​​​Em julgamento sob o rito dos recursos repetitivos (Tema 1.084), a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a aplicação retroativa do patamar estabelecido no artigo 112, V, da Lei de Execução Penal – LEP (Lei 7.210/1984), com a redação dada pelo Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019), aos condenados por crime hediondo ou equiparado, sem resultado morte, que não sejam reincidentes em delito da mesma natureza.

O colegiado entendeu que, diante da ausência de previsão, no Pacote Anticrime, de parâmetros para a progressão de regime prisional dos condenados por crime hediondo ou equiparado que sejam reincidentes genéricos, deve ser considerado para eles o mesmo percentual de cumprimento de pena exigido dos sentenciados primários: 40%.

Como esse percentual é inferior ao estabelecido antes da vigência do Pacote Anticrime – portanto, mais benéfico para o réu –, os ministros entenderam também que a regra deve ser aplicada retroativamente aos condenados por crime hediondo, sejam primários ou reincidentes genéricos.

Lacuna legal

No mesmo julgamento, a Terceira Seção definiu que os condenados por crimes praticados com violência contra a pessoa ou grave ameaça, bem como por crimes hediondos ou equiparados com resultado morte, e que sejam reincidentes – mas não em crimes da mesma natureza –, têm direito à progressão de regime prisional a partir do cumprimento dos mesmos percentuais de pena exigidos daqueles que são primários.

Segundo o relator, ministro Rogerio Schietti Cruz, as três situações examinadas no julgamento “evidenciam a inexistência de previsão legal acerca de hipóteses que desafiam cotidianamente o trabalho desenvolvido pelas inúmeras varas de execução penal do país”.

Ele explicou que o Pacote Anticrime promoveu profundas alterações nas normas da progressão de regime penal – entre elas, a revogação do artigo 2º, parágrafo 2º, da Lei dos Crimes Hediondos (Lei 8.072/1990), segundo o qual os condenados por crime hediondo teriam direito ao benefício só após o cumprimento de dois quintos da pena, se fossem primários, ou de três quintos, no caso de reincidentes genéricos ou específicos.

Novos critérios

Com a mudança – afirmou o magistrado –, os parâmetros da progressão passaram a ser disciplinados exclusivamente pelo artigo 112 da LEP, que, na atual redação, estabelece condições diferentes conforme a natureza do delito (comum ou hediondo), a ocorrência ou não de violência, grave ameaça ou morte, e a primariedade, a reincidência genérica ou a reincidência específica do apenado.

Contudo, o relator ressaltou que a lei não estabeleceu quais seriam os patamares relativos aos reincidentes genéricos nas hipóteses de crime hediondo ou equiparado, de crime hediondo ou equiparado com resultado morte e, ainda, de crime não hediondo praticado com violência contra a pessoa ou grave ameaça.

Schietti observou que o inciso V do artigo 112 da LEP, por exemplo, fixa o patamar de 40% de cumprimento da pena para os condenados por crime hediondo e equiparado que sejam primários, ao passo que o inciso VII prevê que os reincidentes na prática de crime hediondo ou equiparado devem cumprir ao menos 60% da pena para ter direito à progressão – nada dizendo sobre a situação dos reincidentes genéricos.

Analogia

A partir do pressuposto segundo o qual não se admite no direito penal a analogia in malam partem (prejudicial ao réu), o ministro concluiu que devem ser aplicados aos reincidentes genéricos os patamares de progressão referentes aos sentenciados primários, pois, “ainda que não sejam primários, reincidentes específicos também não o são”.

Dessa maneira, o colegiado estabeleceu que:

Ao sentenciado que cometeu crime com violência contra a pessoa ou grave ameaça, mas não é reincidente em delito da mesma natureza – portanto, primário ou reincidente genérico –, deve ser aplicado o patamar de 25% de cumprimento da pena, como prevê o inciso III do artigo 112 da LEP.

Do apenado que praticou crime hediondo ou equiparado, mas também não é reincidente em crime de igual natureza, deve ser exigido o cumprimento mínimo de 40% da pena, como estabelecido no inciso V do mesmo dispositivo legal.

