A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que, ao analisar pedido de nulidade do procedimento arbitral, reconheceu a ocorrência de decadência porque a impugnação, baseada exclusivamente no artigo 32, VIII, da Lei de Arbitragem, foi apresentada após o decurso do prazo de 90 dias previsto no artigo 33 da mesma lei. Além disso, o TJSP ressaltou que a matéria apontada não está prevista no artigo 525, parágrafo 1º, do Código de Processo Civil.

A controvérsia analisada teve origem em ação de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral na qual se alegou a nulidade do processo por cerceamento de defesa, em razão do indeferimento da produção de prova pericial e deficiência na instrução da ação. 

Ao pedir a reforma do acórdão do TJSP, o autor da impugnação defendeu que o prazo decadencial de 90 dias estabelecido pelo artigo 33 da Lei 9.307/1996 deveria ser observado somente para a ação declaratória de nulidade autônoma. Argumentou, ainda, que o parágrafo 3º do mesmo artigo autoriza que a nulidade da sentença arbitral seja suscitada na impugnação ao cumprimento de sentença – sem que houvesse, nesse caso, a incidência da decadência.

Duas vias

A relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, explicou que a declaração de nulidade da sentença arbitral pode ser pleiteada, judicialmente, por duas vias: por meio de ação declaratória de nulidade de sentença arbitral (artigo 33, parágrafo 1º, da Lei 9.307/1996) ou mediante impugnação ao cumprimento de sentença arbitral (artigo 33, parágrafo 3º, da Lei 9.307/1996).

Segundo Nancy Andrighi, se a invalidação for requerida por meio de ação própria, há a imposição de prazo decadencial. “Esse prazo, nos termos do artigo 33, parágrafo 1º, da Lei de Arbitragem, é de 90 dias. Sua aplicação, reitera-se, é restrita ao direito de obter a declaração de nulidade devido à ocorrência de qualquer dos vícios taxativamente elencados no artigo 32 da referida norma”, acrescentou.

Dessa forma, observou a magistrada, embora a nulidade possa ser suscitada em sede de impugnação ao cumprimento de sentença arbitral, se a execução for ajuizada após o decurso do prazo decadencial da ação de nulidade, a defesa da parte executada fica limitada às matérias especificadas pelo artigo 525, parágrafo 1º, do CPC, sendo vedada a invocação de nulidade da sentença com base nas matérias definidas no artigo 32 da Lei 9.307/1996.

Cerceamento de defesa

No caso julgado, segundo a relatora, a ação de cumprimento de sentença arbitral foi ajuizada após o decurso do prazo decadencial de 90 dias, fixado para o ajuizamento da ação de nulidade de sentença arbitral.

Além disso – destacou a ministra Nancy Andrighi –, a recorrente suscitou a nulidade da sentença arbitral em razão de suposto cerceamento de defesa, tendo fundamentado o seu pedido no artigo 32, VIII, da Lei 9.307/1996.

Entretanto, ao manter o acórdão do TJSP, a magistrada destacou que o cerceamento de defesa não é uma das hipóteses previstas no parágrafo 1º do artigo 525 do CPC/2015, o que impede o reconhecimento da validade da impugnação à sentença arbitral.

Leia o acórdão no REsp 1.900.136.

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, o acordo extrajudicial não impede o ajuizamento de ação de alimentos quando os valores pagos deixam de atender às necessidades da criança ou do adolescente. O colegiado entendeu que é direito indisponível do filho ver analisada a possibilidade de receber alimentos de forma proporcional à sua necessidade e prestados de acordo com as possibilidades reais do seu genitor, de modo a atender o seu melhor interesse – o que autoriza o arrependimento dos termos do acordo extrajudicial.

No caso em questão, o colegiado deu provimento ao recurso especial interposto por uma mãe após o Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG rejeitar a sua alegação de que o acordo extrajudicial firmado anteriormente não seria interessante para a criança. A corte estadual considerou que a questão dos alimentos havia sido dirimida de forma consensual no Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania – CEJUSC, e que não haveria interesse processual capaz de justificar a ação.

O relator, ministro Moura Ribeiro, explicou que o interesse processual está na necessidade que a parte tem de buscar o Poder Judiciário e se valer do processo para reparar algum prejuízo ou afastar ameaça a algum direito. Destacou também que os argumentos da petição inicial devem possibilitar ao magistrado deduzir, a partir de um exame abstrato, que a parte pode ter interesse na relação jurídica, dispensando-se, em tal momento, qualquer apresentação de prova.

