformar acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) que negou mandado de segurança impetrado por um defensor para garantir a sua atuação na curadoria de réu revel. Para a corte estadual, apenas o defensor público-geral do estado teria legitimidade para representar a instituição em juízo, de acordo com o artigo 100 da LC 80/1994.

Segundo os autos, o defensor atuou como curador de réu revel, citado por edital, em um processo de divórcio litigioso, no qual a parte autora também é assistida pela DP. Por essa razão, a juíza considerou irregular a atuação do órgão na curadoria e destituiu o defensor dessa função, nomeando em seu lugar um advogado particular, cujos honorários seriam arbitrados posteriormente.

Lei não exclui legitimidade de defensor para atuar na defesa de suas funções

No recurso submetido ao STJ, o defensor destituído alegou que o artigo 100 da LC 80/1994 se refere à violação de prerrogativas do próprio defensor público-geral; por isso, não se aplicaria ao caso dos autos. Ele sustentou que é possível ao defensor atuante no caso concreto buscar judicialmente a proteção de suas prerrogativas.

A ministra Isabel Gallotti, relatora do caso, observou que o entendimento segundo o qual caberia exclusivamente ao defensor público-geral a defesa das funções institucionais do órgão, como a curadoria especial, está em desacordo com o artigo 3º da LC 80/1994, que estabelece a unidade, a indivisibilidade e a independência funcional como princípios institucionais da DP.

A magistrada explicou que, segundo a doutrina, em virtude da unidade da DP, os atos praticados pelo defensor público no exercício de suas funções não devem ser creditados ao agente, mas à própria instituição que ele integra, o que é reforçado pelo princípio da indivisibilidade.

“O artigo 100 da LC 80/1994, ao atribuir ao defensor público-geral a representação judicial da DP do estado, não exclui a legitimidade dos respectivos órgãos de execução – os defensores públicos atuantes perante os diversos juízos – para impetrar mandado de segurança na defesa da atuação institucional do órgão, conforme a doutrina”, apontou.

Não é irregular a assistência de partes contrárias pela DP

Isabel Gallotti comentou que, se a discussão fosse sobre ato de competência do próprio defensor público-geral, como a lotação de defensores nas comarcas, a legitimidade para representar judicialmente a instituição seria privativa dessa autoridade – o que, para ela, é diferente do caso analisado, que trata da defesa de prerrogativa institucional. “O subscritor do mandado de segurança atuou dentro da competência que lhe é legalmente atribuída”, afirmou.

Além disso, de acordo com a ministra, a circunstância de a parte autora ser assistida pela DP “não afasta a atribuição legal da instituição de, por meio de defensor distinto, exercer a curadoria de réu revel citado por edital”, não sendo rara a existência de pessoas carentes, que necessitam da assistência da DP, em ambos os polos do processo.

“Os princípios da unidade e da indivisibilidade que norteiam a instituição não tornam irregular sua atuação em defesa de partes antagônicas no processo, desde que se valendo de órgãos de execução diversos”, concluiu a relatora, ao dar provimento ao recurso para restabelecer a atuação da DP na curadoria do réu.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

No julgamento do Incidente de Assunção de Competência (IAC) 11, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) estabeleceu que, “interposto recurso contra a decisão de primeiro grau administrativo que confirma a pena de multa imposta pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), os juros e a multa moratórios fluirão a partir do fim do prazo de 30 dias para o pagamento do débito, contados da decisão administrativa definitiva, nos termos da Lei 9.847/1999“.

Segundo a relatora, ministra Regina Helena Costa, a imposição de penalidades pela ANP, em razão de infrações praticadas no mercado que ela regula, representa um avanço estatal sobre o patrimônio do particular e uma restrição ao exercício de direitos; em consequência, exige “respeito ao devido processo legal, instrumentalizado no regramento geral da Lei 9.784/1999 (processo administrativo federal) e, especificamente, no Decreto 2.953/1999“.

Início da fluência dos juros e da multa moratória

A ministra lembrou que a Lei 9.847/1999 – que cuida da fiscalização das atividades relativas ao abastecimento nacional de combustíveis – estabelece, de forma expressa, que os juros e a multa moratória incidentes sobre as multas administrativas da ANP devem fluir após o término dos 30 dias de que dispõe o autuado para pagar, contados da decisão administrativa definitiva (artigo 4º, parágrafo 1º).

Por outro lado, afirmou, a Lei 10.522/2001 – que disciplina o Cadastro Informativo de Créditos não Quitados do Setor Público Federal (Cadin) – adota como termo inicial, por remissão à Lei 9.430/1996, o dia seguinte ao vencimento da obrigação, no caso da multa, e o primeiro dia do mês subsequente ao vencimento, no caso dos juros (artigo 37-A).