Por fim, para o apenado que cometeu crime hediondo ou equiparado com resultado morte, mas, igualmente, é primário ou reincidente genérico, será observado o requisito do inciso VI, “a”, do artigo 112 – ou seja, 50%.​

Leia o acórdão no REsp 1.910.240.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1910240REsp 1918338

O Superior Tribunal de Justiça (STJ) promoveu, nesta terça-feira (25), por meio da Secretaria de Serviços Integrados de Saúde (SIS), uma roda de conversa para a discussão do tema Violência Contra a Criança: Como proteger nossos filhos. O evento faz parte das ações do tribunal em apoio ao Pacto Nacional pela Primeira Infância e também integra o Programa Humaniza, uma ação institucional.

O debate virtual – dirigido a servidores do STJ, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e do Conselho da Justiça Federal (CJF) – ressaltou a importância dos cuidados na primeira infância para o desenvolvimento da criança e do adolescente. As servidoras da SIS Giulianna Felizola (pediatra) e Juliana Nogueira (odontopediatra) participaram do encontro como palestrantes, acompanhadas pela pediatra Fabiana de Luccas, que atuou como moderadora.

Com o objetivo de divulgar o plano de ação do STJ em relação aos desdobramentos do Pacto Nacional, o evento procurou auxiliar as pessoas que exercem a função parental, ou cuidam de crianças e adolescentes de até 18 anos, a se relacionarem de forma consciente e sustentável. Gestantes e futuros pais também participaram.

Amar ​é educar
Odontopediatra do STJ há 21 anos, Juliana Nogueira apresentou uma pesquisa segundo a qual 24% dos servidores da corte acreditam que punições físicas são válidas para corrigir maus comportamentos e 61% praticaram, alguma vez, punição física na educação dos filhos.”É preocupante quando, nos dias atuais, uma parte dos pais considera válido bater em crianças como forma de ‘educar’. Pesquisas científicas dizem que castigos corporais não funcionam. Hoje, existe um movimento mundial no sentido de proibir legalmente a punição corporal”, observou Juliana.Segundo ela, o objetivo do movimento não é punir pais e educadores, e sim promover uma mudança cultural em favor da criação não violenta. Uma das teorias da universidade de Harvard para melhorar o desempenho das crianças é construir competências nos adultos que cuidam delas. “A gente não nasce sabendo, é preciso pesquisar e entender o que acontece com uma criança para conseguir criá-la de forma saudável emocionalmente.”Juliana propôs aos pais que façam regularmente um planejamento estratégico de parentalidade, assim como fazem no trabalho, nos estudos ou nas férias. “Precisamos planejar quem queremos ser como pais.” Na mesma linha, Giulianna Felizola lembrou que a violência contra a criança é “invisibilizada pela sociedade”. De acordo com a pediatra, isso acontece pelo fato de os adultos ainda se apoiarem em conceitos arcaicos (da época de pais e avós) ou crenças sem nenhuma comprovação científica. “A falsa ideia de que a criança, para aprender, precisa ser repreendida, punida, sentir-se mal e culpada é perpetuada e reproduzida.” Giulianna reforça que, “para nos livrarmos de algum estigma da infância, normalmente assumimos inconscientemente que o que vivemos foi necessário e merecido”.

Compromiss​o institucional
Além de evidenciar os cuidados necessários à primeira infância, a palestra abordou o processo de evolução do cérebro humano, dados estatísticos em relação à violência infantil, formas de agressão e evidências científicas dos malefícios da violência no desenvolvimento da criança.Por fim, Giulianna Felizola reforçou algumas atitudes que os pais devem internalizar para proteger seus filhos, como “entender que comportamentos infantis são uma forma de comunicação, e mudanças de comportamento podem ser vistas como pedidos de ajuda”.O Pacto Nacional pela Primeira Infância, do qual o tribunal faz parte, é uma iniciativa do CNJ e consiste em um acordo de cooperação nacional para fortalecer instituições públicas na garantia dos direitos da criança, previstos na legislação brasileira.Em sintonia com esse pacto, bem como com a Agenda 2030 das Nações Unidas e as Metas Nacionais do Poder Judiciário, membros da Presidência do STJ, da Assessoria de Gestão Socioambiental e da SIS pretendem realizar uma série de palestras e rodas de conversa para divulgar o plano de ação do órgão e conscientizar os servidores em relação ao tema.