Conforme a teoria da asserção, adotada pela jurisprudência do STJ, as condições da ação, entre elas o interesse processual, devem ser avaliadas de forma abstrata, exclusivamente à luz da narrativa constante da petição inicial, “sem o aprofundamento na matéria de mérito e dispensando qualquer atividade probatória”.

Em seu voto, o magistrado ressaltou que, diferentemente da conclusão do TJMG, o arrependimento e a insatisfação com os termos do acordo extrajudicial – por não atender ao interesse da criança – caracterizaram, em tese, potencial interesse processual. “Ademais, o alegado prejuízo se confunde com o próprio mérito da ação, que se mostra adequada para a pretensão buscada.”

Princípio do melhor interesse

Segundo o ministro, o interesse em análise é o da criança, que, por ocasião do ajuizamento da ação de alimentos, tinha apenas cinco anos. “Por se tratar de alimentos insuficientes para a sua sobrevivência – logo, direito indisponível –, a questão deveria ser examinada com cuidado e sob a ótica dos princípios do melhor interesse, da proteção integral do menor e, principalmente, da dignidade da pessoa humana.”

Para Moura Ribeiro, a questão em análise envolve não somente o interesse patrimonial, mas também a dignidade da criança, que é sujeito de direitos e não objeto, devendo receber alimentos suficientes para o atendimento das suas necessidades básicas, que são presumidas, considerando a sua pouca idade. O relator pontuou ainda que não há necessidade de se aguardar alteração do binômio necessidade/possibilidade – previsto no artigo 1.694 do Código Civil – para a promoção de ação de alimentos ou até mesmo ação revisional, uma vez que o acordo no CEJUSC não faz coisa julgada material.

O magistrado lembrou que o argumento primordial trazido na ação de alimentos é o de que o acordo foi prejudicial aos interesses da menor (insuficiência da verba alimentar) – questão de mérito que não poderia ter sido extinta de forma precoce. Apontou, ainda, a necessidade da participação do Ministério Público nos acordos extrajudiciais de alimentos, para evitar situações desvantajosas para o infante.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)

Diferentemente do que ocorre com a guarda compartilhada de filhos, a adoção da curatela compartilhada de pessoa interditada não é obrigatória para o juízo, mesmo que haja pedido dos interessados, já que o artigo 1.775-A do Código Civil estabelece que a Justiça poderá – e não que deverá – fixar o compartilhamento.

Para decidir sobre a concessão da curatela compartilhada, o juízo deve levar em conta algumas circunstâncias, como o interesse e a aptidão dos candidatos a exercê-la e a constatação de que a medida é a que melhor resguarda os interesses do curatelado.

O entendimento foi aplicado pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT) que, com base em laudo pericial, confirmou sentença de interdição e nomeou a mãe do interditado como curadora definitiva.

Por meio de recurso especial, o interditado – cujo advogado é o próprio pai, seu curador provisório – alegou que seria obrigatório que ele fosse ouvido para se manifestar sobre a adoção da curatela compartilhada. Também defendeu a reforma do acórdão do TJMT, entre outros motivos porque o Ministério Público não participou da audiência de interrogatório e não houve a intimação pessoal do curador provisório.

Ausência do MP em atos processuais

A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso, explicou que, de acordo com o artigo 279 do Código de Processo Civil de 2015, a causa de nulidade não é a falta de participação do Ministério Público em atos processuais, mas a inexistência de intimação. No caso dos autos, porém, a relatora lembrou que o MP foi devidamente intimado.

“Ademais, não se extrai do artigo 751 do CPC/2015 (correspondente ao artigo 1.181 do CPC/1973) qualquer obrigatoriedade da presença do representante do Ministério Público na audiência de instrução ou entrevista”, completou a magistrada.

A relatora apontou que, se é possível ao MP se colocar contra o interesse do autor da ação de interdição, ele também pode, se for intimado, deixar de se manifestar ou intervir na prática de ato processual que considerar dispensável.

Intimação pessoal do curador provisório

Em relação à intimação pessoal do curador provisório, Nancy Andrighi citou jurisprudência no sentido de que a desobediência a formalidades legais só invalida o ato quando sua finalidade estiver comprometida pelo vício, trazendo prejuízo às partes.