“Enquanto o diploma de 1999 prescreve que o valor originário da multa sofrerá a incidência dos encargos somente após ultimada a instância administrativa, o diploma de 2001 permite a sua fluência em momento anterior, quando esgotado o trintídio para pagamento fixado na decisão de primeira instância confirmatória da autuação, vale dizer, quando ainda não finalizado o procedimento administrativo”, observou.

Prevalência do marco estabelecido por lei especial

De acordo com a relatora, a Lei 10.522/2001 trata genericamente da inscrição de créditos no Cadin, enquanto a Lei 9.847/1999 disciplina, de modo especial, o procedimento, a forma de pagamento e os consectários das multas aplicadas especificamente pela ANP. Por isso, embora seja mais nova, a lei de 2001 não afasta a norma específica.

No caso em que o autuado recorre da decisão administrativa de primeiro grau – conforme destacou a ministra –, o termo inicial dos encargos é deslocado do dia seguinte ao vencimento dos 30 dias fixados naquela decisão para depois do trânsito em julgado da decisão do recurso, ou seja, do pronunciamento definitivo.

Para Regina Helena Costa, trata-se de um marco “legitimamente eleito pela lei especial e previsto na norma regulamentadora”, das quais decorre “a prioridade do exercício de defesa pelo agente autuado, em detrimento da satisfação adiantada da sanção pecuniária”.

Nesse cenário, a ministra concluiu que o artigo 4º, parágrafo 1º, da Lei 9.847/1999, pela especialidade que ostenta, afasta a incidência dos artigos 37-A da Lei 10.522/2001 e 61, parágrafo 1º e 3º, da Lei 9.430/1996, relativamente ao termo inicial da incidência dos juros e da multa moratória sobre a penalidade imposta pela ANP.

A página da Pesquisa Pronta divulgou seis entendimentos do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Produzida pela Secretaria de Jurisprudência, a nova edição aborda, entre outros assuntos, o direito à remarcação de teste de avaliação física da candidata grávida, bem como o prazo prescricional para a propositura da ação pelo beneficiário em desfavor da seguradora.

O serviço tem o objetivo de divulgar as teses jurídicas do STJ mediante consulta, em tempo real, sobre determinados temas, organizados de acordo com o ramo do direito ou em categorias predefinidas (assuntos recentes, casos notórios e teses de recursos repetitivos).

Direito administrativo – Concurso público

Concurso público. Candidata grávida. Teste de avaliação e aptidão física em momento posterior.

“A jurisprudência desta Corte, acompanhando o entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, sob a sistemática da repercussão geral, RE 1.058.333/PR, preleciona pela remarcação do teste de aptidão física, como único meio possível de viabilizar que a candidata gestante à época do teste continue participando do certame, oportunizando o acesso mais isonômico a cargos públicos”.

AgInt no RMS n. 59.223/AP, rel. ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, julgado em 7/12/2020, DJe de 14/12/2020.

Direito civil – Contrato de seguro

Prazo prescricional. Terceiro beneficiário de contrato de seguro. 

“A jurisprudência desta Corte possui entendimento no sentido de que o prazo prescricional para a propositura da ação pelo beneficiário em desfavor da seguradora é de 10 (dez) anos”.

AgInt no REsp n. 1.959.286/SP, rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 21/2/2022, DJe de 23/2/2022.

Direito processual civil – Honorários advocatícios

Honorários recursais. Fixação no primeiro ato decisório. Novo arbitramento de valores em recursos derivados subsequentes.

“Fixados os honorários recursais no primeiro ato decisório, não cabe novo arbitramento nas demais decisões que derivarem de recursos subsequentes, apenas consectários do principal, tais como agravo interno e embargos de declaração”.

EDcl no AgInt no AREsp n. 1.952.887/SP, rel. ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 21/3/2022, DJe de 24/3/2022.

Direito processual civil – Prova

Inversão do ônus da prova. Comprovação mínima dos fatos alegados.

“‘A jurisprudência desta Corte Superior se posiciona no sentido de que a inversão do ônus da prova não dispensa a comprovação mínima, pela parte autora, dos fatos constitutivos do seu direito’ (AgInt no Resp 1.717.781/RO, Rel. Ministro Marco Aurélio Bellizze, Terceira Turma, julgado em 5/6/2018, DJe de 15/6/2018)”.

AgInt no AREsp n. 1.951.076/ES, rel. ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, julgado em 21/2/2022, DJe de 25/2/2022.

Direito processual penal – Prova

Meio de prova. Depoimentos prestados por policiais.

“Ademais, esta Corte tem entendimento firmado de que os depoimentos dos policiais responsáveis pela prisão em flagrante são meio idôneo e suficiente para a formação do édito condenatório, quando em harmonia com as demais provas dos autos, e colhidos sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, como ocorreu na hipótese”.