Agenda​​​ ​2030
O STJ está comprometido com a Agenda 2030, da Organização das Nações Unidas, e tem pautado suas ações no alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), fazendo as escolhas necessárias para melhorar a vida das pessoas, agora e no futuro. As informações desta matéria estão relacionadas ao ODS 3. Saúde e Bem-Estar – Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos, em todas as idades.

Ao contrário da interceptação telefônica, em que apenas são captados os diálogos entre o alvo interceptado e outras pessoas, a substituição do chip do investigado por um chip da polícia, sem o seu conhecimento, tornaria o investigador um participante das conversas, podendo interagir com o interlocutor e gerenciar todas as mensagens – hipótese de investigação que não tem previsão na Constituição nem na Lei 9.296/1996.

O entendimento foi fixado pela Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao manter acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que considerou ilegal uma determinação judicial para que a operadora habilitasse temporariamente números de telefones da polícia em substituição aos chips dos celulares dos investigados. Assim, em determinados momentos, a critério dos policiais, eles passariam a receber as chamadas e mensagens dirigidas aos investigados.

De acordo com o TJSP, essa transferência – autorizada em liminar, a pedido da polícia – não tem respaldo no artigo 5º, inciso XII, da Constituição, tampouco na Lei 9.296/1996, que regula a interceptação de telecomunicações em investigações criminais. Para o tribunal, além de constituir uma forma ilícita de interceptação, esse procedimento acarretaria a suspensão indevida da comunicação telefônica e telemática dos investigados.

Em recurso ao STJ, o Ministério Público Federal sustentou que esse tipo de interceptação não seria ilegal e alegou que a medida judicial permitiria aos investigadores obter, em tempo real, os dados enviados aos telefones dos investigados – como as chamadas recebidas e as mensagens por meio de aplicativos como WhatsApp e Telegram.

Acess​​o irrest​​​rito

A ministra Laurita Vaz, relatora do recurso, explicou que a substituição dos chips dos investigados por terminais da polícia permitiria aos investigadores, de fato, o acesso irrestrito a todo o conteúdo das comunicações, inclusive com a possibilidade de envio de novas mensagens pelo WhatsApp e exclusão de outras.

“Se não bastasse, eventual exclusão de mensagem enviada ou de mensagem recebida não deixaria absolutamente nenhum vestígio e, por conseguinte, não poderia jamais ser recuperada para servir de prova em processo penal, tendo em vista que, em razão da própria característica do serviço, feito por meio de encriptação ponta a ponta, a operadora não armazena em nenhum servidor o conteúdo das conversas dos usuários”, afirmou a magistrada.

Laurita Vaz destacou que a hipótese dos autos é diferente de precedente do STJ no qual se reconheceu a legalidade da obtenção de conversas já registradas em aplicativo de mensagens instantâneas – situação semelhante ao acesso autorizado a conversas realizadas por e-mail, que tem previsão legal.

Ampliaçã​​o ​​​ilegal

A magistrada também lembrou que, exatamente por falta de previsão legal, em outro precedente, a Sexta Turma reconheceu a ilegalidade do espelhamento, feito pela polícia, de conversas trocadas por investigados por meio do WhatsApp.

Ao negar o recurso do Ministério Público, a relatora considerou correto o entendimento do TJSP no sentido de que, por ser uma exceção à garantia constitucional da inviolabilidade das comunicações, a interceptação telefônica e telemática só pode ser autorizada nos estritos limites da lei, não se admitindo a ampliação das hipóteses previstas ou a criação de procedimento investigatório diferente.  

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial. ​

Com base em determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), o ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Reynaldo Soares da Fonseca concedeu habeas corpus para que seja contado em dobro todo o período em que um homem esteve preso no Instituto Penal Plácido de Sá Carvalho, no Complexo Penitenciário de Bangu, localizado na Zona Oeste do Rio de Janeiro.

Com a contagem em dobro, segundo a defesa, o condenado poderá alcançar o tempo necessário para a progressão de regime e o livramento condicional.