No caso em julgamento, entretanto, a ministra ressaltou que o curador especial provisório é advogado habilitado nos autos, e recebeu a intimação sobre a data da audiência de instrução por meio do Diário de Justiça eletrônico. Por esse meio, inclusive, o curador foi intimado de atos processuais anteriores, mas não questionou o procedimento.

“Essa espécie de subterfúgio não encontra amparo no sistema jurídico processual em vigor, por representar indisfarçável violação ao princípio da boa-fé processual, que impõe aos sujeitos processuais o dever de atuar com lealdade no decorrer do processo”, destacou.

Regras da guarda compartilhada

Em seu voto, Nancy Andrighi também afirmou que, de acordo com o princípio do melhor interesse, o incapaz deve ter seus direitos tratados com prioridade pelo Estado, pela sociedade e pela família, tanto na elaboração quanto na aplicação das normas jurídicas.

Nesse sentido, explicou, o compartilhamento foi desenvolvido pela jurisprudência para facilitar o desempenho da curatela, ao atribuí-la simultaneamente a mais de um curador.

Embora a doutrina defenda que, na ausência de detalhamento legal sobre a curatela compartilhada, poderiam ser-lhe aplicadas as normas relativas à guarda compartilhada, a ministra lembrou que a redação do artigo 1.584 do Código Civil prevê que o regime compartilhado deve ser aplicado, obrigatoriamente, para filhos, salvo se um dos genitores declarar ao magistrado que não deseja a guarda do menor.

Ao contrário do que ocorre na guarda compartilhada, Nancy Andrighi apontou que o dispositivo legal que consagra o instituto da curatela compartilhada não impõe, obrigatória e expressamente, a sua adoção.

“Pelo contrário. A redação do novel artigo 1.775-A do CC/2002 é hialina ao estatuir que, na nomeação de curador, o juiz ‘poderá’ estabelecer curatela compartilhada, não havendo, portanto, peremptoriedade, mas sim facultatividade”, ressaltou.

Ao manter o acórdão o TJMT, a relatora ainda lembrou que a curatela compartilhada não chegou a ser formalmente pleiteada pelo curador especial durante a tramitação do processo em primeiro grau, só sendo reivindicada quando o processo já estava em fase de apelação.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Jorge Mussi, no exercício da presidência, negou pedido de liminar em habeas corpus impetrado pela defesa de Sandro Silva Rabelo para que seja reconhecida a prescrição de falta grave e alterada a data-base para cômputo da progressão de regime penal.

Apontado como um dos líderes da organização criminosa Comando Vermelho em Mato Grosso, ele cumpre pena unificada de 205 anos e nove meses de reclusão em penitenciária federal.

Segundo os autos, em março de 2017, durante um banho de sol no presídio, o preso teria desacatado agentes penitenciários. Foi instaurado processo administrativo disciplinar, que concluiu pela ocorrência de falta de natureza grave, consistente em não obedecer aos agentes ou desrespeitá-los.

O juízo de primeiro grau reconheceu a falta grave no curso da execução penal. O Tribunal de Justiça de Mato Grosso (TJMT), ao julgar recurso da defesa, afastou a alegação de prescrição e confirmou a decisão.

No habeas corpus impetrado no STJ, além de sustentar a prescrição da penalidade, a defesa de Sandro Silva Rabelo apontou que o juízo da execução penal não teria homologado o processo administrativo. Pediu, liminarmente e no mérito, que seja cassado o acórdão do TJMT, desconstituída a decisão de primeiro grau, reconhecida a prescrição da falta grave e retificado o cálculo de liquidação de penas.

Prescrição afastada pela corte d​​e origem

Para o ministro Jorge Mussi, não se verificou a ocorrência de flagrante ilegalidade que justifique o deferimento do pedido de liminar em regime de plantão.

Em sua decisão, Mussi mencionou trechos do acórdão do TJMT que entendeu não ter havido a prescrição da falta disciplinar cometida pelo preso, por não ter transcorrido o prazo de três anos entre a data dos fatos (18 de março de 2017) e a manifestação judicial (23 de janeiro de 2019).

“Com efeito, a sustentada ocorrência da prescrição restou devidamente afastada pela corte estadual”, ressaltou.

O TJMT também registrou que o juiz da execução foi comunicado do processo disciplinar e, na decisão de janeiro de 2019, mesmo não tendo falado em “homologação”, reconheceu a condenação administrativa. A corte local afirmou ainda que, depois disso, a defesa se manifestou várias vezes, mas em nenhum momento questionou a falta grave nem a legalidade do procedimento disciplinar.