AgRg no AREsp n. 2.096.763/TO, rel. ministro Ribeiro Dantas, Quinta Turma, julgado em 14/6/2022, DJe de 20/6/2022.

Direito processual penal – Recursos

Admissibilidade recursal. Problemas no sistema de peticionamento eletrônico. Devolução do prazo para interposição do recurso.

“Nos termos da jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, nas hipóteses em que o sistema de peticionamento eletrônico fica indisponível por mais de 60 (sessenta) minutos no primeiro ou último dia do prazo recursal, o vencimento desse interstício é prorrogado para o primeiro dia útil seguinte”.

AgRg no AgRg no AREsp n. 1.948.451/MS, rel. ministra Laurita Vaz, Sexta Turma, julgado em 14/12/2021, DJe de 17/12/2021.

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Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), entidades fechadas de previdência privada não se equiparam a instituições financeiras; por isso, caso concedam empréstimos a seus beneficiários, não podem cobrar juros capitalizados – a não ser na periodicidade anual e desde que a capitalização tenha sido expressamente pactuada entre as partes após a entrada em vigor do Código Civil de 2002.

O colegiado, por maioria, firmou esse entendimento ao dar provimento ao recurso especial interposto por um beneficiário que, após tomar empréstimos com uma entidade de previdência complementar fechada, ajuizou ação para a revisão dos contratos, alegando que a entidade promoveu a capitalização de juros mensalmente, de maneira velada – o que não teria sido contratado.

O Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT) considerou que as entidades fechadas de previdência privada seriam equiparadas às instituições financeiras para celebrar contratos de mútuo com seus participantes, e, assim, seria admitida a incidência da capitalização mensal de juros quando pactuada.

No recurso submetido ao STJ, o autor da ação alegou que a Lei Complementar 109/2001, que distinguiu as espécies de entidades de previdência complementar aberta e fechada, derrogou o artigo 29 da Lei 8.177/1991 na parte em que igualava as entidades fechadas a instituições financeiras, de modo que essa equiparação foi mantida apenas para as abertas.

Entidades fechadas de previdência não integram o Sistema Financeiro Nacional

O ministro Marco Buzzi, cujo voto prevaleceu no julgamento, lembrou que a Súmula 563 do STJ dispõe que o Código de Defesa do Consumidor não é aplicável à relação entre a entidade fechada de previdência e seus participantes, pois seu patrimônio e seus rendimentos revertem-se integralmente no pagamento de benefícios, caracterizando-se pelo associativismo e pelo mutualismo – o que afasta o intuito lucrativo e a natureza comercial.

Por isso, afirmou, é “inviável equiparar as entidades fechadas de previdência complementar a instituições financeiras, pois, em virtude de não integrarem o Sistema Financeiro Nacional, têm a destinação precípua de dar proteção previdenciária aos seus participantes”.

Na avaliação do magistrado, eventuais empréstimos de dinheiro concedidos pela instituição aos beneficiários não podem ser admitidos nos moldes daqueles realizados pelos bancos, já que os valores alocados ao fundo comum, na verdade, pertencem aos participantes do plano, existindo explícito mecanismo de solidariedade, de modo que todo excedente do fundo de pensão é aproveitado em favor de seus integrantes.

Se contratada, capitalização de juros deve ser anual

Marco Buzzi afirmou que, nesses empréstimos, é ilegítima a cobrança de juros remuneratórios acima do limite legal, e que as entidades fechadas apenas estão autorizadas a capitalizar os juros na periodicidade anual, desde que o encargo tenha sido pactuado na vigência do Código Civil de 2002, pois são legalmente proibidas de ter fins lucrativos (artigo 31, parágrafo 1º, da LC 109/2001).

O magistrado explicou que, segundo o Código Civil, os juros remuneratórios, quando não convencionados entre as partes, deverão ser fixados nos termos da taxa que estiver em vigor para o pagamento de impostos da Fazenda Nacional (artigo 406), permitindo-se, contudo, a capitalização anual (artigo 591). Nesse sentido, observou, o artigo 161, parágrafo 1º, da Lei 5.172/1966 estabeleceu a taxa de 1% ao mês.

O ministro também ressaltou que, em razão de não serem instituições financeiras, essas entidades se submetem à Lei de Usura (Decreto 22.626/1933), a qual veda a estipulação de taxas de juros superiores ao dobro da taxa legal (artigo 1º), bem como a contagem de juros sobre juros (artigo 4º), salvo a anual, se expressamente pactuada.

No caso em julgamento, ele concluiu que, como as instâncias ordinárias não constataram a expressa contratação da capitalização de juros, é inviável a sua cobrança pela entidade de previdência fechada.

​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que, em ação civil pública ajuizada por associação privada, o réu pode ser condenado a arcar com as custas e os honorários advocatícios.