A unidade prisional foi objeto de diversas inspeções realizadas pela CIDH, a partir de denúncia feita pela Defensoria Pública do Rio de Janeiro sobre a situação degradante e desumana em que os presos se achavam. Essas inspeções culminaram na edição da Resolução CIDH de 22 de novembro de 2018, que proibiu o ingresso de novos presos na unidade e determinou o cômputo em dobro de cada dia de privação de liberdade cumprido no local – salvo para os casos de crimes contra a vida ou a integridade física e de crimes sexuais.

Com sua decisão, Reynaldo Soares da Fonseca reformou acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que aplicou a contagem em dobro apenas para o período de cumprimento de pena posterior a 14 de dezembro de 2018, data em que o Brasil foi notificado formalmente da resolução da CIDH. Como a resolução não faz referência expressa ao termo inicial da determinação, o TJRJ adotou a regra do direito interno, que “confere efetividade e coercibilidade às decisões na data de sua notificação formal”.

Eficácia vinculante

O relator lembrou que, a partir do Decreto 4.463/2002, o Brasil reconheceu a competência da CIDH em todos os casos relativos à interpretação ou aplicação da Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), aprovada em 1969.

Segundo o magistrado, a sentença emitida pela CIDH tem eficácia vinculante para as partes processuais, não havendo meios de revisá-la. “A sentença da CIDH produz autoridade de coisa julgada internacional, com eficácia vinculante e direta às partes. Todos os órgãos e poderes internos do país encontram-se obrigados a cumprir a sentença”, declarou.

Reynaldo Soares da Fonseca ponderou que, ao aplicar a resolução apenas a partir da notificação oficial feita ao Brasil, as instâncias anteriores deixaram de cumpri-la, pois as más condições do presídio, que motivaram a determinação da CIDH, já existiam antes de sua publicação.

“Não se mostra possível que a determinação de cômputo em dobro tenha seus efeitos modulados como se o recorrente tivesse cumprido parte da pena em condições aceitáveis até a notificação, e a partir de então tal estado de fato tivesse se modificado”, comentou o ministro.

Interpretação mais favorável

Ele destacou que, por princípio interpretativo das convenções sobre direitos humanos, é permitido ao Estado-parte ampliar a proteção conferida por elas. Assim – concluiu –, as sentenças da CIDH devem ser interpretadas da maneira mais favorável possível para quem teve seus direitos violados.

Além disso, o relator ressaltou que as autoridades locais devem observar os efeitos das disposições da sentença internacional e adequar sua estrutura interna “para garantir o cumprimento total de suas obrigações frente à comunidade internacional, uma vez que os países signatários são guardiões da tutela dos direitos humanos”.

Para Reynaldo Soares da Fonseca, “os juízes nacionais devem agir como juízes interamericanos e estabelecer o diálogo entre o direito interno e o direito internacional dos direitos humanos, até mesmo para diminuir violações e abreviar as demandas internacionais”.

Considerando que a melhor interpretação a ser dada à resolução é pela sua aplicação a todo o tempo de pena cumprido na unidade, o ministro mandou que seja contado em dobro o período de 9 de julho de 2017 a 24 de maio de 2019, como requerido pela defesa no recurso em habeas corpus.

Leia adecisão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):RHC 136961

Companheira foi considerada a única herdeira e os irmãos do falecido foram excluídos da linha sucessória em uma decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ, que restabeleceu decisão de primeiro grau para anular sentença homologatória de partilha. Para isso, foi considerada a tese fixada pelo Supremo Tribunal Federal – STF no Tema 809 da repercussão geral e também a falta de citação da mulher no processo.

Para o Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP, o Tema 809 não seria aplicável ao caso pelo fato de a partilha já estar homologada antes do julgamento em que o STF considerou inconstitucional a distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros. No STJ, a conclusão de segundo grau foi afastada por unanimidade pela Terceira Turma.

A ação de inventário foi proposta por um dos irmãos do falecido, que indicou os demais como herdeiros. Diante do consenso entre as partes citadas, o juiz homologou a partilha e atribuiu os respectivos quinhões. Antes da expedição do formal de partilha, a companheira requereu sua habilitação nos autos.