Para Jorge Mussi, como o pedido de liminar se confunde com o mérito do habeas corpus, a análise do caso deve ficar para o colegiado competente – a Quinta Turma –, que poderá examinar com mais profundidade as alegações da defesa. O relator será o ministro João Otávio de Noronha.

Ao indeferir o pedido de liminar, o ministro abriu vista para parecer do Ministério Público Federal e determinou a solicitação de mais informações sobre o caso ao TJMT.

Leia a decisão no HC 682.334.​​

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):HC 682334

Para a Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, a isenção do Imposto de Renda instituída pelo Decreto-Lei 1.510/1976 não se aplica ao lucro obtido com a venda de participação societária herdada após a revogação do benefício tributário. Em decisão unânime, o colegiado confirmou acórdão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região – TRF3, segundo o qual o benefício é de caráter personalíssimo e não se transfere aos herdeiros.

A isenção do imposto de renda sobre o lucro na venda de cotas societárias ou ações ocorrida, pelo menos, cinco anos após a aquisição, era garantida pelo artigo 4°, letra d, do Decreto-lei 1.510/1976. O benefício, porém, foi revogado pela Lei 7.713/1988.

O recurso ao STJ foi apresentado por uma contribuinte cujo pai havia comprado ações de algumas empresas anos antes da Lei 7.713/1988. Conforme os autos, o homem morreu após a revogação do benefício fiscal e deixou as ações como herança para a filha, que pleiteou judicialmente o reconhecimento de seu direito à isenção do IR sobre a venda dos papéis, alegando que o prazo de cinco anos havia sido cumprido antes da Lei 7.713/1988.

A mulher alegou que o cumprimento do requisito para o gozo da isenção antes de sua revogação seria motivo mais do que suficiente para afastar a incidência do imposto sobre o lucro no momento da alienação das ações, em respeito ao direito adquirido e ao ato jurídico perfeito.

Isenção sobre o lucro obtido

O relator do caso pontuou que a jurisprudência do STJ reconhece a aplicação da isenção do imposto de renda sobre o lucro obtido nas operações de alienação de participação societária ocorridas após a sua revogação pela Lei 7.713/1988. O reconhecimento é possível desde que o período de cinco anos, contado da aquisição da participação, tenha sido implementado ainda na vigência da norma isentiva, caracterizando-se a manutenção da titularidade do bem por todo esse período.

Segundo o magistrado, porém, a isenção não se transfere ao sucessor, uma vez que o benefício está atrelado à titularidade das ações pelo prazo de cinco anos, conforme o entendimento firmado no Agravo Interno no Agravo em Recurso Especial 1.379.101 e no Recurso Especial 1.563.733.

Deste modo, o relator concluiu por manter o entendimento do TRF3, de que o benefício previsto no Decreto-Lei 1.510/1976 é concedido a quem deteve a titularidade da participação societária pelo prazo mínimo de cinco anos, “desde que implementada a condição da isenção antes da revogação”. O magistrado acrescentou ainda que “transferida a titularidade das ações para o sucessor causa mortis, não mais subsiste o requisito da titularidade para fruição da isenção”.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que o fornecimento de medicamento para uso domiciliar não está entre as obrigações legais mínimas das operadoras de plano de saúde, salvo os antineoplásicos orais e correlacionados, a medicação aplicada em home care e os produtos listados pela Agência Nacional de Saúde (ANS) como de fornecimento obrigatório.

“A saúde suplementar cumpre propósitos traçados em políticas públicas legais e infralegais, não estando o Judiciário legitimado e aparelhado para interferir, em violação à tripartição de poderes, nas políticas públicas traçadas pelos demais poderes”, afirmou o ministro Luis Felipe Salomão, relator do caso analisado.

A decisão teve origem em ação ajuizada por um aposentado com o objetivo de obrigar o plano de saúde a custear tratamento domiciliar com o remédio Tafamidis – Vyndaqel, registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa).

O autor da ação alegou que o fato de o fármaco não ser ministrado em ambiente ambulatorial, mas em casa, não bastaria para isentar o plano da obrigação de fornecê-lo, e que tal recusa afrontaria o Código de Defesa do Consumidor (CDC). Negado em primeira instância, o pedido foi concedido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP).

Setor privado tem caráter complementar

No recurso ao STJ, a operadora invocou o artigo 10 da Lei dos Planos de Saúde (Lei 9.656/1998) para afastar sua obrigação de fornecer o medicamento.