Para o colegiado, a tese fixada pela Corte Especial no EAREsp 962.250somente se aplica à parte ré vencida em ação civil pública quando seu autor for pessoa jurídica de direito público. Naquele julgamento, a corte estabeleceu que, “em razão da simetria, descabe a condenação em honorários advocatícios da parte requerida em ação civil pública, quando inexistente má-fé, de igual sorte como ocorre com a parte autora, por força da aplicação do artigo 18 da Lei 7.347/1985“.

Na origem, a Associação Estadual de Amparo ao Consumidor e ao Cidadão e Defesa Contra as Práticas Abusivas (Aprodec) ingressou com ação civil pública contra a PepsiCo do Brasil, com o objetivo de obrigá-la a incluir determinadas informações na embalagem de um produto.

Diferenciação entre associações de natureza pública e privada

Em primeira instância, a PepsiCo deixou de ser condenada ao pagamento das custas processuais e dos honorários com fundamento no acórdão da Corte Especial no EAREsp 962.250, decisão que foi reformada pelo Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), o qual consignou não ser aplicável a decisão do STJ às demandas propostas por associações e fundações privadas, de modo a não impedir o acesso à Justiça para a sociedade civil organizada.

Ao interpor recurso especial, a PepsiCo alegou que, se a associação de natureza privada não pode ser condenada ao pagamento de honorários, os advogados que a representam também não poderiam, pelo princípio da simetria, ser beneficiados com a verba sucumbencial.

A empresa sustentou que, na legislação de regência, não há diferenciação quanto à legitimidade entre a associação privada e a associação pública, até mesmo porque, independentemente de sua natureza, a autora deve revestir finalidades institucionais de interesse público.

No mundo contemporâneo, marcado pelas rotinas agitadas e pelos compromissos urgentes, pensar em tempo significa muito mais lidar com a sua escassez do que com a sua abundância. Se tomado como um tipo de recurso, o tempo é caro e finito; se concebido como uma espécie de direito, o tempo é componente do próprio direito à vida, já que é nele que concretizamos a nossa cada vez mais atarefada existência. Se é questão de direito, o tempo também é questão de justiça.

O tempo é precificado – integra a remuneração da jornada de trabalho, o pagamento do período de aula – e é benefício – o tempo de férias, o tempo livre com a família. Exatamente por ser limitado e valioso, uma das principais frustações cotidianas é a perda de tempo.

No Brasil, um tipo específico de ser humano, conhecido como consumidor, tem sido constantemente alvo dessa subtração de tempo, especialmente em razão das longas jornadas a que costuma ser submetido ao se deparar com defeito em um produto ou serviço. Embora o Código de Defesa do Consumidor (CDC) tenha estabelecido mecanismos em favor daqueles que são prejudicados por falhas dos fornecedores, ainda são corriqueiros os relatos de intermináveis ligações para resolver um problema com uma empresa, ou de demoras injustificáveis para atendimento em uma agência bancária.

A constatação do tempo do consumidor como recurso produtivo e da conduta abusiva do fornecedor ao não empregar meios para resolver, em tempo razoável, os problemas originados pelas relações de consumo é que motivou a chamada teoria do desvio produtivo. 

Precursor do estudo do tema no Brasil, o jurista Marcos Dessaune descreve, no artigo “Teoria Aprofundada do Desvio Produtivo do Consumidor: um panorama” (disponível em edição da revista Direito em Movimento, da Escola da Magistratura do Rio de Janeiro), que o desvio produtivo é o evento danoso que se consuma quando o consumidor, sentindo-se prejudicado em razão de falha em produto ou serviço, gasta o seu tempo de vida – um tipo de recurso produtivo – e se desvia de suas atividades cotidianas para resolver determinado problema.

Segundo o doutrinador, a atitude do fornecedor ao se esquivar de sua responsabilidade pelo problema, causando diretamente o desvio produtivo do consumidor, é que gera a relação de causalidade existente entre a prática abusiva e o dano gerado pela perda do tempo útil.

O tempo perdido e a substituição de produto defeituoso

Apesar de estar, de alguma forma, presente na jurisprudência histórica do Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre o direito do consumidor, a teoria do desvio produtivo teve aplicação expressa a partir de meados de 2018. Os casos analisados envolveram, em especial, a possibilidade de condenação dos fornecedores por danos morais coletivos, e tiveram como relatora a ministra Nancy Andrighi.

No âmbito dos julgamentos colegiados, um dos primeiros precedentes foi o REsp 1.634.851, no qual a Terceira Turma analisou ação civil pública em que o Ministério Público do Rio de Janeiro buscava que a empresa Via Varejo sanasse vícios em produtos comercializados por ela no prazo máximo de 30 dias, sob pena da substituição do produto ou do abatimento proporcional do preço.

Para a Via Varejo, nos termos do artigo 18 do CDC, não seria possível concluir pela existência de responsabilidade solidária do comerciante pelo saneamento do vício do produto antes do prazo de 30 dias.