O juiz então aplicou ao inventário a regra do artigo 1.829 do Código Civil, tornando-a herdeira e excluindo os irmãos do falecido da linha sucessória. Já o TJSP reformou a decisão por considerar que o Tema 809 só seria aplicável aos inventários cuja sentença de partilha ainda não tivesse transitado em julgado.

Relação jurídica necessária

Relatora do caso no STJ, a ministra Nancy Andrighi apontou que o juízo do inventário nada mais fez do que reconhecer a sua inexistência jurídica em razão da ausência de citação da companheira do autor da herança. Com base na jurisprudência da Corte, ressaltou que não é possível falar em coisa julgada de sentença proferida em processo no qual não se formou a relação jurídica necessária ao seu desenvolvimento.

“Ainda que se pudesse cogitar da formação de coisa julgada material a partir de sentença homologatória de acordo de partilha e consequente possibilidade de execução do formal de partilha – que, na hipótese, sequer foi expedido –, não se pode olvidar que a execução seria ineficaz em relação à recorrente, que, relembre-se, apenas ingressou na ação de inventário após a prolação da sentença homologatória de acordo entre os colaterais”, concluiu a magistrada.

Leia o acórdão disponível no site do STJ.

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ confirmou acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP que, em caso envolvendo rescisão de contrato, verificou a inexistência do registro da alienação fiduciária na matrícula do imóvel, razão pela qual não estaria constituída a garantia. Assim, não haveria impedimento à resolução do ajuste, com a restituição de 90% dos valores pagos pelo comprador.

O caso teve origem em contrato particular de compra e venda de um terreno em loteamento urbano, do qual constou cláusula de alienação fiduciária em garantia. Impossibilitado de arcar com as prestações, o comprador ajuizou pedido de rescisão do negócio e devolução de 90% da quantia paga. Em recurso ao STJ, a empresa pediu que fosse seguido o procedimento do leilão previsto no artigo 27 da Lei 9.514/1997, sob o argumento de que a ausência de registro do contrato decorreu de culpa exclusiva do comprador.

O colegiado entendeu que não é possível exigir do comprador que se submeta ao procedimento de venda extrajudicial do bem para receber de volta as quantias pagas, caso o contrato que serve de título à propriedade fiduciária não tenha sido registrado em cartório, conforme o artigo 23 da Lei 9.514/1997.

A relatora, ministra Nancy Andrighi, pontuou que, no ordenamento jurídico brasileiro, coexiste um duplo regime jurídico da propriedade fiduciária: o regime geral do Código Civil, que disciplina a propriedade fiduciária sobre coisas móveis infungíveis, sendo o credor fiduciário qualquer pessoa natural ou jurídica; e o regime especial, formado por um conjunto de normas extravagantes, entre as quais a Lei 9.514/1997, que trata da propriedade fiduciária sobre bens imóveis.

Segundo a magistrada, no regime especial da Lei 9.514/1997, o registro do contrato tem natureza constitutiva: sem ele, a propriedade fiduciária e a garantia dela decorrente não se formam, independentemente da parte que tenha dado causa à ausência do registro. Deste modo, “na ausência de registro do contrato que serve de título à propriedade fiduciária no competente registro de imóveis, como determina o artigo 23 da Lei 9.514/1997, não é exigível do adquirente que se submeta ao procedimento de venda extrajudicial do bem para só então receber eventuais diferenças do vendedor.”

Para a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ a proteção do credor e de terceiros justifica o registro de protesto contra alienação de bem de família. Entendimento foi de que, embora o protesto possa ter reflexos negativos para a devedora, a publicidade da pretensão futura de penhora do bem é essencial para a proteção de terceiros de boa-fé e a preservação do direito do credor.

O colegiado determinou que é possível a averbação de protesto contra a alienação de imóvel classificado como bem de família, não para impedir a venda do imóvel impenhorável, mas para informar terceiros de boa-fé sobre a pretensão do credor, especialmente na hipótese de futuro afastamento da proteção contra a penhora. Decisão manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP que deferiu a averbação do protesto, em caráter informativo, na matrícula de imóvel protegido pela Lei 8.009/1990.