De acordo com Luis Felipe Salomão, a judicialização da saúde exige redobrada cautela da magistratura, para não proferir decisões limitadas ao exame isolado de casos concretos – com o que acabaria por definir políticas públicas sem planejamento. Apesar da proteção conferida à saúde pela Constituição – acrescentou –, não se pode transferir irrestritamente o atendimento desse direito fundamental ao setor privado, que deve atuar apenas em caráter complementar.

O relator afirmou que oartigo 22, parágrafo 1º, da Lei 9.656/1998 mostra a inequívoca preocupação do legislador com o equilíbrio financeiro-atuarial dos planos e seguros de saúde. Ele mencionou precedente de abril deste ano (REsp 1.692.938) em que a Terceira Turma, por unanimidade, considerou lícita a exclusão, na saúde suplementar, do fornecimento de medicamentos para tratamento domiciliar, salvo as exceções previstas na Lei dos Planos de Saúde.

Salomão observou que o medicamento de alto custo Tafamidis, embora esteja na lista do Sistema Único de Saúde (SUS), não figura entre os antineoplásicos orais e correlacionados, nem os de medicação assistida (home care), e tampouco integra o rol de medicamentos de fornecimento obrigatório da ANS (seja a relação da época do ajuizamento da ação, seja a atual).

Aplicação do CDC nos planos de saúde é subsidiária

Quanto à aplicação do CDC ao tema, o relator afirmou que sua interpretação deve levar em consideração o texto da lei como um todo, especialmente os objetivos da Política Nacional das Relações de Consumo e os princípios que devem ser respeitados, dentre os quais se destaca a harmonia das relações de consumo e o equilíbrio nas relações entre consumidores e fornecedores.

Segundo o ministro, já é pacífico na Segunda Seção do STJ o entendimento de que as normas do CDC se aplicam apenas subsidiariamente aos planos de saúde, conforme disposto no artigo 35-G da Lei dos Planos de Saúde. “Como o CDC não regula contratos específicos, em casos de incompatibilidade há clara prevalência da lei especial nova pelos critérios de especialidade e cronologia”, declarou.

Na opinião do relator, a judicialização da saúde exige redobrada cautela de toda a magistratura, para não proferir decisões limitadas ao exame isolado de casos concretos – com o que acabaria por definir políticas públicas sem planejamento. 

Se há motivos que autorizem a intervenção judicial – concluiu –, esta deve ocorrer para decretação da nulidade ou da resolução do contrato, “nunca para a modificação do seu conteúdo – o que se justifica, ademais, como decorrência do próprio princípio da autonomia da vontade”.
Destaques de hoje

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1883654

​​​​A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) considerou que, havendo elementos suficientes da prática de crime permanente, foi legítima a entrada de policiais em domicílio particular sem mandado judicial, mas com autorização de parente hospedado no local.

A decisão, unânime, manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) que negou o trancamento de ação penal contra mãe e filho suspeitos de tráfico de entorpecentes.

A investigação partiu de denúncia anônima sobre o plantio de maconha em propriedade rural localizada em São José dos Pinhais (PR). A revista foi autorizada por uma mulher que estava na casa e se identificou como nora da dona da chácara. Os policiais visualizaram a plantação e identificaram o cheiro característico da droga. Foram encontrados 155 pés de maconha, 780g de sementes e utensílios utilizados na estufa destinada ao cultivo da planta.

Presos em flagrante, a dona da chácara e seu filho obtiveram liberdade provisória após a audiência de custódia. Em habeas corpus dirigido ao TJPR, a defesa pleiteou o trancamento da ação penal, sustentando a ilicitude das provas. Alegou que a revista policial violou a garantia de inviolabilidade do domicílio, uma vez que os policiais não sabiam do flagrante até entrarem no local. Além disso, a autorização para ingresso na propriedade foi dada por pessoa não residente da chácara. O pedido foi negado.

Teoria da apar​​​ência

No recurso apresentado ao STJ, a defesa reiterou as alegações. O relator, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, observou que o cenário antecedente mostra riqueza de elementos indicativos da prática de crime, “não sendo possível vislumbrar nulidade das provas obtidas por meio do ingresso dos policiais na residência”. 

Fonseca afirmou que, mesmo a autorização tendo sido dada por pessoa não residente no imóvel – no caso, uma hóspede não eventual –, essa situação não é capaz, por si só, de tornar ilícita a ação policial. Para o relator, é o caso de aplicação da teoria da aparência, pois quem autorizou o ingresso dos agentes foi a ex-companheira do filho da proprietária, que se referiu a ela como “sogra”.