Relatora do recurso, a ministra Nancy Andrighi apontou que o consumidor, não raramente, trava verdadeira batalha para ter atendida sua legítima expectativa de obter o produto adequado ao uso, em sua quantidade e qualidade.

Essa “peregrinação” do consumidor, afirmou a magistrada, começa pela tentativa – muitas vezes frustrada – de localizar a assistência técnica mais próxima de sua residência ou de seu local de trabalho, envolvendo também o esforço de agendar uma visita técnica da autorizada.

Para a ministra, essas tarefas “têm, frequentemente, exigido bastante tempo do consumidor, que se vê obrigado a aguardar o atendimento no período da manhã ou da tarde, quando não por todo o horário comercial”.

Nesse sentido, a relatora apontou que o fornecedor, ao desenvolver atividade econômica em seu próprio benefício, tem o dever de participar ativamente do processo de reparo do bem, intermediando a relação entre cliente e fabricante e diminuindo a perda de tempo útil do consumidor. 

O tempo perdido no atendimento precário de agências bancárias

A teoria do desvio produtivo voltou a ser aplicada no REsp 1.737.412, originada de ação civil pública ajuizada pela Defensoria Pública de Sergipe contra o Banco de Sergipe, para que a instituição financeira cumprisse, entre outras medidas, as regras de tempo máximo para atendimento presencial nas agências.

Em primeiro grau, o juiz condenou o banco a disponibilizar pessoal suficiente para o atendimento nos caixas, a fim de que fosse possível respeitar o tempo máximo na fila de atendimento. O magistrado também condenou a instituição ao pagamento de danos morais coletivos de R$ 200 mil, mas o Tribunal de Justiça de Sergipe afastou a compensação pelos prejuízos extrapatrimoniais.

Nancy Andrighi explicou que o dano moral coletivo se diferencia do dano individual – que busca, primordialmente, a restauração ao status quo anterior ao prejuízo da vítima – e tem o objetivo de sancionar o responsável pela lesão, inibindo assim a prática ofensiva. Como consequência, apontou, ocorre a redistribuição do lucro obtido de forma ilegítima por aquele que ofendeu a sociedade.

Segundo a ministra, um dos principais propósitos do sistema capitalista – concebido como um sistema de produção de bens e de prestação de serviços baseado na eficiência e na especialização – é gerar o máximo de aproveitamento possível dos recursos produtivos disponíveis.

Citando a doutrina de Marcos Dessaune, Nancy Andrighi comentou que, na sociedade pós-industrial, o consumo de um produto ou serviço de qualidade, produzido por um fornecedor especializado na atividade, tem a utilidade subjacente de tornar disponíveis o tempo e as competências que o consumidor precisaria para produzi-lo para o seu próprio uso.

Dessa análise, de acordo com a relatora, extrai-se uma espécie de função social da atividade dos fornecedores, relacionada à otimização e ao máximo aproveitamento dos recursos produtivos disponíveis na sociedade – entre eles, o tempo.

O tempo perdido e a otimização do lucro empresarial

Nancy Andrighi reforçou que a proteção à intolerável e injusta perda do tempo útil do consumidor ocorre pelo desrespeito voluntário das garantias legais, com o nítido intuito de otimizar o lucro em prejuízo da qualidade dos serviços – conduta que justifica a condenação por danos morais coletivos.

No caso dos autos, a relatora lembrou que a legislação municipal estabelecia como constrangimento do consumidor tempo de espera superior a 15 minutos em dias normais e 30 minutos em dias especiais, mas o banco impunha aos clientes tempo de espera que ultrapassava duas horas.

“A instituição financeira recorrida optou por não adequar seu serviço a esses padrões de qualidade, impondo à sociedade o desperdício de tempo útil e acarretando violação ao interesse social de máximo aproveitamento dos recursos produtivos”, concluiu a ministra ao restabelecer a condenação por danos morais coletivos.

O tempo perdido em longas esperas no caixa eletrônico

Também com base na teoria do desvio produtivo, a Terceira Turma manteve a condenação de dois bancos ao pagamento de danos morais coletivos de R$ 500 mil cada, em razão de falhas em terminais eletrônicos por causa do desabastecimento dos caixas. Na ação, o Ministério Público do Tocantins relatou período de espera superior a 40 minutos para que os consumidores conseguissem utilizar os terminais.

“É imperioso concluir que a inadequada prestação de serviços bancários, caracterizada pela reiterada existência de caixas eletrônicos inoperantes, sobretudo por falta de numerário, e pelo consequente excesso de espera em filas por tempo superior ao estabelecido em legislação municipal, é apta a caracterizar danos morais coletivos”, destacou a ministra Nancy Andrighi.