Conforme alegação do credor, o protesto seria necessário para resguardar os seus direitos futuros, bem como para alertar compradores em potencial do imóvel familiar, e que, em caso de morte da devedora, ele poderá ser habilitado no espólio, possibilitando impedir a alienação de bens antes do pagamento do débito. Em recurso contra a decisão do TJSP, a devedora justificou que não existe direito do credor ao protesto, pois ele não poderia executar o imóvel, tendo em vista a impenhorabilidade assegurada pelo artigo 10 da Lei 8.009/1990.

O relator do recurso, ministro Antonio Carlos Ferreira, lembrou que a Segunda Seção, no julgamento do EREsp 185.645, considerou que a averbação cartorária de protesto contra alienação de bem está dentro do poder geral de cautela do juiz (artigo 798 do Código de Processo Civil de 1973) e é justificável pela necessidade de dar conhecimento do protesto a terceiros, prevenindo litígios e prejuízos para eventuais compradores. Para ele, a inserção dessa informação no registro público do imóvel também é uma forma de prevenir possível alienação fraudulenta. “A medida não impede a disposição do bem, mas obsta que terceiro adquirente possa alegar boa-fé, no caso de futura demanda judicial envolvendo o imóvel”.

O magistrado destacou ainda, também com base em precedentes do STJ, que o protesto contra a alienação pressupõe dois requisitos: que a pretensão do interessado no protesto seja legítima e que o protesto não impeça a realização de negócio lícito. Deste modo, pontuou em seu voto que a impenhorabilidade do bem de família nada mais é do que uma garantia jurídica que incide sobre uma situação fática: a moradia familiar. No entanto, os fatos podem ser modificados por várias razões, como o recebimento de herança, a compra de um segundo imóvel ou a mudança de residência da família.

“Assim, ao perder a qualidade de bem de família, a venda posterior do imóvel com registro de protesto contra alienação de bens pode, numa análise casuística, configurar fraude à execução”, frisou.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do STJ)

SUPRESSIO APLICADA

A empresa que tem o direito de excluir seu ex-empregado do plano de saúde coletivo após 24 meses, mas não o faz por quase uma década gera no beneficiário a legítima expectativa de que seria mantido no contrato por tempo indeterminado. A exclusão tardia é abusiva e não pode ser feita.

Com esse entendimento, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça negou provimento ao recurso especial ajuizado por uma empresa, que visava excluir do quadro de beneficiários do seu plano de saúde coletivo um ex-empregado, nove anos após o desligamento do mesmo.

A decisão foi unânime, conforme voto do relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino. Votaram com ele os ministros Ricardo Villas Bôas Cueva, Marco Aurélio Bellizze, Moura Ribeiro e Nancy Andrighi.

No caso, o homem foi demitido em 2001, após 14 anos de trabalho, sem justa causa e não por aposentadoria. Com isso, deveria ser mantido no plano de saúde empresarial por no mínimo seis meses e no máximo 24.

Em 2012, quando já tinha 62 anos, foi informado pela ex-empregadora que seria excluído do rol de beneficiários em 2014. Por isso, a demanda foi ajuizada. Ao analisar o caso, a 3ª Turma do STJ manteve a aplicação do instituto da supressio, conforme decidiu o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro.

Ele indica a possibilidade de se considerar suprimida determinada obrigação contratual na hipótese em que o não exercício do direito correspondente, pelo credor, gerar no devedor a legítima expectativa de que esse não exercício se prorrogará no tempo.

Relator, o ministro Paulo de Tarso Sanseverino apontou que a exclusão tardia do ex-empregado idoso coloca-o em situação de extrema desvantagem no mercado de planos de saúde. Ele não poderá usufruir da contribuição da geração mais jovem, embora, enquanto ele próprio teve menos idade, contribuiu ativamente com o plano.

“O ex-empregado foi mantido no plano enquanto sua contribuição favorecia os idosos, mas foi excluído justamente quando ele próprio se tornou idoso, e passou a necessitar da contribuição solidária dos mais jovens para a fixação de uma mensalidade proporcionalmente menor do que a sinistralidade acentuada da última faixa etária”, disse.