A teoria da aparência define a aparência de direito como sendo “uma situação de fato que manifesta como verdadeira uma situação jurídica não verdadeira, e que, por causa do erro escusável de quem, de boa-fé, tomou o fenômeno real como manifestação de uma situação jurídica verdadeira, cria um direito subjetivo novo, mesmo à custa da própria realidade” (RMS 57.540).

Tráfico é crime pe​rmanente

O ministro explicou também que o tráfico de drogas é crime permanente, e está em flagrante quem o pratica em sua residência, ainda que para guarda ou depósito. “Legítima, portanto, a entrada de policiais para fazer cessar a prática do delito, independentemente de mandado judicial, desde que existam elementos suficientes de probabilidade delitiva”, afirmou.

O magistrado lembrou que são necessárias fundadas razões (justa causa) para que o ingresso em domicílio seja considerado válido e regular. “Somente quando o contexto fático anterior à invasão permitir que se conclua, para além de dúvida razoável, que a residência está sendo palco de um delito”, declarou. 

O relator chamou atenção para o fato de a jurisprudência cada vez mais considerar inválido o ingresso da polícia em residência quando não ficar demonstrada a presença de elementos indicativos de causa provável, não se tolerando, por exemplo, a invasão de domicílio baseada apenas em denúncia anônima.

Contudo, segundo Fonseca, essa não é a hipótese dos autos. “Existia crime permanente (situação flagrancial) a ser interrompido pelo Estado. Não há, portanto, que se falar, de plano, em nulidade das provas obtidas mediante ingresso dos policiais no imóvel, de maneira que inexiste motivo para que se conceda a ordem de habeas corpus”, concluiu o ministro.

Leia o acórdão no RHC 141.544.

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ definiu que os guardiães adotivos de uma criança de Minas Gerais, que cuidam dela há seis anos, devem manter a guarda da infante até que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais – TJMG decida se a criança deve voltar à sua família biológica. O caso, que ganhou notoriedade no início do ano, foi levado a julgamento nesta terça-feira (15).

O processo teve início no TJMG. Retirada da guarda familiar com dois anos de idade por maus tratos, a menina foi levada para um abrigo e adotada após um ano. Hoje, com nove anos, a família biológica busca reaver a guarda da criança.A disputa entre a família extensa e a família adotiva se estendeu para fora dos tribunais, com uma petição que conta com 368 mil assinaturas em apoio à guarda adotiva.

Em 25 de fevereiro, o TJMG rejeitou recurso apresentado pela família adotiva, determinando que a garota fosse para a casa da avó biológica paterna. Logo após a sessão, um pedido de habeas corpus foi apresentado por um grupo de advogados para que a menina ficasse com a família adotiva.Este habeas corpus de efeito suspensivo foi aceito pelo STJ em março, e permitiu que a criança ficasse com sua família adotiva.

Relator considerou afetividade com família adotiva

“No caso concreto, ao menos neste momento de exame superficial, força reconhecer que o convívio por largo espaço de tempo sob a forma de relação parental pode ter sedimentado o liame afetivo estabelecido entre a criança e os guardiães, mercê do alongado trâmite da demanda originária, que ensejou a manutenção da guarda provisória por lapso superior a 5 anos”, escreveu o ministro Antonio Carlos Ferreira, relator do caso.

Ele acrescentou: “Sob esse prisma, entendo não ser conveniente o imediato e abrupto desfazimento do vínculo formado, em situação de estabilidade, embora relevantes os fundamentos lançados no acórdão impugnado, com opção pelo prestígio da família biológica”.

Na sessão, Antonio Carlos votou por manter sua decisão em habeas corpus, garantindo que a criança fique com a família adotiva até a decisão definitiva do TJMG. Para o ministro, uma reversão da decisão poderia apenar a criança. “Aqueles que eventualmente tenham praticado qualquer sorte de ilícito, que respondam pelos atos praticados – todavia as consequências desta responsabilização não devem atingir os que, a par de sua reconhecida vulnerabilidade, em nada contribuíram para que tais irregularidades fossem perpretadas”, disse.

Os ministros Luis Felipe Salomão e Raul Araújo acompanharam Antonio Carlos. Isabel Gallotti, ao acompanhar o voto, reconheceu que a situação é excepcional. “O caso é muito grave, sensível e peculiar”, definiu a ministra, que não considera o habeas corpus o dispositivo correto para a situação.