A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou questão de ordem e reafirmou a tese fixada no Tema 692, com acréscimo redacional para ajuste à nova legislação, adotando a seguinte redação: “A reforma da decisão que antecipa os efeitos da tutela final obriga o autor da ação a devolver os valores dos benefícios previdenciários ou assistenciais recebidos, o que pode ser feito por meio de desconto em valor que não exceda 30% da importância de eventual benefício que ainda lhe estiver sendo pago”.

A questão de ordem foi proposta pelo ministro Og Fernandes, relator do tema, em razão da variedade de situações que ensejaram dúvidas quanto à persistência da orientação firmada pela tese repetitiva, bem como à jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (STF), que não apreciou o tema em repercussão geral ou controle concentrado de constitucionalidade.

Para o colegiado, as alterações legislativas trazidas pela Medida Provisória 871/2019 e, posteriormente, pela Lei 13.846/2019 no artigo 115, II, da Lei 8.213/1991 – que regulamenta a matéria no direito previdenciário – mantiveram a posição adotada pelo STJ, não havendo necessidade de alteração de entendimento.

Reversibilidade dos efeitos da decisão judicial é pressuposto da tutela de urgência

Segundo o ministro relator, sempre se considerou como pressuposto básico do instituto da tutela de urgência a reversibilidade dos efeitos da decisão judicial, consoante o artigo 273, parágrafo 2º, do CPC/1973 (correspondente ao artigo 300, parágrafo 3º, do CPC/2015).

No entanto, o magistrado lembrou que surgiram dúvidas no que tange à aplicação de tal regulamentação no âmbito previdenciário, especificamente em razão da redação original do artigo 130 da Lei 8.213/1991.

O ministro ressaltou que, com a alteração legislativa implementada pela Lei 9.528/1997 – por meio da qual passou a valer a regra geral do CPC, na ausência de norma especial em sentido contrário no âmbito previdenciário –, começou a amadurecer a posição no sentido da necessidade de devolução dos valores recebidos em caso de revogação da tutela antecipada, tendo o STJ, em 2014, firmado o entendimento repetitivo no Tema 692.

Entendimento mantido por alterações legislativas

Og Fernandes destacou que a partir da MP 871/2019 e, posteriormente, da Lei 13.846/2019, houve reformulação na legislação previdenciária. O artigo 115, II, da Lei 8.213/1991 passou a prever o desconto do benefício quando houver “pagamento administrativo ou judicial de benefício previdenciário ou assistencial indevido,ou além do devido, inclusive na hipótese de cessação do benefício pela revogação de decisão judicial, em valor que não exceda 30% da sua importância”.

“Se o STJ – quando a legislação era pouco clara e deixava margem a dúvidas – já tinha firmado o entendimento vinculante no Tema Repetitivo 692, não é agora que deve alterar sua jurisprudência, justamente quando a posição da Corte foi sufragada expressamente pelo legislador reformador ao regulamentar a matéria”, opinou.

Revogação da tutela por mudança de jurisprudência deve ter efeitos modulados

No entanto, há situação diferente quando a tutela de urgência é revogada em razão de mudança superveniente da jurisprudência então dominante. “Nesses casos, a superação do precedente deverá ser acompanhada da indispensável modulação dos efeitos, a juízo do Tribunal que está promovendo a alteração jurisprudencial”, ressalvou o ministro em seu voto, destacando a necessidade, nestes casos, de modulação dos efeitos da alteração no interesse social e no da segurança jurídica.

“Dessa forma, uma eventual guinada jurisprudencial não resultará, em princípio, na devolução de valores recebidos por longo prazo devido à cassação de tutela de urgência concedida com base em jurisprudência dominante à época em que deferida, bastando que o tribunal, ao realizar a superação, determine a modulação dos efeitos”, afirmou.

Matéria infraconstitucional de competência do STJ

Ainda conforme o voto do relator, o fato de o STF ter alguns precedentes contrários ao entendimento do Tema 692 não invalida o repetitivo, uma vez que esse posicionamento da Suprema Corte foi adotado em algumas ações originárias (na maioria, mandados de segurança). “Porém, não o faz com caráter de guardião da Constituição Federal, mas sim na análise concreta das ações originárias. A maioria dos precedentes do STF não diz respeito a lides previdenciárias e, além disso, são todos anteriores às alterações inseridas no artigo 115, II, da Lei 8.213/1991”, esclareceu.

Relacionados à prolongada omissão no exercício de um direito, os institutos da supressio e da surrectio podem ser definidos como duas faces da mesma moeda: ao mesmo tempo em que, após o decurso de prazo extenso, uma pessoa perde determinado direito por não exercê-lo (supressio), surge o direito correspondente, pelo exercício reiterado, para a outra parte (surrectio).  