A 3ª Turma do STJ já aplicou o instituto da supressio em caso de plano de saúde recentemente. No caso, a permanência do ex-empregado como beneficiário se dera por mais de dez anos. Para o relator, apesar de o caso concreto tratar de período de menos de uma década, a condição de idoso do ex-empregado justifica sua manutenção no plano de saúde.

Clique aqui para ler o acórdão
REsp 1.918.599

Por: Danilo Vital é correspondente da revista Consultor Jurídico em Brasília.

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Humberto Martins, prorrogou até o dia 10 de abril as medidas implementadas por meio da Resolução STJ/GP 11/2021​, que determinou a suspensão da prestação presencial de serviços não essenciais no tribunal, em razão do agravamento da crise sanitária relacionada à Covid-19.

A decisão tem por objetivo reduzir ao máximo a circulação de pessoas na sede do tribunal e evitar a transmissão do novo coronavírus.

Com a prorrogação de prazo trazida pela Resolução STJ/GP 12/2021, continua suspensa a entrada do público na sede do tribunal – salvo situações extraordinárias, autorizadas pelos titulares das unidades e comunicadas à Secretaria de Segurança.

O atendimento ao público – inclusive a advogados que necessitem despachar com o gabinete da Presidência – será feito por videoconferência ou por outros recursos eletrônicos.

Nos demais gabinetes, cada ministro definirá o regime de trabalho de sua equipe.

Avaliação das un​idades

As unidades administrativas do tribunal devem avaliar a necessidade de desenvolvimento de atividades de forma presencial, as quais deverão ser previamente autorizadas pela direção-geral. Caso seja imprescindível a presença na sede, a unidade responsável deverá promover sistema de rodízio, inclusive com a redução do horário de trabalho presencial, sempre que possível.

A Resolução 11/2021 manteve as regras definidas nas Resoluções STJ/GP 19/2020 e STJ/GP 21/2020, no tocante aos dispositivos que não conflitem com os seus termos. As medidas poderão ser reavaliadas a qualquer tempo pelo presidente do STJ, observadas as informações das autoridades sanitárias sobre os índices de contaminação, bem como as recomendações da Secretaria de Serviços Integrados de Saúde do tribunal.

A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça – STJ deu provimento ao recurso especial de uma mulher para que ela receba pensão do ex-marido de forma imediata até a partilha dos bens. O entendimento foi de que, concretizado o divórcio, o fato de ela ser jovem, saudável e com formação superior não afasta a necessidade do pagamento.

No caso em tela, o pensionamento da ex-mulher e das três filhas foi alterado sucessivas vezes. Ela recebeu por 27 meses após mais de 18 anos de casamento, período em que esteve afastada do mercado de trabalho. Nas instâncias ordinárias, o pedido de restabelecimento da pensão foi negado a partir da argumentação supracitada.

Aos 43 anos, a autora da ação é saudável, tem graduação em arquitetura e urbanismo e é titular de metade do patrimônio adquirido durante o casamento. A meação dos bens, contudo, ainda não foi feita e, por tal razão, as decisões iniciais foram reformadas por unanimidade. O relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, aderiu ao voto-vista da ministra Nancy Andrighi.

Dedicação exclusiva à família

Para Andrighi, o fato de a ex-cônjuge ser jovem, saudável e diplomada serve para estimar quanto tempo será possível a sua reinserção no mercado de trabalho e a possibilidade de isso acontecer. Ao seguir tais argumentos, os tribunais anteriores não consideraram os 18 anos dedicados exclusivamente à família, postura ainda comum a tantas mulheres.

Em voto-vista, ela defendeu: “Engana-se quem acredita que o pensionamento à ex-cônjuge, nas circunstâncias de efetiva necessidade e em caráter transitório, depõe contra a irrefreável marcha das mulheres em busca da igualdade, porque a pensão, na verdade, serve para fortalecer as bases de quem precisa se reerguer”.

A ministra concluiu que a pensão alimentícia deve ser restabelecida à ex-cônjuge no mesmo patamar pago às filhas. Com a adequação do voto do relator aos entendimentos apresentados por Andrighi, e também os votos de Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Aurélio Bellizze, o colegiado votou o recurso com unanimidade.

Fonte: Assessoria de Comunicação do IBDFAM (com informações do Conjur)