Superior interesse da criança

Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família seção Minas Gerais – IBDFAM-MG, José Roberto Moreira Filho acompanha o caso. “De acordo com a decisão do ministro relator, vários erros foram cometidos, várias infrações ao melhor interesse da criança foram cometidas pelo TJMG”, aponta o advogado. O IBDFAM vai pleitear o ingresso como amicus curiae no julgamento.

“Com base apenas no melhor interesse da criança, verificando que mudar essa criança novamente de lar, estando pendente o processo de adoção – para evitar esta troca de lares constante, e em detrimento do interesse da criança –, o STJ julgou procedente o habeas corpus”, explica José Roberto.

Presidente da Comissão de Adoção do Instituto Brasileiro de Direito de Família – IBDFAM, a advogada Silvana do Monte Moreira elogia a decisão unânime da Quarta Turma. Na opinião da especialista, o entendimento atacou ponto a ponto do processo.

“Mostrou de forma cristalina que o superior interesse da criança vem sendo atendido pelos adotantes, e tratou do excesso de tempo que transcorre os processos de destituição do poder familiar e de adoção”, avalia Silvana.

Por Guilherme Mendes – Repórter em Brasília

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM

A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou recurso do Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ) e confirmou decisão monocrática do ministroReynaldo Soares da Fonseca, que concedeu, em maio deste ano, habeas corpus para que seja contado em dobro todo o período em que um homem esteve preso no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Complexo Penitenciário de Bangu, localizado na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Esta é a primeira vez que uma Turma criminal do STJ aplica o Princípio da Fraternidade para decidir pelo cômputo da pena de maneira mais benéfica ao condenado que é mantido preso em local degradante. A decisão caracteriza um importante precedente possível de ser aplicado para a resolução de situações semelhantes.

A unidade prisional objeto do recurso sofreu diversas inspeções realizadas pela Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), a partir de denúncia feita pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro sobre a situação degradante e desumana em que os presos se encontravam. Essas inspeções culminaram na edição da Resolução CIDH de 22 de novembro de 2018, que proibiu o ingresso de novos presos na unidade e determinou o cômputo em dobro de cada dia de privação de liberdade cumprido no local – salvo para os casos de crimes contra a vida ou a integridade física, e de crimes sexuais.

O Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) aplicou a contagem em dobro apenas para o período de cumprimento de pena posterior à data em que o Brasil foi notificado formalmente da resolução da CIDH, porque a resolução não faz referência expressa ao termo inicial da determinação.

Após a decisão liminar do ministro Reynaldo, o MPRJ recorreu para que esse entendimento fosse restabelecido, sob o argumento de que a decisão da CIDH teria a natureza de medida cautelar provisória, motivo que impediria a produção de efeitos retroativos. Ele sustentou essa tese no fato de a resolução mencionada estabelecer prazos para o seu cumprimento.

Eficácia vinculante da d​ecisão da CIDH

Ao julgar o caso na Quinta Turma, o relator lembrou que, a partir do Decreto 4.463/2002, o Brasil reconheceu a competência da CIDH em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), aprovada em 1969. Sendo assim, as sentenças da CIDH são vinculantes para as partes processuais. “Todos os órgãos e poderes internos do país encontram-se obrigados a cumprir a sentença”, declarou.

Reynaldo Soares da Fonseca ponderou que, ao aplicarem a resolução apenas a partir da notificação oficial feita ao Brasil, as instâncias anteriores deixaram de cumpri-la, pois as más condições do presídio, que motivaram a determinação da CIDH, já existiam antes de sua publicação.

No voto, o relator registrou que o MPRJ sustenta a natureza cautelar da medida, que limita os efeitos das obrigações decorrentes da resolução da CIDH para o futuro, mas aponta “para a necessidade de celeridade na adoção dos meios de seu cumprimento, tendo em vista, inclusive, a gravidade constatada das peculiaridades do caso”.

Interpretação mais favorável a que​​m teve direitos violados

Ele destacou que, por princípio interpretativo das convenções sobre direitos humanos, é permitido ao Estado-parte ampliar a proteção conferida por elas. Assim – concluiu –, as sentenças da CIDH devem ser interpretadas da maneira mais favorável possível para quem teve seus direitos violados.

Além disso, o relator ressaltou que as autoridades locais devem observar os efeitos das disposições da sentença internacional e adequar sua estrutura interna “para garantir o cumprimento total de suas obrigações frente à comunidade internacional”, no intuito de diminuir violações e abreviar as demandas internacionais.