Como disse o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Luis Felipe Salomão no julgamento do REsp 1.338.432, em 2017, na Quarta Turma, “a supressio inibe o exercício de um direito, até então reconhecido, pelo seu não exercício. Por outro lado, e em direção oposta à supressio, mas com ela intimamente ligada, tem-se a teoria da surrectio, cujo desdobramento é a aquisição de um direito pelo decurso do tempo, pela expectativa legitimamente despertada por ação ou comportamento”. 

Para a professora e advogada Judith Martins-Costa, citada pelo ministro, a supressio “indica o encobrimento de uma pretensão, coibindo-se o exercício do direito em razão do seu não exercício, por determinado período de tempo, com a consequente criação da legítima expectativa, à contraparte, de que o mesmo não seria utilizado”.

Distribuidora ficou seis anos sem exigir obrigação contratual

No caso analisado pela Quarta Turma em 2017, uma distribuidora de combustível ajuizou ação contra um posto para cobrar multa em razão do descumprimento do contrato pactuado quase seis anos antes. Segundo alegou, ela fez os investimentos acordados, mas o posto não teria cumprido a obrigação de comprar, com exclusividade, quantidades mínimas mensais de derivados de petróleo e de álcool hidratado.

De acordo com Salomão, relator, o longo transcurso de tempo, sem a cobrança da obrigação de compra de quantidades mínimas mensais de combustível, suprimiu, de um lado, a faculdade jurídica da distribuidora (promitente vendedora) de exigir a prestação; de outro, criou uma situação de vantagem para o posto varejista (promissário comprador), cujo inadimplemento não poderá implicar a incidência da cláusula penal compensatória contratada.

“A inércia da autora em exigir o adimplemento da obrigação pactuada, somada ao longo decurso do tempo (quase seis anos), configura, a meu ver, as figuras da supressio e da surrectio” – afirmou o ministro ao julgar improcedente o pedido de cobrança da distribuidora.

Inércia do locador dispensa loja dos reajustes retroativos, mas não dos futuros

Em 2019, no julgamento do REsp 1.803.278, a Terceira Turma aplicou o instituto da supressio ao caso de uma empresa, locadora de imóvel para uma loja, que pretendia exigir os valores correspondentes a reajustes que ela não cobrou durante cinco anos de aluguel. A locatária sustentou que a inércia da locadora levou à incidência do instituto, tanto em relação aos retroativos quanto em relação aos valores posteriores à notificação extrajudicial, mas essa segunda parte de sua tese não foi aceita pelo STJ. ​​​​​​​​​​​​

O relator do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que, para a configuração da supressio, são necessários três requisitos: a) inércia do titular do direito subjetivo; b) decurso de tempo capaz de gerar a expectativa de que esse direito não mais seria exercido; e c) deslealdade em decorrência de seu exercício posterior, com reflexos no equilíbrio da relação contratual.

Na avaliação do magistrado, a empresa locadora não gerou no locatário a expectativa de que não haveria a atualização do valor do aluguel durante todo o período de 20 anos do contrato, mas deixou de cobrar os reajustes ao longo dos cinco anos iniciais, o que apenas sugeriria que o valor correspondente a esse período não seria mais cobrado.

Para o relator, não é razoável supor que a locatária tivesse criado a expectativa de que a locadora não fosse mais exigir o reajuste dos aluguéis. “Assim, o decurso do tempo não foi capaz de gerar a confiança de que o direito não seria mais exercitado em momento algum do contrato de locação”, afirmou Villas Bôas Cueva.

Aplicação da supressio em direitos autorais

No julgamento do REsp 1.643.203, a Terceira Turma aplicou o instituto da supressio para negar indenização de direitos autorais após mais de 40 anos de utilização da obra sem cobrança. Os ministros negaram o pedido de um compositor para que a Rádio Globo e a Globo Comunicação e Participações fossem condenadas a pagar indenização pelo uso de vinhetas como “Rádio Globooo” e “Fluminenseee”, criadas por ele em 1969 e veiculadas permanentemente na programação da emissora desde então.

Para o ministro Marco Aurélio Bellizze, relator, o fato de os direitos autorais serem vitalícios não é suficiente para afastar a incidência da supressio, “impondo-se, contudo, uma análise da boa-fé objetiva compatível com os fundamentos essenciais e principiológicos dos direitos autorais”.

Segundo o ministro, as vinhetas foram usadas como marca sonora da Rádio Globo desde a sua criação, com conhecimento e consentimento do autor. Essa relação amistosa de utilização da obra protegida, disse, gerou na emissora a expectativa legítima de que poderia aproveitar os jingles na programação – até que, décadas depois, o compositor modificasse sua postura de forma abrupta.

“O que se verifica é que a parte utente agiu sempre de forma condizente com a boa-fé objetiva; seus atos externados e indicados pelo próprio recorrente evidenciam que ela acreditava utilizar a obra de forma gratuita, lícita e contratualmente consentida, tanto que reiteradamente reconhecia a autoria das vinhetas publicamente”, concluiu o ministro.