Princípio da Frate​rnidade

Durante o julgamento na Quinta Turma, os demais ministros do colegiado destacaram o caráter histórico da decisão. O ministro Ribeiro Dantas ressaltou “a importância e a profundidade do voto”, e afirmou ter certeza de que se tornará um acórdão de referência no tratamento desses temas.

O ministro Joel Ilan Paciornik afirmou que, “numa hipótese onde se detecta flagrante violação a direitos humanos pelas condições degradantes e desumanas existentes em determinados estabelecimentos prisionais, a invocação do Princípio da Fraternidade é extremamente procedente”.

Por fim, o ministro João Otávio de Noronha observou que o voto “consagra um princípio já agasalhado na Constituição Federal [o Princípio da Fraternidade], em que os direitos e garantias expressos na Constituição não excluem outros decorrentes do regime e princípios por ela adotados ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”, afirmou.

Com a decisão unânime da Quinta Turma, o STJ fixou a contagem em dobro para todo o período. Segundo a defesa, o condenado poderá alcançar o tempo necessário para a progressão de regime e o livramento condicional. Essa análise caberá à justiça do Rio de Janeiro. ​​Destaques de hoje

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):RHC 136961

​Os herdeiros de pai pré-morto têm legitimidade para ajuizar ação declaratória de relação avoenga caso o próprio falecido não tenha pleiteado, em vida, a investigação de sua origem paterna, sendo irrelevante o fato de ele ter sido registrado por outra pessoa que não o genitor.

Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que reconheceu a legitimidade processual ativa de netos que, após o falecimento do pai, ajuizaram ação para que fosse reconhecida a relação com o suposto avô.

A classificação “pré-morto” é dada a quem faleceu antes do autor da herança, seu ascendente, e deixou descendentes que herdarão em seu lugar, conforme as regras do direito de representação previstas no Código Civil.

Na solução do caso, a Terceira Turma aplicou os mesmos fundamentos de precedente no qual a Segunda Seção estabeleceu que os netos possuem direito próprio e personalíssimo de pleitear a declaração de relação avoenga.

Ao STJ, o suposto avô alegou, entre outros pontos, que aquele precedente não se aplicaria ao caso, porque seria necessário distinguir a situação em que os ascendentes do pai pré-morto são desconhecidos – matéria enfrentada no precedente – da hipótese em que está pré-estabelecida essa relação de filiação, ainda que apenas registral.

Direito pró​prio dos netos

A relatora, ministra Nancy Andrighi, explicou que o precedente da Segunda Seção não se baseou, fundamentalmente, em considerações acerca da existência ou não de anterior paternidade registral ou socioafetiva.

Para a magistrada, a distinção pretendida pelo suposto avô é irrelevante para o deslinde da controvérsia, pois tanto na hipótese em que se desconhecem os genitores de pai pré-morto quanto na situação em que já existe paternidade registral ou socioafetiva reconhecida, é imprescindível tutelar o direito próprio dos netos de verem reconhecida sua parentalidade avoenga biológica.

“Se o direito dos filhos ao reconhecimento de sua origem biológica não é obstado pela existência de eventual paternidade registral ou socioafetiva, não há razão para se tolher o direito dos netos ao reconhecimento da relação avoenga”, afirmou.

Efeitos patrimoniais prescr​​evem

Na avaliação de Nancy Andrighi, caso prevalecesse o entendimento de que seria necessário o interesse do genitor em exercer o direito de buscar a sua paternidade biológica, para que só depois os seus filhos pudessem ter reconhecida a relação avoenga, seriam criadas, de maneira artificial e injusta, categorias de netos de primeira e de segunda classe.

“Aos primeiros, seria deferido o direito à investigação da ancestralidade biológica; aos segundos, seria imposta verdadeira limitação ao setor nuclear de suas esferas jurídicas, sede dos direitos da personalidade”, declarou.

A relatora destacou que, muito embora a pretensão decorrente do direito ao parentesco (natural ou civil) seja imprescritível, por ter como objetivo uma declaração de estado e como fundamento um direito da personalidade, não o são as pretensões patrimoniais – notadamente as sucessórias – que derivem desse direito.

Dessa forma, concluiu a magistrada, a obtenção de possíveis efeitos patrimoniais dessa declaração de estado será limitada às hipóteses em que não estiver prescrita a própria pretensão patrimonial.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.​​