Supressio é uma forma de responsabilidade pela confiança

Por verificar a caracterização da supressio, a Terceira Turma, no julgamento do  REsp 1.879.503, manteve um ex-empregado – desligado há mais de dez anos – e sua esposa em plano de saúde originalmente contratado pela empresa em que ele trabalhava. Embora seja de dois anos o tempo máximo de permanência do empregado demitido no plano coletivo – como previsto no artigo 30, parágrafo 1º, da Lei 9.656/1998 –, o ex-empregador manteve a assistência para o casal por mais de uma década, tendo os beneficiários assumido o pagamento integral das contribuições.

Para o colegiado, o longo tempo de permanência no plano despertou nos beneficiários a confiança de que não perderiam a assistência à saúde, de modo que a sua exclusão, passada uma década do desligamento profissional e quando eles já estavam em idade avançada, violou o princípio da boa-fé objetiva.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que, segundo o princípio da responsabilidade pela confiança – uma das vertentes da boa-fé objetiva –, aquele que origina a confiança de alguém deve responder, em certas circunstâncias, pelos danos causados.

A magistrada citou como exemplo de responsabilidade pela confiança a supressio – entendida como um “não exercício abusivo do direito”–, a qual indica a possibilidade de se considerar suprimida determinada obrigação contratual na hipótese em que o credor, por não a exigir, fizer surgir no devedor a legítima expectativa de que essa supressão se prorrogará no tempo. ​​​​​​​​​​​​

Pagamento espontâneo de pensão alimentícia não configura surrectio

Contudo, em julgado de 2019 (sob segredo de Justiça), a Terceira Turma firmou o entendimento de que a obrigação alimentar extinta, mas que continua a ser paga por mera liberalidade do alimentante, não pode ser mantida com fundamento no instituto da surrectio.

No caso em análise, as partes firmaram em 2001 acordo pelo qual o ex-marido se comprometeu a pagar plano de saúde e pensão alimentícia à ex-mulher pelo período de 24 meses. Expirado o prazo – e negado judicialmente o pedido para que a pensão fosse prorrogada por mais 24 meses –, o ex-marido, por conta própria, continuou arcando com a verba alimentícia por cerca de 15 anos. Em 2017, ele decidiu suspender o pagamento.

A ex-mulher ajuizou ação contra o corte, a qual foi acolhida pelo tribunal de segunda instância, que entendeu que o ex-marido teria criado uma expectativa de direito digna de proteção jurídica, em virtude da surrectio.

No voto acompanhado pela maioria da Terceira Turma, o ministro Villas Bôas Cueva afirmou que o ex-marido, por espontânea vontade, cooperou com a ex-mulher pelo período desejado, sem a existência de uma obrigação legal. Para o ministro, não houve ilicitude na suspensão do pagamento da pensão, já que não havia mais relação obrigacional entre as partes.

“A boa intenção do recorrente perante a ex-mulher não pode ser interpretada a seu desfavor. Há que prevalecer a autonomia da vontade ante a espontânea solidariedade em análise, cujos motivos são de ordem pessoal e íntima, e, portanto, refogem do papel do Judiciário, que deve se imiscuir sempre com cautela, intervindo o mínimo possível na seara familiar. Assim, ausente o mencionado exercício anormal ou irregular de direito”, declarou.

Na sua avaliação, não houve ilicitude na conduta do ex-marido, por inexistir previsão de pagamento eterno dos alimentos e, especialmente, porque ausente a relação obrigacional.

Redução da jornada de trabalho de servidor público não se consolida no tempo

Em 2020, a Segunda Turma negou provimento ao RMS 62.942, no qual um sindicato de Mato Grosso do Sul pedia a aplicação dos institutos da surrectio e da supressio contra o decreto do governador que alterou a jornada de trabalho dos servidores estaduais. A norma determinou o retorno das oito horas diárias, após mais de 15 anos de jornada de seis horas.

Segundo o sindicato, surgiu para a categoria o direito à jornada reduzida de 30 horas semanais, por conta do prazo transcorrido desde o decreto que instituiu a redução temporária – por aplicação da surrectio –, ao mesmo tempo em que a administração perdeu o direito de implementar alterações no regime jurídico no que diz respeito à redução da jornada – aplicação da supressio.

Na avaliação do relator, ministro Francisco Falcão, no entanto, os dois institutos não podem ser invocados para consolidar uma situação temporária de redução de jornada, fazendo surgir o suposto direito a um cargo com contornos diversos daquele para o qual o servidor prestou concurso público. Para o ministro, não se pode “legitimar a perda do direito da administração de rever os seus próprios atos, mormente quando se trata de mero retorno às características do cargo público previsto em lei”.